2304va0603Em muitos momentos, o cinema trabalhou com a música para, juntos, contarem histórias e produzirem momentos inesquecíveis. Foi assim em Gimme Shelter, registro da desastrosa turnê de 1969 dos Rolling Stones. Mais ainda com o inesquecível Woodstock, que jogou nas telas uma geração de jovens pelados, cheios de drogas na cabeça, e paz e amor no coração. No Brasil, um bom exemplo é Saravah, registro do francês Pierre Barouh sobre o samba e suas vertentes.

O novo fruto dessa parceria cinema/música é o documentário Sound City, sobre um lendário estúdio de gravação onde foram registrados muitos clássicos. Dirigido e “apresentado” por Dave Grohl, ex-Nirvana e atual Foo Fighters, Sound City (Sony Music) parte do didatismo para a emoção ao falar de uma daquelas improváveis histórias que só o rock é capaz de produzir. Sujo, coberto por um embolorado carpete marrom e com fios aparecendo por todos os lados, o estúdio localizado próximo a Los Angeles se redimiu da feiura produzindo clássicos do nível de Nevermind (Nirvana) e After the gold rush (Neil Young). Até o amalucado Charles Manson deu as caras por lá antes se envolver na série de assassinatos da sua família.

Contando com depoimentos curiosos de Tom Petty, Josh Homme, Trent Reznor, Rick Rubin, John Fogerty e Lars Ulrich, a tônica de Sound City é a presença do fator humano empregado nos discos numa era “pré-pro tools” ou “pré-auto tune”. O roqueiro Tom Petty, líder dos Heartbreakers, lembra que chegou a gravar uma mesma canção 150 vezes até chegar ao ponto ideal. Com os músicos praticamente de mudança para o estúdio enquanto durassem as gravações, o Sound City tinha como ponto alto um clima de intimidade entre as pessoas que o habitavam. Quando faltava um vocal de apoio, por exemplo, não havia problema em tirar a secretária da entrada para coloca-la nos créditos.

Outro ponto alto do estúdio que nasceu nos fins da década de 1960 era uma mesa de som Neve 8028, capaz de operar verdadeiros milagres sonoros, principalmente quando o assunto era gravar uma boa bateria. De tão apaixonado que Grohl ficou pelo equipamento, ele chegou a compra-lo depois que o estúdio fechou as portas (em 2011), e instala-lo em seu estúdio pessoal. Espécie de protagonista do documentário, a mesa de som é também responsável pelos momentos mais emocionantes do filme.

Paul McCartneyAtraídos pelo som maravilhoso da Neve 8028, muitos músicos que participaram da história do Sound City voltaram a se reunir no estúdio de Dave Grohl para uma série de gravações na velha e enorme mesa. Registrando tudo no vídeo, essas jams também foram parar no disco Sound City – Real to reel, espécie de trilha sonora oficial lançada junto com o documentário.

Guiados pelas baquetas do anfitrião, uma série de artistas se reveza num clima de descontração e brincadeira. É bem verdade que a qualidade de cada gravação é proporcional à qualidade do convidado. Paul McCartney, por exemplo, enche o estúdio com sua presença desconcertante e, junto com o outro ex-Nirvana Krist Novoselic, manda bala em Cut me some slack. Além do ex-Beatle, deixam suas impressões Brad Wilk e Tim Commerford (ambos do Rage Against The Machine), Corey Taylor (Slipknot, Stone Sour), Joshua Homme (Queens of The Stone Age), Trent Reznor (Nine Inch Nails), Nate Mendel, Pat Smear e Taylor Hawkins (os três últimos do Foo Fighters). Unidos por ideal analógico, eles cantam sobre tempos musicais que não voltam.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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