Ao longo da carreira, cada integrante dos Beatles assumiu um personagem que acabou servindo de carapuça por muitos anos. John era o louco, Ringo o excluído, George o místico e Paul o bom o moço. Em partes, cada máscara dessas tinha um bom motivo pra existir. Acontece que, se olhar mais de perto, cada um poderia acabar tendo também um pouco das características de outro. E, talvez, seja essa miscelânea de personalidades e posturas, somado a um gênio criativo endiabrado, que fez o Fab4 criar a mais importante obra de música pop do mundo e com fortes chances de jamais ser superada.

No caso de Paul, a biografia Paul McCartney – Uma vida (Nova Fronteira) mostra que o bom moço também teve lá seus momentos de loucura. Escrita pelo jornalista novaiorquino Peter Ames Carlin – autor da biografia do beach boy Brian Wilson -, o livro começa, obviamente narrando infância de James Paul McCartney em Liverpool, com detalhes sobre sua boa relação familiar e sobre o drama de perder a mãe aos 14 anos. No entanto, foi esta fatalidade que acabou se tornando um dos pontos de encontro entre ele e o futuro amigo John Winston Lennon, que ficaria orfão aos 17 anos.

Como não poderia deixar de ser, durante todo o período em que Paul se dedicou aos Beatles, sua biografia acaba sendo também uma biografia da banda, passando por personagens como Alain Klein, George Martin, Brian Epstain e outros. Nenhuma grande novidade para quem já conhece outros trabalhos sobre a banda. Mais sobre Paul McCartney, o livro, insiste na sua atração pela maconha e no quanto ele era dominador dos trabalhos do grupo. Quanto à erva proibida, paul fez uso até bem pouco tempo, quando os afazeres domésticos o fizeram parar. Já quanto ao seu jeito ditador de conduzir a banda, quem não lembra de como ele agiu quando durante as gravações do album branco?

Um ponto positivo da biografia está após o fim dos Beatles. Nesse momento Peter Carlin narra passo a passo os caminhos erráticos do músico até que ele voltasse a se sentir à vontade com o repertório do seu grupo. Sim, após o fim dos Beatles ele teve medo de tocar suas velhas canções e ser taxado de oportunista. Daí vieram os Wings que acabou não passando de uma banda de apoio para o velho beatle. Já casado com Linda, ele chegou a empurrá-la pra dentro da banda, mesmo sabendo que sua amada não sabia tocar instrumento nenhum. Mesmo diante do nariz torcido dos seus companheiros de banda, Linda inclusive, Paul insistiu para que ela tocasse teclados.

É fato que a obra solo de Paul McCartney nunca chegou ao patamar do foram os Beatles. Mas também seria muita má vontade dizer que é ruim. Ao longo dos anos, ele criou uma série de canções memoráveis, belas e cheia de tudo de bom que ele tinha a oferecer. Nesse ponto, Paul McCartney – Uma Biografia ganha ao mostrar como ele soube ir se distanciando da sombra gigante do quarteto para poder voltar a se relacionar bem com aquele repertório. O livro também revela detalhes da baixaria que envolveu o casamento do músico com a modelo Heather Mills, que seguia o estilo “entre tapas e beijos”. Passadas as 400 páginas da biografia, fica uma boa notícia: os Beatles não foram um sonho que acabou e aprova disso está neste velho compositor que ainda tem muita lenha pra queimar.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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