O X Simpósio de Filosofia realizado pela Faculdade Católica de Fortaleza –FCF contou em se quadro de convidados com a autoridade máxima em Edith Stein no Brasil, Drª Ursula Anne Mathias. Ursula é vice-coordenadora do curso de Filosofia da Universidade Federal do Ceará e fez a comunicação sobre o tema “a estrutura da pessoa humana segundo Ser Finito e Ser Eterno de Edith Stein e segundo o Castelo Interior de Santa Tereza de Ávila”.

Drª Ursula. Foto: arquivo/Divulgação.

Drª Ursula. Foto: arquivo/Divulgação.

Ursula esclareceu aos congressistas que “na atualidade, os temas Filosofia e Mística são duas realidades que  parecem se excluir. Mas na verdade, uma área necessita da outra. Desde Platão, em todos os séculos nunca foi tema que saiu da produção filosófica”.

Mística é abertura ao Transcendente. Os místicos existiram em todos os tempos da humanidade. “Eles estão em todos os lugares”, asseverou a doutora. A vida mística é uma necessidade da humanidade, do criar artístico e do pensar filosófico.

Palestrantes do Simpósio de Filosofia.

Palestrantes do Simpósio de Filosofia.

Edith Stein passou por uma fase de ateísmo em sua juventude, quando observava a vivência inconsistente do judaísmo por parte da família. Mas  foi por ser judia que foi presa e morta pelos nazistas mesmo convertida ao cristianismo.

Depois de sua conversão ao cristianismo (1920) Edith Stein tem a certeza que Filosofia e Mística se precisam. Mesmo na fase ateia ela já se interessava pelo tema das religiões. “Eu compreendo uma pessoa quando compreendo seus valores” é a síntese de sua tese sobre a empatia, objeto de pesquisa na psicologia. Nesta tese ela afirmava que a religião era estranha à sua essência.

“Filosofia e Mística se baseiam na experiência, esta última manifesta-se na interioridade”, explicou a doutora. Ponto comum nas duas realidades  é a importância dada ao autoconhecimento, aspecto notado na filosofia desde os tempos de Sócrates com o “conhece-te a ti mesmo”. “Ninguém entra na catedral da mística sem o autoconhecimento”, arrematou Ursula.

“Ser finito e ser eterno”

Essa obra foi escrita no Carmelo. Edith Stein  se apaixona por santo Tomás de Aquino e fez muitas traduções de doutor angélico  que há muito  não haviam sido traduzidas.

Ursula Mathias em entrevista ao portal comshalom.

Ursula Mathias em entrevista ao portal comshalom.

Para a santa carmelita, existe um aspecto verdadeiro na realidade. As coisas possuem uma essência, e elas em última análise  estão na mente divina. A essência do ser humano só se realiza com a colaboração do próprio ser humano, diferente das demais essências. Ela está em nós de modo embrionário.

Edith ver no ponto 29 da suma teológica que o ser humano possui uma dignidade, porque ele é imagem e semelhança de Deus; enquanto portadora de uma natureza racional, argumentos presentes em Santo Tomás e Boécio. A pessoa é sempre espiritual, ela sempre transcende a dimensão puramente material.

Na obra de Edith corpo, psique e espírito são inseparáveis. Trata-se de uma única realidade. A pessoa carrega o seu corpo, carrega também a sua psique; a vida espiritual também é carregada por estas dimensões.

A verdadeira liberdade

A liberdade espiritual é sempre liberdade condicional. Não existe liberdade absoluta. “Podemos ser livres nos condicionamentos físicos, biológicos, sociológicos etc. a liberdade confere ao ser humano domínio sobre o corpo, psique e espírito”.

Mesa de conferências na FCF.

Mesa de conferências na FCF.

Os sentidos, corpo e psique podem todos ser instrumentos perfeitos para um projeto pessoal em vista de um projeto espiritual. “A pessoa pode escolher onde quer criar suas raízes”. A pessoa se fortalece na liberdade quando ela opta pela vida espiritual. A vida espiritual é o âmbito próprio da liberdade.

Liberdade não é fazer tudo aquilo que me leva ao ter. Os atos livres preenchem a vida do ser humano de sentido.

A alma

O “eu” não se identifica com a alma, ela é muito mais ampla, é o que significava para Aristóteles, aquela que abarcava todas as dimensões, inclusive a vegetativa. A alma espiritual pode elevar-se acima de si mesmo.

