Guilherme Arantes 3 crédito Pedro Matallo

Fotos: Pedro Matallo

Embora tenha lançado o primeiro disco em 1974, com parte do quinteto progressivo Moto Perpétuo, foi na década seguinte que Guilherme Arantes viveu seu auge de popularidade. Músico virtuoso, vocalista convincente e compositor versátil, o paulistano era uma figura fácil no rádio, na televisão e nos palcos. A cada novo disco, um pacote de grandes sucessos era entregue nos meios de comunicação e logo estavam também na ponta da língua do público. São dessa época Deixa chover, Amanhã, Meu mundo e nada mais e Brincar de viver, canções obrigatórias no repertório do artista.

Agora com 59 anos, Guilherme Arantes vive outro momento de vida e estrada. Morando na Bahia, onde montou o estúdio Coaxo do Sapo, ele está há sete anos sem disco de inéditas. Certo do que já construiu até aqui, diminuiu a produção, mas nunca parou de fazer shows, como o que vem apresentar de sexta a domingo na Caixa Cultural de Fortaleza. Além de enfileirar todos os grandes hits que compôs ao longo dos quase 40 anos de carreira, o músico, acompanhado somente do seu piano, ainda apresenta canções do seu novo trabalho, Condição humana.

375996_595635803789513_1404510800_nMais questionador e contundente, o Guilherme que surge em 2013 soa de forma bem diferente para quem tem na memória o garoto praiano de cabelos longos. O tempo, a política e o marasmo da sociedade são temas que sobrevoam os pouco mais de 40 minutos de Condição Humana. “(O período sem disco) foi um tempo de preparação para fazer um caldo mais grosso. Tinha que ser um diferencial na carreira. Pela própria sonoridade, as letras, (o disco) tem mais consistência. É um disco mais ambicioso”, avalia em entrevista por telefone. E, claro, para quem compôs Êxtase e Ouro, o amor não ficaria de fora. “Não há nada mais transformador que o amor”, avaliza.

Apesar de boa parte das faixas serem inéditas, Condição Humana traz algumas coisas que estavam guardadas há algum tempo. É o caso de Você em mim, escrita há quatro anos para Maria Bethânia, mas que ficou de fora do repertório da baiana por que foi entregue depois que ela havia fechado o disco. “Guardei essa por que é boa. Um hit. Era pra ser um novo Brincar de viver”, explica. No entanto, a mais velha do repertório é Castelo do reino, composta quando Guilherme contava 15 anos de idade e sonhava ser um músico erudito. Na faixa, ele usa um cravo que foi buscar recentemente nos EUA.

Em grande parte, Condição Humana deve sua existência ao tributo A voz da mulher na obra de Guilherme Arantes, lançado em 2012 pela gravadora Joia Moderna. Com vinte faixas interpretadas por vozes femininas de diferentes épocas da MPB, a repercussão gerada pela homenagem fez o homenageado confirmar sua influência nas novas gerações. Tanto que é que um time de jovens vozes – Tulipa, Tiê, Kassin, Jeneci e Bruna Caram entre elas – montam um coro luxuoso em Condição Humana. “Eu convidei todos pessoalmente. Já tinha ouvido que essas pessoas gostavam de mim. Foram três tentativas de conciliar (as agendas), por que não queria abrir mão de ninguém. Foi uma celebração de uma geração que tem afinidade comigo. Eles não fazem música de balada. Eles têm perfil de música de cabeça, melodia, palavra. Isso é um ponto de convergência”.

GAlém do interesse dos novos, a necessidade de se expressar de forma legítima foi fundamental para um disco feito orgulhosamente sem produtor ou pressão comercial. Daí Guilherme soar mais doce e feroz do que de costume. Citando de Taiguara a Steve Jobs (a quem chama de “tecnocrata do bem”) como pessoas que tinham o amor à frente do dinheiro, o paulistano até sente falta de certa angústia na sociedade. “As pessoas tem medo da angustia. Eu sou um angustiado e acho ela necessária para o mundo. Bob Dylan, Cazuza, Morrissey e Renato Russo eram pessoas angustiadas. Os (anos) 1980 não tinham problema com a angústia, mas nos 1990 parece que é tudo alegria. Parece uma grande inclusão social. Tudo farsa, tudo palhaçada. O mundo continua pateticamente falho”, desabafa.

Sem saudade dos anos de apogeu, Guilherme Arantes sente que seu recado já foi bem dado. “Foi tudo uma delícia. Não tenho reclamação nenhuma. Foi suficiente para construir um patrimônio imaterial, de marcar vidas. Isso é mais importante que ganhar dinheiro”. Diante dessa constatação, ele já sabe o que esperar de Condição Humana. “O que eu esperava, já obtive. O disco ser ouvido e entrar na vida das pessoas. Não importa a quantidade. Tem musicas que têm essa possibilidade de sucesso, mas não exijo de mim uma performance como nos anos 1980. Só queria algo que me pusesse de pé”.

Serviço
Quando: sexta-feira (31) e sábado (1º), às 20h; domingo (2), às 19h
Onde: CAIXA Cultural Fortaleza (Av. Pessoa Anta287 – Praia de Iracema)
Quanto: R$ 20 e R$ 10. À venda no local
Outras informações: 34532770

E mais:

> No sábado (1º), às 15h, o músicos Guilherme Arantes vai receber os fãs para uma tarde de autógrafos do disco Condição Humana. O encontro acontece na loja Desafinado Del Paseo (Av. Santos Dumont, 3131, 3º piso – Aldeota). Aberto ao público.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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