O cearense Markinhos Moura  surgiu no mercado musical dos anos 80 com uma difícil missão nas mãos. Estourado nas rádios com a música Meu mel, sua voz era constantemente comparada com a da diva Elis Regina. Se um sucesso popular de gosto duvidoso não combina com Elis, por outro lado o rapaz fez muito sucesso. O tempo passou, ele lançou outros discos e deu uma sumida. O retorno se deu recentemente, atendendo um convite do produtor Thiago Marques Luiz, responsável pela retomada da carreira do mestre Cauby Peixoto. O resultado do encontro de Marquinhos com Thiago é o disco Mulheres e Canções, lançado pela Lua Music. Ao longo de 12 canções, Markinhos se cerca de um clima jazzístico para homenagear as mulheres. O repertório vai de A feminina voz do cantor, reverência de Milton Nascimento e Fernando Brant às cantoras brasileiras, até Doce de Pimenta, brincadeira de Rita Lee para Elis. Tem ainda Bonita, de Tom Jobim, Mulher eu sei, de Chico César, e Me acalmo danando, de Angela Ro Ro. Para confirmar a homenagem, Mulheres e Canções traz um time variado de convidadas: Zezé Motta, Amelinha, Jane Duboc, Maria Alcina, Verônica Ferriani, Cida Moreira, Vânia Bastos, Claudya, Márcia Castro, Tetê Cavalckanti e Fabia Cozza. Na longa entrevista (por email) a seguir, Markinhos Moura apresenta seu novo trabalho, fala da carreira e ídolos. Certo de estar apontando para um novo momento em sua carreira, ele aproveita o espaço pra mandar um recado aos críticos musicais: “editores, abram seus corações, escutem meu CD e, realmente, façam suas críticas pensando no Markinhos de hoje”. Acompanhem.

DISCOGRAFIA – Mulheres e Canções encerra um longo distanciamento seu dos discos. De onde partiu a ideia de um novo disco?

Markinhos Moura – A ideia já existia por que faço um show nesses moldes há muitos anos. Então, foi a primeira coisa que me veio na cabeça.

DISCOGRAFIA – O disco parte de uma ideia explicita de falar da temática feminina. Como se deu a seleção de repertório? O conceito foi uma proposta sua?

Markinhos Moura – Sim, o conceito foi meu a partir de, como já falei, do show homônimo. Eu e o Thiago (Marques Luiz, produtor) amamos cantoras e, lógico, compositoras também. Começamos a buscar na mente músicas de compositoras que nos marcaram. Eu me lembrava de algumas, o Thiago bem mais por que tem um vasto conhecimento musical. Depois, fomos peneirando e isso foi muito triste, por que ficaram tantas coisas lindas (de fora)! Mas tínhamos que acabar o CD, e fazer ele se materializar.

DISCOGRAFIA – Onze cantoras dividem com você as canções do disco. Como aconteceram esses convites? Quem você já conhecia e quem você veio a conhecer apenas por conta da gravação?

Markinhos Moura – Olha, a maioria eu já conhecia através de suas carreiras. Até por que eu sou fã delas. Os convites foram feitos na maioria por Thiago, por que ele já havia trabalhado em outros projetos com todas elas e isso facilitou muito. A que eu mais conhecia, até por que começamos juntos aí em Fortaleza e nos conhecemos desde os dez anos, é a Tetê Cavalckanti. Ela, inclusive, é minha comadre. A Jane Duboc e a Maria Alcina eu já conhecia há muito tempo. Mas o mais legal foi saber que todas elas me respeitavam como artista isso foi muito gratificante e fez com que parecesse que nos conhecíamos há décadas.

DISCOGRAFIA – Como foram as gravações? Alguma canção foi sugerida por alguma das convidadas?

Markinhos Moura – Às vezes complicadas por causa da agenda delas. Tinha que ser no dia que elas podiam, mas o clima sempre foi ótimo, leve, alegre. Ríamos muito sempre. Claro, como todos são profissionais, não se perdia tempo. Todas as canções foram escolhidas por nós.

DISCOGRAFIA – O modelo deste disco permite um segundo volume. O que e com quem mais você gostaria de gravar?

Markinhos Moura – Acho que sim e espero (que sim). Vai depender da receptividade desse. Mas, se depender de compositoras e canções, isso é certo. Adoraria gravar com (Maria) Bethânia, Ana Carolina, (Adriana) Calcanhoto, Maria Rita, Fafá (de Belém), Alcione e tantas outras…

DISCOGRAFIA – Apesar do imenso sucesso de Meu Mel, você é um artista que sempre sofreu resistência da crítica musical. Com este disco, que traz uma veia mais pro jazz e um repertório mais sofisticado, você acha que consegue mais espaço nos cadernos de cultura?

Markinhos Moura – Eu gostaria que eles, os críticos, fossem mais abertos e mais imparciais. Não vejo problema de ter sido um artista popular. Isso não invalida o meu talento. Acho uma crueldade uma pessoa que tem um espaço e aprisiona um artista num rótulo pejorativo, sabendo que isso vai influenciar muitas pessoas. As pessoas têm o direito de mudar, de evoluir, e é o que aconteceu comigo. Não vivo falando do meu passado por que sou um homem do meu tempo, mas não renego o meu passado. Ninguém é obrigado a gostar da minha voz, do meu trabalho, mas quero uma critica justa e, lógico, espaço também. Portanto, editores, abram seus corações, escutem meu CD e, realmente, façam suas críticas pensando no Markinhos de hoje. Quanto a esse repertório, eu tenho grande intimidade, por que canto esse seguimento há muito tempo. As pessoas, no geral, é que não tiveram como conhecer isso e é isso que eu quero que aconteça. Mas isso não impede de eu cantar junto disso, uma música do Odair (José), ou do Amado Batista. Canto aquilo que me toca o coração e que se adequa a minha voz. Quero aproveitar e agradecer o respeito e a falta de preconceito de vocês. E sim acho que esse CD vai me abrir esses espaços que, em geral, não falam de artistas como eu.

