CHILE-SONG FESTIVAL-CARLO

Pode até não parecer, mas Roberto Carlos vem buscando certa ousadia nos últimos anos. Uma ousadia bem medida e, até certo ponto, medrosa, é fato. Ainda assim, é ousadia. Fazendo um retrocesso, somente na primeira década do novo milênio, o Rei realizou feitos inéditos numa carreira que já conta mais de 40 anos. Buscou conexão com a geração MTV, revisitou seus especiais de fim de ano num projeto de duetos e voltou à sua origem bossanovista numa homenagem a Tom Jobim, que, de quebra, veio junto com seu primeiro disco dividido com outro artista, no caso, Caetano Veloso. Honra como essa, nem Erasmo Carlos teve ainda.

Por falar no Tremendão, já tinha um tempo que o parceiro esperava um sinal de Roberto para retomarem as composições. O sinal verde veio junto com mais uma novidade do velho amigo, um compacto de apenas quatro músicas. O formato econômico, muito usado décadas atrás para testar um novo produto, não era usado pelo Rei desde 1964, quando ele vendeu um disquinho de vinil com É proibido fumar de um lado e Minha história de amor do outro. Sem nada inédito desde 2005, esse formato pareceu bem viável para um módico retorno.

A moral da história é que o tal compacto vendeu mais de um milhão de cópias físicas em três semanas, foi um dos mais baixados do ITunes e tomou conta das rádios do Brasil inteiro. Além do preço baixo (R$ 9,90), um dos principais responsáveis pelo sucesso avassalador é a balada Esse cara sou eu. É bem verdade que “boas vendas” e “sucesso popular” não são sinônimos de alta qualidade (vide o fenômeno Paula Fernandes). Aliás, a julgar pelos nomes tocados do País segundo o ECAD – João Lucas e Marcelo, com Eu quero tchu, eu quero tcha, e Michel Teló, com Humilde resistência – o cenário é desolador.

CD Esse Cara Sou EuEmbora esteja anos-luz dos melhores momentos de Roberto Carlos, Esse cara sou eu também não se iguala a bobagens popularescas como O charme dos seus óculos ou Mulher pequena. Além disso, a canção traz junto um detalhe simbólico importante: a adesão de Jorge Ailton (baixo) e Chocolate (bateria), ambos da banda de Lulu Santos. Pra quem não sabe, raríssimamente Roberto abre espaço na banda para novos músicos. Aqui, e exceção foi para retribuir os shows que Lulu vem fazendo dedicados ao seu repertório, com direito a Emoções, que há tempos ele não libera para ninguém.

Também incluída no compacto e na trilha de Salve Jorge, o funk melody Furdúncio é uma parceria inédita com Erasmo. Embalada pelas batidas do DJ Batutinha, a canção aponta para um disco de remixes, batizado previamente de Reimixes, prometido para este ano (a versão de Fera ferida apresentada no último especial da Rede Globo foi uma prévia). Pra completar as canções do compacto, foram incluídas outras duas trilhas de novelas que permaneciam inéditas em discos de carreira. De 2009, A mulher que eu amo foi feita para Viver a vida, enquanto A volta foi lançada em 1965 pelo tecladista Lafayette e regravada no ano seguinte pelos Vips. A versão do autor só veio em 2004, no folhetim América.

Além da comemoração pelas boas vendas, 2012 também trouxe outras alegrias para Roberto Carlos. Sempre ligada ao mundo do samba, a cantora Tereza Cristina se aliou ao quarteto roqueiro Os Outros e realizou o sonho antigo de gravar velhos sucessos do Rei. A veterana Célia também cedeu sua experiência a canções famosas na voz do ídolo (mas não compostas por ele) no tributo Outros românticos. Para 2013 fica o projeto Rock Symphony – nos moldes do Elas cantam Roberto, mas com a adesão de membros do rock nacional – que está sendo adiado há quatro anos. Há também a promessa de um disco de inéditas que, se ele se permitir, pode trazer outras boas surpresas.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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