Aos 62 anos, 40 deles dedicados à música, Ozzy Osbourne faz parte de imaginário coletivo do rock mundial, tanto pelo peso de música –  seja solo ou ao lado do Black Sabbath – quanto pelas suas loucuras. Entronado como o Príncipe das Trevas, Ozzy protagonizou cenas tragi-cômicas inesquecíveis, boa parte delas contadas na recém lançada autobriografia Eu sou Ozzy (Benvirá). Com uma escrita fiel au modo de ser e falar do biografado, ele passa em revista muitas das suas impressões sobre a música, as drogas a família, os amigos e mais. Apesar de autobiografia sempre merecer um pé atrás, Ozzy leva a conversa com uma boa dose de seinceridade e nada de autopiedade. Confira algumas passagens:

1) Infância

– Nasci em 1948 e cresci no número 14 de uma fileira de casas geminadas em Lodge Road. Meu pai, John Thomas, era mestre ferramenteiro e trabalhava à noite na GEC, em Witton Lane. (…) Ele sempre me contava sobre a guerra – como quando estava trabalhando em King’s Stanley, Gloucestershire, no começo dos anos 40. Toda noite, os alemães bombardeavam toda a porra de Coventry, que ficava a uns oitenta quilômetros. Lançavam explosivos e minas com paraquedas, e a luz dos incêndios era tão forte que meu pai conseguia ler o jornal durante o blecaute.

2) Adolescência

– Não era exatamente um Romeu na escola – a maioria das garotas achava que eu era doido –, mas por um tempo tive uma namorada chamada Jane. (…) Eu era doido por ela. Muito. Sempre que íamos nos encontrar, eu ia primeiro no banheiro e passava sabão no meu cabelo para jogá-lo para trás, assim ela ia pensar que eu era legal. Mas um dia começou a chover e, quando cheguei, minha cabeça parecia uma bolha de sabão, com tudo escorrendo pela minha testa e dentro dos meus olhos. Ela olhou para mim e disse: “Que merda você fez?”. Tomei um pé na bunda. Na hora. Fiquei arrasado.

3) Heavy Metal

– Hoje você ouve pessoas dizendo que inventamos o heavy metal com a música “Black Sabbath”. Mas eu nunca dei bola para o termo “heavy metal”. Para mim, não diz nada musicalmente, principalmente agora que temos o metal dos 70, o dos 80, dos 90 e o metal do novo milênio – todos completamente diferentes, apesar de falarem como se tudo a mesma coisa. Na verdade, a primeira vez que ouvi as palavras “heavy” e “metal” juntas foi na letra de “Born to be wild”. A imprensa adotou o termo depois disso. Nós certamente não o inventamos. Até onde me lembro, éramos apenas uma banda de blues que tinha decidido escrever músicas de medo.

4) Changes

– Queríamos nos impressionar antes de impressionar os outros. Se outras pessoas gostassem do que estávamos fazendo, isso era um bônus. Foi assim que terminamos fazendo músicas como “Changes”, que soavam diferentes de tudo que já tínhamos feito antes. Quando a maioria das pessoas ouvia o nome Black Sabbath, só pensava na coisa pesada. Mas havia muito mais do que aquilo – principalmente quando começamos a fazer um esforço para sair dessa merda de magia negra. Com “Changes”, Tony sentou-se ao piano e criou aquele belo riff, eu murmurei uma melodia em cima e Geezer escreveu aquela letra linda sobre a separação que Bill estava enfrentando com sua mulher na época. Achei aquela música brilhante desde o momento em que a gravamos.

5) Fim do Black Sabbath

– (…) Mas eu estaria mentindo se dissesse que não me senti traído pelo que aconteceu com o Black Sabbath. Não éramos uma banda artificial, cujos membros eram descartáveis. Éramos quatro caras da mesma cidade que tinham crescido juntos no mesmo bairro. Éramos como uma família, como irmãos. E me mandar embora por estar drogado era uma merda hipócrita. Éramos todos loucos. Se você está drogado e eu também, e você me manda embora porque eu estou drogado, que merda é essa? Por que eu estou ligeiramente mais drogado que você?

6) Morcego

– (…) No dia 20 de janeiro de 1982, tocamos no Veterans Auditorium de Des Moines, Iowa. (…) O show estava indo bem. (…) Aí, da audiência veio um morcego. Obviamente um brinquedo, pensei. Eu levei até as luzes e mostrei os dentes enquanto Randy tocava um dos seus solos. A multidão ficou louca. Fi, então, o que sempre fazia quando tínhamos um brinquedo de plástico no palco. CHOMP. Imediatamente senti que algo estava errado. Muito errado. Para começar, minha boca ficou instantaneamente cheia de líquido quente e viscoso, com o gosto mais horrível que dá para imaginar. Eu podia senti-lo passando pelos meus dentes e escorrendo pelo queixo. Ao a cabeça em minha boca se moveu. (…) Cuspi a cabeça, olhei por cima das asas e vi Sharon com os olhos esbugalhados, balançando as mãos, gritando:  NÃOOOOOOO!!!!!!!!! É DE VERDADE, OZZY, É DE VERDADE! O que me lembro em seguida era de estar numa cadeira de rodas, correndo para uma sala de emergência.

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7) Rock In Rio

– (…) O show era no Rock in Rio, um festival de dez dias com Queen, Rod Stewart, AC/DC e Yes. Um milhão e meio de pessoas compraram ingressos. Mas eu fiquei desapontado com o lugar. Tinha esperado ver a Garota de Ipanema em cada esquina, mas não vi nenhuma. Havia só um monte de crianças pobres correndo pelo lugar como ratos. As pessoas eram ou absurdamente ricas ou viviam nas ruas – parecia não haver nada no meio.

8) Live Aid com o Black Sabbath

– Por um lado, tocar no Live Aid foi ótimo: era por uma grande causa e ninguém tocava as velhas músicas do Sabbath como eu, Tony, Geezer e Bill. Por outro lado, foi um pouco embaraçoso. (…) Nos seis anos desde que tinha saído da banda, tinha me tornado uma celebridade nos Estados Unidos, enquanto o Black Sabbath havia ido na  outra direção. Então recebi tratamento especial, apesar de não ter pedido nada disso. (…) Eu não lidei com isso de uma forma correta, porque meu ego de rock star influenciado pela cocaína estava descontrolado. Lá no fundo, uma parte de mim queria dizer para eles: “Você me mandaram embora e agora eu não preciso de vocês, então vão se foder”.

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9) Nirvana

– Essa música, Smells like teen spirit, teve um grande impacto em mim – e fiquei muito orgulhoso quando descobri que Kurt Cobain era meu fã. Eu o achava sensacional. Achei todo o disco Nevermind sensacional. Foi uma enorme tragédia o que aconteceu.

10) Drogas

– Devo estar sóbrio há quatro ou cinco anos. Não fico contando. Não sei exatamente em que data parei. Não é uma porra de uma corrida. Só levanto da cama a cada manhã e não bebo e não tomo drogas. Ainda evito essas reuniões de AA, no entanto. Para mim, parece que é uma substituição do vício em bebida pelo vício no programa. Não digo que seja inútil, porque pode ajudar muita gente. Mas a mudança deve vir em mim.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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