Se uma pessoa ganha poder sobre a vida de outros indivíduos, é certo que ela puna aqueles considerados errados pela sociedade? O que leva tal pessoa a cometer atos hediondos? Como o poder pode corromper uma mente, até então, tranquila e sem grandes ambições? De que forma seria o embate mental entre dois gênios da dedução? Tantos questionamentos forma o cerne do anime “Death Note”, lançado em 2007, que até hoje figura em diversas listas como uma das melhores obras do gênero. *

O mesmo não pode ser dito da adaptação homônima lançada pela Netflix na última sexta-feira, 25. Comandado por Adam Wingard, diretor de obras interessantes como “Você é o Próximo” (2011) e “O Hóspede” (2014), o filme abre mão de todos os aspectos que fizeram a obra original se destacar entre tantas outras. Desde os primeiros minutos, é perceptível que não há um tom definido para o filme, que transita entre a comédia pastelão e o horror gore.

A história começa com Light Turner (Nat Wolff) recebendo o Death Note, um caderno com o poder de matar qualquer pessoa, desde que seu possuidor saiba a identidade da vítima e tenha seu rosto em mente ao escrever o nome. Com tal poder, Light começa a fazer justiça contra pessoas que considera ruins, ao passo que também utiliza o diário para impressionar Mia (Margaret Qualley), sua eventual namorada. Sob a alcunha de “Kira”, Light vê um verdadeiro culto se formar em volta de sua imagem, mas o detetive L (Lakeith Stanfield) entra na investigação para impedir que o número de assassinatos continue a crescer.

Por mais que hajam semelhanças entre as tramas da adaptação e a obra original, o tom juvenil adotado por Wingard chega a parecer mais uma paródia do anime que uma nova releitura. Se o sagaz Light começa como um jovem comum que aos poucos se torna exatamente aquilo que tentou combater, o personagem interpretado por Wolff não apenas é desprovido de inteligência, como não possui característica alguma que o justifique enquanto protagonista. O embate mental com L jamais acontece, com a trama buscando apenas ficar no básico, ao envolver cenas de ação idênticas a tantos outros blockbusters genéricos.  

Tentando disfarçar a pobreza do roteiro com estilo técnico, a fotografia de David Tattersall aposta em planos incomuns para se diferenciar, mas tudo soa artificial. A grande quantidade de cenas em slow motion se tornam irrelevantes, pois o que está sendo visto é desinteressante. A iluminação é competente e consegue dar certa beleza ao filme, mas seu efeito é arruinado graças à péssima história.  

Responsável por entregar o Death Note a Light, o Ryuk, o Deus da Morte, possui uma participação ínfima, mas bem realizada, graças à dublagem de Willem Dafoe. Seu tom sarcástico funciona com o personagem. Infelizmente, Ryuk está sempre envolto em sombras ou atrás de estantes, como forma de reduzir os custos de produção e esconder o CGI defeituoso.

Se este ano tivemos “Baby Driver” e sua trilha sonora incrível, aqui temos justamente o oposto. Provavelmente sendo a pior trilha de 2017, as músicas não combinam com situação alguma, parecendo terem sido escolhidas a esmo. No clímax do terceiro ato, a canção é tão absurda que a cena já pode ser considerada a mais engraçada do ano.

Falhando em tudo que se propõe, “Death Note” é o pior lançamento da Netflix do ano. Humor batido, trama ruim, personagens que mudam de personalidade entre uma cena e outra, além de ter um apelo à violência gratuita apenas como ferramenta de choque. Uma ponta para sequência é deixada ao fim do longa, mas torçamos para que esse filme nunca veja a luz do dia.

*Não li o mangá original, portanto, me atenho a falar apenas do anime.

Cotação: nota 2/8

Ficha técnica: Death Note (EUA, 2017). De Adam Wingard. Com Nat Wolff e Willem Dafoe. 100 min.

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Hamlet Oliveira

Jornalista. Louco por filmes desde que ficava nas locadoras lendo sinopse de filmes de terror. Gasta mais dinheiro com livros do que deve. Atualmente tentando(sem sucesso) se recuperar desse vício.

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