A história de Gabriela, baiana sensual e dengosa, começa em 1958, pela pena sempre afiada do seu pai Jorge Amado. Em seguida foi a vez de Sônia Braga dar cara e corpo para a morena, primeiro na TV, em 1975, e oito anos depois no cinema. Mas eis que, em 2012, foi a vez de Juliana Paes tentar se mostrar atriz como protagonista da história de amor e costumes escrita há 54 anos. Assim como, nem com muito boa vontade, é possível separar Gabriela das interpretações primorosas de Sônia, seria impossível para a combalida indústria fonográfica atual tentar criar uma trilha sonora para a novela global das 11h à altura daquela produzida há 37 anos. Não, não é por falta de gente boa para cantar e compor coisas novas. É por falta de boa vontade para apostar no novo. O resultado disso é que a nova trilha do folhetim mescla a ótima trilha sonora original com novos números que, salvo um ou outro, pouco acrescentam. Se não, vejam só. Começando pelas antigas, imagine o que é uma trilha que conta com Fafá de Belém rebolando graciosa em Filho da Bahia, enquanto Djavan soa magistral em Alegre menina. Tem ainda a divina Maria Bethânia ainda mais dramática em Coração ateu, enquanto Moraes Moreira surge num duelo de cordascom Armandinho em Guitarra baiana. Isso sem falar em Gal Costa, outra baiana sestrosa que deu voz à personagem. Todas elas, além de outras, ganharam remasterização para serem reinseridas na nova versão de Gabriela. Mas aí vêm as novas canções. Ivete Sangalo (surpreendendo como Maria Machadão) até se sai bem com Me leva embora, de Dori Caymmi e Jorge Amado. Já o Babado Novo, sem a terrível Cláudia Leitte, se mostra totalmente dispensável com Lindinalva (Gilberto Gil). João Bosco, que na versão original cedeu Doces olheiras, agora vem com o belo bolero Aura de glória, que remonta ao seus melhores momentos com Aldir Blanc. Já Caetano Veloso parece completamente deslocado com Você não me ensinou a te esquecer. Sua interpretação é ótima, é fato, mas é muita falta de imaginação requentar a música do filme Lisbela e o prisioneiro. Se Mart’nália parece ter feito Depois cura para Gabriela, Elba Ramalho entra com mais uma versão para Lamento Sertanejo, sem dizer a que veio. Pescada do disco Liebe paradiso, de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos, Nana Caymmi mostra seu canto sagrado em Flor da noite, antes de passar a bola para a Banda Nova e Tom Jobim mostrarem a suíte Tema de amor de Gabriela, mais uma das antigas. Mu Chebabi e Luíza Casé se mostram populistas em A Morena. Mas, pra salvar tudo, o disco encerra com Elomar e seu violão em Retirada. Ponto para a gravadora que não deixou o violeiro de fora.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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