Foto: Leo AversaLuís Maurício Pragana dos Santos, o Lulu Santos, não é mais aquele jovem guitarreiro que subiu no palco do Rock in Rio de 1985 usando calça apertada e joelheiras. Hoje ele é um senhor de cabelos brancos (orgulhosamente assumidos desde a década de 1990), barba volumosa e trajando colete e gravata. A elegância é uma novidade no vestir do músico que completou 60 anos no dia 4 de maio último.

Para comemorar a efeméride, o carioca se deu de presente um disco especial, onde homenageia a Erasmo e Roberto com regravações cheias de ideias novas. Relembrar sucessos da dupla, que vão da Jovem Guarda, passam pelas incursões black e hippie, e chegam à atualidade romântica, foi uma de forma de Lulu resgatar a essência e a fonte da sua canção.

Egresso da geração roqueira dos Anos 80, Lulu Santos soube passear bem por muitas praias. Rock, blues, pop, eletrônico, samba, funk são algumas coisas que sempre estiveram presentes na sua música. No entanto, ele nunca deixou de se assumir um eterno romântico. E nesse assunto de corações em chamas, abraços apertados e beijos calorosos, ninguém fez melhor no Brasil do que Erasmo e Roberto. É verdade que, nem eles são os primeiros, nem Lulu é o último romântico. Mas em assunto de amor, os três sabem extrair melodias e histórias inesquecíveis e atemporais.

O disco Lulu Canta & Toca Erasmo e Roberto (Sony Music) nasceu de um convite do Banco do Brasil, para que ele, Maria Bethânia e Sandy montassem shows especiais para o projeto Circuito Cultural. A ideia era que cada convidado fizesse releituras de algum artista da sua predileção. Enquanto Bethânia escolheu Chico Buarque e Sandy escolheu Michael Jackson, Lulu foi de Roberto e Erasmo e recebeu críticas elogiosas ao resultado. Até o próprio Rei se deu ao trabalho de sair do seu castelo na Urca para ir conferir a homenagem. O resultado agradou tanto o compositor de Cachoeiro do Itapemirim, que ele saiu de lá com um convite para gravar junto com a banda de Lulu o recente hit Esse cara sou eu.

Apesar de serem uma espécie de Lennon e McCartney da música brasileira, poucas pessoas tiveram licença de dedicarem um disco inteiro às composições da dupla. A anônima Sônia Melo fez dois volumes em 1976 e 1979, e que hoje vivaram ouro de garimpo. Em 1978, foi a vez de Nara Leão lançar Debaixo Dos Caracóis Dos Seus Cabelos, cujas versões digitais só puderam ser liberadas com a exclusão da faixa Quero que vá tudo pro inferno. Mais sorte teve Maria Bethânia, que não passou por nenhuma censura na hora de gravar o estrondoso sucesso As canções que você fez pra mim (1993). Cauby Peixoto também teve a anuência do Rei na hora Foto: Leo Aversade gravar seu Cauby interpreta Roberto (1993). O único pedido foi para que ele não batizasse o disco de “Cauby canta Roberto”, pra não pegar mal, bicho. Mais recentemente foi a vez da sambista Tereza Cristina se unir aos roqueiros Os Outros para um tributo surpreendente.

No caso de Lulu, as coisas foram sendo facilitadas por que já haviam sido testadas ao vivo. Buscando dar um às canções um estilo próprio, o carioca escolheu 13 canções de diversas épocas da dupla e jogou um molho pop e moderno por cima. Quanto mais ele se apropriou de cada faixa, mais interessante ficou o resultado. É o caso de Como é grande o meu amor por você, que virou um fox elegante sussurrado pelo cantor. Bem escolhida para puxar o disco nas rádios, a música até ganhou clip dirigido por Lázaro Ramos. Embora já tenha ganho boas leituras de Elis Regina e do próprio Roberto Carlos, As curvas da estrada de Santos também ficou bonita num arranjo bluseiro. O mesmo ritmo dá novas molduras para Minha fama de mauQuando, com Lulu encarnando um B.B. King branquelo.

Algumas versões, por outro lado, chamam atenção mais pela curiosidade. Caso de Se você pensa, que virou um xote safado, puxado pelo teclado. O mesmo acontece em Sou uma criança, não entendo nada, que perdeu o sensacional clima hiponga para virar um descontextualizado rock acelerado. Com Festa de arromba, Lulu está em casa e bota sua guitarra pra trabalhar.

Ao fim dos disco fica uma sensação de Lulu Santos tinha espaço para ousar mais, brincar mais com as canções. No entanto, mais que um disco, esse projeto é um presente de aniversário que o artista deu para si mesmo. Por isso, tudo a ver ele encerrar com Emoções, conservando as intenções e a beleza deste hino, que Roberto Carlos reluta em liberar novas regravações. Ao que parece, Lulu teve carta branca geral.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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