Milton Nascimento, Luiz Melodia, Sandra de Sá, Itamar Assumpção, Cassiano, Gilberto Gil, Moacir Santos. A lista de compositores, cantores e músicos negros que marcaram a música brasileira é infindável.  No País marcado pela miscigenação, a paleta de cores raciais se mistura de tal forma que depois fica difícil separar. Ainda assim, o DJ e produtor musical Zé Pedro lançou o desafio para a cantora Izzy Gordon de fazer um tributo exclusivo à música negra brasileira e ela topou.

Negro azul da noite foi lançado recentemente pela Joia Moderna, gravadora de Zé Pedro dedicada exclusivamente às vozes femininas que ficaram fora do mainstream. A homenagem já fazia parte dos projetos do DJ, só faltava uma voz para realizá-lo. Foi então que ele conheceu Izzy através de um vídeo do youtube. Nele, a cantora fazia uma versão sussurrada de Pescador de ilusões, raro momento de delicadeza na obra dO Rappa. Como o repertório já estava selecionado, o passo seguinte foi convidá-la e ouvir prontamente um “sim”.

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Do samba à soul music, Negro azul da noite parece curto para tantos negros talentosos que já tocaram e tocam pelo Brasil. Para dar unidade a tantos afluentes, o disco ganha um tom de leveza jazzística feito somente com piano e baixo. A abertura é com a canção-título, composta por uma esquecida Geovana, sambista apresentada em 1969 no 1º Festival de Músicas de Favela. Ainda na linha “pandeiro e tamborim”, Questão de gosto, samba raro de Leci Brandão lançado em 1976, brilha num dueto com o trombone de Bocatto. Clássico da autêntica Black music verde e amarela, A lua e eu é o momento mais pop do tributo. Mas o destaque fica para a sutileza das versões de Coisas da vida, sucesso noventista de Milton Nascimento, e New Love, composição inaugural de Tim Maia, aqui reforçada pelo trompete de Walmir Gil.

Embora desconhecida do grande público, a cantora Izzy Gordon traz boas referências no currículo. Sobrinha de Dolores Duran e filha do cantor de jazz Dave Gordon, ela já passa dos 20 anos de carreira e já teve outros dois discos lançados. “Eu não me imaginava cantora. Gostava de cantar no banheiro e, quando desafinava, meu pai chamava minha atenção”, lembra ela em entrevista por telefone. Apesar de levar uma carreira à margem das grandes gravadoras, não deixou de colecionar admiradores famosos. Quincy Jones, produtor do megassucesso Thriller, foi convidado por Bono Vox para conferir o show da cantora em um hotel paulista e fez questão de elogiá-la ao final. Em seguida foi a vez de Paul McCartney. “Eu estava cantando É com esse que eu vou e ele subiu no palco. Cantou e ainda tocou tamborim”, conta Izzy lamentando a produção do beatle ter proibido fotos e filmagens.

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Empolgada com o resultado do recente Negro azul da noite, Izzy Gordon não descarta a possibilidade de lançar um segundo volume do tributo. “Mandei o recado pro Zé Pedro e a proposta ficou no ar. Tem muito artista no Brasil que nem sabe que é negro”. Nascida e criada num ambiente de jazzistas, desde o pai até o irmão Tony, ela já esteve no Ceará para shows no Dragão do Mar e no festival de Guaramiranga, agora espera voltar para apresentar o novo trabalho. “Muita gente não concorda, mas acho que o Brasil é muito bom no jazz. Jazz é improviso e me sinto muito bem fazendo isso aqui”.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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