Durante o ano inteiro, fiéis de vários estados brasileiros chegam ao Santuário de São Francisco das Chagas de Canindé para agradecer pela graça alcançada. A fé depositada no santo que imitou Jesus em vida é o que move os devotos. Exemplo disso é Francisco Tavares de Sousa, do Maranhão, veio deixar uma perna de madeira em agradecimento pela cura. Ele sofreu um acidente de moto e corria o risco de ficar sem o membro inferior. Muitos dos romeiros têm suas vidas marcadas pelo sofrimento. Em Canindé, buscam o apoio de São Francisco.
Durante o período do Natal a Reportagem do C4 NOTÍCIAS DO POVO ON LINE, foi conhecer de perto essa realidade que a cada ano se fortalece e aumenta assustadoramente a devoção ao santo.

O que se pode perceber é uma viagem pelas veredas mais tortuosas da vida, tropeçando às vezes na própria desilusão. Dessa forma, os romeiros chegam a Canindé. Na bagagem, um coração vazio de si, na expectativa de se renovar pelo contato com o divino. Nas mãos trazem um ex-voto, símbolo de gratidão e a memória de uma identidade. Na voz, orações se elevam em direção ao sagrado, daquele que foi tão pobre quanto eles. No olhar, uma saudade imensa e renitente sai pelas bordas dos olhos muitas das vezes cheios de lágrimas.

Passos branda na vasta poeira do tempo; trilham caminhos envoltos no mistério, enveredados pela fé sem limites que cada um deposita em São Francisco.
Corpos crestados, próximos aos mandacarus, pisam quais vultos num solo riscado pela seca, sem mapas, nem mundo ou chão. Assim seguem os romeiros pagadores de promessas, levando sua reverência a São Francisco das Chagas. Não comunicam desalento, nem cansaço, pois são impedidos e amparados pelo santo. Devotos numerosos aí se encontram, peregrinos de todas as raças na Meca Nordestina da fé, Canindé.

Entre o culto regular da Igreja Católica e as práticas da religiosidade popular, místicas, crenças, gestos se unem, irrompem em cada alma sedenta do eterno. Para os romeiros não importa o sacrifício, o que vale mesmo é pagar sua promessa e ficar em dia com o santo. Pode demorar 10, 20, 30 anos, mas um dia ele dá um jeito, vem a Canindé e paga. São peregrinos vindos dos mais diversos pontos do mundo, que chegam ao maior santuário franciscano da América Latina em busca da cura por meio da fé.


Os romeiros e suas histórias se misturam ao cotidiano da cidade. O casal, Francisco da Silva Borges, de 69 anos, e Maria Feitosa Borges, de 62 anos, residem na cidade de Porto Franco, no Maranhão.

Fizeram uma promessa para São Francisco há 22 anos e agora pagaram. O casal conta que tinha problemas com alcoolismo e se apegou ao santo dos pobres pedindo a cura e libertação do vício. Agora eles chegam ao santuário de Canindé para pagarem suas dívidas.

Olavo Vieira Sousa, de 69 anos, perdeu tudo nas enchentes de 2009 na cidade de Penedo, em Alagoas. Depois de pedir a São Francisco uma graça, veio pagar a promessa. “Na época, perdi minha casa, meus bens e fiquei com uma mão na frente e outra atrás. Agora, trabalho de motorista e já estou reconstruindo o que eu tinha aos poucos, graças a meu São Francisco”.


A graça alcançada pelo casal, Vicente de Sousa Felizardo, de 58 anos, e Maria Lúcia Machado Felizardo, de 54 anos, se materializa no ex-voto de uma casa, depositada na Casa dos Milagres, no anexo da Basílica de São Francisco. Moradores de Presidente Dutra, no Maranhão, prometeram fazer uma peregrinação a Canindé se conseguissem realizar o sonho da casa própria. Depois de 23 anos, eles cumprem o prometido.

São depoimentos dessa natureza que ajudam a reforçar a crença no santo dos desvalidos, dos necessitados, daquele que se fez pobre como os mais pobres para ser digno aos olhos de Deus. Com passos firmes, voz cansada, pés rachados pelo contato com a terra batida e o asfalto escaldante, seguem os romeiros em busca do sentido da vida, mediante rezas, confissões e silêncio. Por vezes conduzem uma cruz interior, como imagem da esperança que vence o sofrimento.

Os devotos depositam no santuário suas vidas fragmentadas. Comunicam imagens de si, marcas do abandono social a que muitos estão submetidos. Confiança, só mesmo no santo, que acode e consola os fiéis nos momentos mais difíceis.
Mas a graça também pode ser mais simples. A conquista da pessoa amada e do matrimônio, a aprovação no vestibular, à vitória do time do coração, tudo indiciado pelos vestidos de noiva, fotos de formatura e camisas de times de futebol depositadas na Casa dos Milagres. Muitos dos romeiros, oriundos dos demais Estados nordestinos, têm suas vidas marcadas pela fome.

Demonstram sofrimento refletido em seus rostos de uma sensibilidade prematura. Em Canindé, renovam-se e encontram amparo para a fadiga e a desilusão.
A graça que os romeiros rogam a São Francisco deveria ser proporcionada por políticas públicas. Pede uma casa, a cura de uma doença, melhoria da condição de vida. Enfim, ações que seriam de responsabilidade dos governantes.

Para Marcelo João Soares de Oliveira, autor do livro “O SANTO VIVO DOS DEVOTOS”, a romaria é uma manifestação de intensa fé que dialoga com Deus. É uma convicção íntima na experiência dos peregrinos, que buscam no sagrado a libertação de seus males. Os andantes comunicam-se de forma profunda pelo sacrifício do trajeto e pela fé que os fortalece na travessia de distâncias. Na transparência de seus passos, as situações mais diversas emergem da dor e da fragilidade. Este clamor tem sido ressoado com frequência.
Quem visita Canindé como romeiro, procurando no sobrenatural uma esperança, certamente encontrará no homem do segundo milênio pistas para nova vivência: a fraternidade que nasce no meio dos pobres, a paz que é o fruto da reconciliação e da tolerância entre classes e nações, a harmonia ecológica que é o resultado do respeito e do amor por todas as criaturas.

AMANHÃ VOCÊ ACOMPANHA: RELATOS DE PROMESSAS QUE FORTALECEM A FÉ EM CANINDÉ

Fotos e Texto de Antônio Carlos Alves