A consciência é uma função da alma. A alma mora consigo mesmo e dentro da alma o “eu” está em casa.  Na alma se acumula tudo aquilo que entra nela. “A alma tem um ser que se alimenta de conteúdo e dos posicionamentos diante destes conteúdos” explicou Ursula.

Participantes do X Simpósio de Filosofia.

Participantes do X Simpósio de Filosofia.

A nossa alma é fruto dos conteúdos que ela assimilou, que ela mesma  permitiu que entrasse. A alma é castelo interior, possui muitas moradas. Ela não é um espaço vazio, está preenchida de alguma coisa. Ela jamais  pode viver sem receber.

Escrito Castelo Interior

A conferencista abordou com maestria o que Edith Stein escreveu sobre a obra de Teresa de Jesus, Castelo Interior – Moradas.

Obra de Santa Teresa de Jesus.

Obra de Santa Teresa de Jesus.

É impossível descrever o que acontece no interior de uma alma mística. Teresa conseguiu escrever algo que pode ser modelo para o leitor. “O corpo corresponde ao muro do castelo, os guardiões são os sentidos. A meta da alma deve ser morada de Deus”, sentenciou a doutora.

O centro do palácio é o mais importante. É preciso deixar muitas moradas para se chegar ao aposento do Rei. Fora dos muros temos o mundo, no palácio interior mora Deus. “O portal de entrada é a oração (contemplação)”, revela a reformadora do Carmelo em sua obra.

Acompanhe o resumo do significado de cada morada:

Primeira morada: palavra-chave: autoconhecimento. Várias técnicas podem nos levar ao autoconhecimento sendo uma delas a oração. A alma está muito distante de Deus nesta morara. Ela reza vez ou outra e é constantemente atraída para fora do Castelo.

Segunda morada: a alma consegue conversar com Deus, consegue perceber a condução de Deus, através de uma pregação, doença ou provação.

teresaJESUS

Teresa de Jesus.

Terceira morada: Nesta alcova do castelo, as almas esforçam-se em se ordenar para Deus. É uma forma de purificação. Assume práticas de boas obras, mas ainda se mostram muito fracas diante de provações. Até a terceira morada não existe mística, trata-se da vida da graça ordinária.

Quarta morada: Nesta Morada a  alma alcança a quietude. Ela recebe a água da fonte de Deus. Aqui prevalece a oração de recolhimento. As coisas exteriores perdem seus direitos e a alma passa a viver de Deus. O próprio Deus é que atrai a alma.

Quinta morada: A alma está totalmente acordada para Deus e dormindo para o mundo e si mesma. A alma descansa em Deus e sua única atividade é o amor. O próprio Deus está unido á sua essência. Vale dizer que não se chega  nesta morada pelo próprio esforço, entanto,  as práticas de piedades corroboram para esta experiência. A alma  constrói a casa (Cristo) onde deve morrer. Torna-se mais corajosa e desejosa que todos conheçam a Deus. Torna-se também desapegada. A alma morre e nasce para a vida, é uma preparação para a próxima etapa.

Sexta morada: é a morada do noivado espiritual. O próprio Deus que se faz presente nesta etapa. Trata-se de uma purificação de toda a alma que se encontra passiva. São crises profundas de fé. A pessoa vive sem nenhuma consolação. Acontecem verdadeiras graças místicas. O medo desaparece. Os apelos e locuções possuem muita clareza e podem perdurar o resto da vida. A graça é escrita na alma de modo inesquecível. A entrega a Deus torna a pessoa livre. O próprio Deus conduz.

Sétima morada: Teresa chama de visão intelectual esta fase. As pessoas da Santíssima Trindade se apresentam à pessoa, confirmam a fé. A alma é totalmente transformada. É invadida por uma grande paz, consegue cumprir suas tarefas e fazer o que era complicado em fases anteriores. A alma torna-se uma coisa só com Deus. Ela esquece-se totalmente de si mesma.

Conclusão

Para as duas santas carmelitas, as experiências místicas servem exclusivamente para gerar uma alma disposta para servir.

 

 

 

 

About the Author

Vanderlúcio Souza

Padre da Arquidiocese de Fortaleza. À busca de colaborar com a Verdade.

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