DISCOGRAFIA – Você surgiu no cenário musical com sua voz sendo comparada à de Elis Regina, alguém que você sempre cita como uma referência importante. Como você recebeu e encarou essa comparação?

Markinhos Moura – Na época eu não tinha noção desse peso e dos problemas que iria ter no futuro. Eu era muito jovem e queria mesmo era cantar. Achava bacana, me deixava orgulhoso. Afinal de contas, um garoto saído do Ceará sendo lançado no programa de maior audiência na época (Fantástico), e ainda por cima comparado a maior cantora do Brasil, era o máximo! Sempre achei um exagero essa comparação, nenhuma voz é igual a outra, mas fazia parte do jogo. Achei que depois do Fantástico minha vida estaria mudada e minha carreira consolidada. E não aconteceu nada disso. Ainda tinha muita pedra pra tirar do meu caminho.

DISCOGRAFIA – Além de Elis, outras influências pessoais que você sempre cita são Ney Matogrosso e Clara Nunes. Você conheceu esses artistas? Algum deles chegou a chegou a ser mais importante do ponto de vista de dar apoio e abrir portas?

Markinhos Moura – A Elis eu conheci ainda em Fortaleza num show que ela fez no Centro de Convenções. Eu fazia teatro político. Estava começando a me desabrochar como artista, mas era amador. Quando minha queria diretora Herotilde Honório me apresentou à Elis, e disse que eu era um fã e rival, ela não acreditou e caiu na gargalhada. E eu completamente paralisado. Não sei como voltei pra casa depois. A Clara infelizmente não conheci. Sinto uma grande pena por isso. O Ney, já estive com ele várias vezes em shows dele. Ele sempre me tratou com delicadeza e educação. A única pessoa que posso dizer que me ajudou efetivamente, foi o cantor Wando, um grande coração! Eu frequentava muito a casa dele, por conta de um amigo em comum. Ele que fez a ponte para o Fantástico. Depois conseguiu minha primeira gravadora e ainda toca o violão que aparece no programa. De quebra, ele estava fazendo um show no teatro bandeirantes em SP, e me colocou como convidado especial. Era um escândalo. O público vinha abaixo! Um sonho pra mim! Nunca tinha feito um show com tantas luzes e um som maravilhoso, nunca esqueço disso. Obrigado, Wando.

DISCOGRAFIA – Você andou, por muitos anos, afastado da mídia. O que você tem feito nos últimos anos? Shows, gravações, por onde tem trabalhado?

Markinhos Moura – Morei e trabalhei em alguns países na década de 90. Depois voltei e fiquei parado, pois não queria mais cantar. Mas ninguém me deixava esquecer do meu passado. Ninguém queria me dar um emprego. Voltei ao teatro, fiz dois musicais, gravações. E nesse tempo tentando me recolocar na carreira. Você sabe que quando saímos daqui, na volta temos que recomeçar do zero. Fui morar em Sampa, por causa das oportunidades. Daí surgiu a possibilidade do CD. Agora que ele existe, estamos tentando fazer com que ele seja comprado, escutado e conhecido. Não tem sido fácil, por que o talento já não é moeda de troca, mas vamos chegar lá. Sei que existe um público que aprecia a boa música e um bom cantor. Também quero fazer outras coisas paralelas, outros projetos teatrais, gravações, TV. Quero poder colocar meu talento e experiência a serviço de toda forma de expressão artística. Portanto estou aberto a propostas, viu gente?

DISCOGRAFIA – Qual é sua relação hoje com Fortaleza? Vem acompanhando os artistas que tem surgido por aqui?

Markinhos Moura – Sempre morei no Rio. Somente há dois anos estou em Sampa, mas sempre que posso estou no Rio. Acho que se parece muito com Fortaleza, por causa das praias. Sou uma pessoa solar. Estive em Fortaleza há cerca de quatro anos pra fazer o show da parada GLBT. Gostaria de ir mais. Minha mãe e a maior parte da minha família ainda moram aí. Gostaria de trabalhar mais aí. Sei que existem lugares maravilhosos pra se cantar e um publico pra esse tipo de música. Não sei por que não vou mais. Quem sabe com esse projeto. Infelizmente não conheço essa nova geração de artistas e gostaria muito de fazer esse link. Quem sabe gravar um CD, trocar figurinhas. Mas, você sabe, não depende só de mim.

DISCOGRAFIA – Quais são seus próximos planos?

Markinhos Moura – Sempre espero muito e quero mais. Sou geminiano. Estou em ótima forma física e vocal, portanto apto a trabalhar, que é o que gosto de fazer. Quero trabalhar em projetos paralelos e gostaria muito que essa geração conhecesse meu trabalho. Espero poder fazer esse show em todo Brasil, em especial em Fortaleza. Claro que tudo isso com a proteção e direção de Deus.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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