Quem foi até o Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB) neste sábado, 25, viu um novo programa, chamado Hoje é Dia de Rock, no lugar do consagrado Rock Cordel, que deixou de existir no formato que conhecemos e passará a ter uma edição anual apenas. O Rock, na nova versão deixará de ser protagonista e deve ceder espaço para outros ritmos e outras culturas.
As guitarras ensandecidas e seus fãs terão lugar no Hoje é Dia de Rock, mas, a julgar pela primeira edição, o sucesso não será o mesmo do Rock Cordel, pelo menos não neste primeiro momento. E há dúvidas quanto à transparência da escolha de curadores e bandas no novo formato.
Uma comunicação burocrática e deficiente já fazia o Rock Cordel padecer com uma sensível queda de público. A mudança do nome do programa e a criação de outra iniciativa, que não terá mais o rock como carro-chefe, pode ser a pá de cal numa das vitrines mais consolidadas para bandas alternativas no Ceará.
As mudanças causaram um rebuliço, aumentando a tensão que já existia com a saída dos produtores culturais Fernando Pessoa e Amaudson Ximenes da curadoria do festival, ainda em 2015. “Eu não pedi pra eles saírem, dei a opção deles dividirem o trabalho com outros produtores. A gente tem sempre que se reinventar e isso aconteceu, e eles foram convidados a participar, mas se recusaram. E começou então uma visão deturpada do que estava acontecendo”. O relato é do coordenador do Centro Cultural do BNB, André Marinho, mas Amaudson e Fernando discordam dessa versão, obviamente. Eles foram, ao lado de Marinho, as cabeças pensantes por trás do festival na maior parte dos 10 anos de existência do Rock Cordel.
Para Fernando Pessoa, dentre outros motivos, o fim do Rock Cordel ocorreu por ciumeira, ao relembrar episódio, em que o Rock Cordel foi transferido para o novo espaço do Centro Cultural, na rua Conde D’eu, no Centro, acontecendo sempre às sextas-feiras, quando ele e Amaudson ficaram no comando enquanto Marinho tirava férias. “Quando o André Marinho voltou de férias ele viu o rock cordel acontecendo de cima. A gente fazia vários estilos, apesar dele dizer que a gente só colocava som pesado, mas não era nada disso. A gente fazia um trabalho, uma divulgação enorme. E a gente não ganhava pra isso, não. Fazíamos porque gostávamos”, acusa Pessoa.
Marinho se defende criticando o que chama de “centralização do Rock Cordel” e afirma que é preciso abrir espaço para outras iniciativas que atendam outros públicos. Só não explicou como terminar com um formato vencedor vai fazer com que tudo isso aconteça. Ele ainda acusa Amaudson e Fernando de se apropriarem da marca Rock Cordel. “Eles contribuíram muito para o festival, mas o festival não é deles. O festival é do centro cultural, foi criado pelo centro cultural e sempre houve um investimento do centro cultural neste evento”, diz.
André Marinho diz que o novo formato terá em toda edição, um produtor contratado que fará a curadoria do festival Hoje é Dia de Rock. Caberá a este profissional fazer a escolha das bandas selecionadas, proposta que é criticada não só por Amaudson e Fernando, mas por bandas, músicos e alguns produtores. Nota da Associação Cultural Cearense do Rock (ACR), da qual Amaudson é presidente, alega falta de transparência no modelo e pede a realização de editais para fazer as contratações, tanto de bandas, como de curadores. O documento pede ainda que o Hoje é Dia de Rock tenha menos tempo de duração por edição, por questões de segurança no entorno do Centro Cultural, dentre outras mudanças. No novo modelo, as apresentações podem chegar perto das 22 horas.
O fato é que causa estranheza que algo tradicional, consolidado, respeitado e cultuado por público, artistas e mídia especializada deixe de existir assim, como se fosse um câncer a ser combatido. O primeiro grande susto foi na divulgação das atrações do mês de junho, quando o programa já havia mudado de nome.
Deixando de lado a briga de egos que parece existir, é preciso ressaltar que o Centro Cultural Banco do Nordeste é um órgão público, pertencente a um banco público, mantido, portanto, com dinheiro público. Em última instância, a despeito de quem foi o idealizador do projeto, ou de quem o transformou numa iniciativa bem sucedida, o Rock Cordel não é do André Marinho, do Amaudson Ximenes, ou do Fernando Pessoa, ele é do PÚBLICO, assim mesmo, em caixa alta. É ingenuidade achar que o festival teria sucesso ao longo de dez anos, se não fossem as bandas que tocaram no festival a cachês abaixo dos valores de mercado e sobretudo, do público, que prestigiou o evento edição após edição.
O Rock Cordel já chegou a movimentar um público de 35 mil pessoas, numa mesma edição, revelou bandas, ressuscitou outras e manteve uma cena musical que sempre foi árida nas iniciativas em prol do rock. É lamentável que um produto tão bem conceituado e reconhecido tenha um fim tão melancólico.
Reportagem: Aflaudísio Dantas e Daniel Tavares/ESPECIAL PARA O CEARÁ & ROCK
Tá ficando igual Rock in Rio, total desrespeito com os fãs e a cena. Perguntam por que a cena tá morrendo? Esse é UM dos motivos!