MDC_capa-encarte_21_final-410x410Contam que quando apresentaram o som de Bob Marley para Dominguinhos, o sanfoneiro virou de volta e disse: “isso que é o reggae?! Mas isso é um xotezinho muito do safado”. Sabedor e mestre no que diz, o pernambucano já adiantava ali que o limite entre os estilos pode ser da largura de um fio de cabelo. De uma forma ou de outra, esse preâmbulo explica as raízes de Festa no Céu, segundo disco do grupo Menina do Céu. Guiado pela boa voz de Izabella Brant, carioca de vida mineira (mas sem nenhum parentesco com o compositor Fernando Brant), o septeto busca regenerar o já tão desgastado forró dando-lhe bons arranjos, interpretações e repertório. O primeiro quesito é o melhor atendido. Com formação musical acadêmica, Izabella é uma contralto de timbre charmoso e seguro. É bem verdade que a música que se faz atualmente no Nordeste – seja o axé ou o forró dito de “plástico” – é o paraíso das contraltos, todas cantando “semgraçamente” iguais. Esse não é o caso da voz à frente do Menina do Céu, que desliza com firmeza sobre arranjos que, de fato, não chegam a impressionar e até caem na pasteurização. Theo Lustosa (também produtor de Festa no Céu) faz bonito na sanfona, mas fica difícil engolir forró com baixo, bateria e guitarra. Ainda mais por ser disco primordialmente de versões para hits alheios. De Peninha (Sozinho) a Milton Nascimento (Bola de meia, bola de gude), tudo vira forró. Até Bruno Gouveia, vocalista do Biquini Cavadão (e marido de Izabella Brant), entra nessa roda. Confirmando a tese de Dominguinhos, o cantor faz de Vento ventania (Bruno/ Álvaro/ Miguel/ Coelho/ Sheik/ Beni) um “xotezinho safado”. Em seguida, volta em Viver em paz (Jader Joanes/ Bruno Gouveia/ Túlio Lustosa) , uma mistura meio bizarra de forró, reggae e rap (!). Mas é na curiosidade que o disco cresce. Transformar a discoteque Lindo lago do amor, de Gonzaguinha, em forró é uma aventura. Mas, repetir Vida do viajante (Luiz Gonzaga/ Hervê Cordovil) e Lembrança de um beijo (Accioly neto) é mais do mesmo. E, no meio da pequena produção e boa autoral, pelo menos um achado. Menino angola (Theo Lustosa/ Paulinho Motta) traz como referência óbvia os melhores momentos de Zé Ramalho. Mais ainda pela presença de Arleno Farias, cuja voz é capaz de confundir até a mãe do compositor de Avohai. No fim da história, esse segundo disco do Menina do Céu mostra pouco potencial para colocar o forró de volta nos seus trilhos. Em termo de mercado, a banda pode conseguir espaço em novelas, algumas rádios e garantir muita diversão nos shows. Mas, enquanto disco, faltou algo de ousadia.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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