SELVAGENS_foto_rafaelKENT_0001Volta e meia, alguma banda surge com a promessa de garantir a “salvação do rock”. O marasmo que tomou conta do estilo, principalmente em se tratando de mercado brasileiro, talvez aumente essa expectativa messiânica. No entanto, quem diria, é de Fortaleza que surge uma das mais fortes apostas dessa geração pós-anos 2000. Apesar dos poucos anos de história, o Selvagens à Procura de Lei vem pisando nesse chão roqueiro cercado de elogios de gente graúda, como o jornalista Jamari França, David Corcos e Dinho Ouro Preto.

O vocalista do Capital Inicial, inclusive, é um dos mais empolgados dessa lista e vem citando os cearenses por onde passa. “É a banda que mais me deixou de boca aberta nos últimos tempos. To vendo se faço uma produção, uma apadrinhada, por que precisa de renovação no rock brasileiro”, afirmou Dinho, em 2012, em entrevista ao O POVO. A promessa foi cumprida e o músico surpreendeu os Selvagens quando chegou ao estúdio onde a banda gravava seu segundo disco, lançado este mês.

“Durante a gravação do disco, a gente foi na casa do Dinho e ele foi super simpático, emprestou uns baixos sinistros, vintage. A gente gravou com a guitarra dele. Era a referência de rock adulto que a gente precisava”, lembra orgulhoso Gabriel Aragão (voz, guitarra, violão e piano). Depois disso, Selvagens e Capital ainda se encontraram ao vivo no Prêmio Multishow 2012, com as bandas bicando o repertório uma da outra.

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Formado em 2009 por Rafael Martins (voz e guitarra), Caio Evangelista (baixo e voz) e Nicholas Magalhães (voz e bateria), além de Gabriel, a banda – que costuma reduzir seu nome à sigla SAPDL – começou sua história ocupando os palcos locais, como o Ceará Music, Rock Cordel e Órbita Bar. Depois de alguns compactos, gravaram o primeiro CD, Aprendendo a mentir, em 2011. Apesar da alta qualidade sonora (com destaque para Adeus é tudo que eu preciso ouvir de você), o disco foi um projeto simples e independente, que ficou reservado para os shows e fãs.

Dois anos depois, o segundo disco do SAPDL chega com o aval de uma grande gravadora, no caso, a Universal Music. Produzido por David “Marroquino” Corcos (também responsável pelo disco solo de Dinho Ouro Preto e pela aproximação da banda cearense com o cantor), o disco deixa de lado todo e qualquer modismo ou exagero, para apostar no básico, enérgico e melodioso. Tamanha simplicidade, encontrada da capa aos arranjos, é um bom sinal.

selvagensaprocuradaleicapaSelvagens à Procura de Lei, o disco, traz 12 canções que mesclam bem os elementos típicos de uma banda de rock. Letras inteligentes em discurso bem construído, guitarras à frente sem solos pirotécnicos, e, principalmente, vocais bem feitos, uma raridade nessa seara. Meio rock, meio rap, Brasileiro foi a escolhida (inicialmente contra a banda, que preferia Juventude Solitude) para puxar o trabalho nas rádios e traz um discurso político consistente. “O Brasil é medroso, você também é”, bradam. Incluída por insistência de Dinho (que ameaçou não comprar o disco, se o contrário acontecesse), Crescer dói é um mantra para a juventude, com sotaque “coldplay”. O rockão Mucambo cafundó foi resgatado do primeiro disco e volta com a mesma pegada.

Já o country folk Música de amor número um (que também quase fica de fora) é uma homenagem de Gabriel para a namorada Claudia. Despedida é a balada que Tim Maia não teve tempo de compor. O baterista Nicholas até faz um contracanto que lembra o soulman carioca. Outro destaque fica para a soturna Sr. Coronel, criada sobre um personagem real. “É um senhor que mora no prédio de um amigo e que o pessoal meio que o desprezava, por que ele desprezava todo mundo. Negros, gays, todo mundo. Eu imaginei essa figura solitária e fiz a música”, conta Gabriel.

Para Gabriel, hoje essas canções podem soar anacrônicas para o SAPDL, uma vez que foram gravadas em 2012, mas só lançadas este ano. “Talvez, se fosse independente, tivesse lançado ainda no ano passado”, relativiza o músico, que já tem planos e repertório para um novo trabalho. Afirmando que a relação com a gravadora tem sido “muito boa”, ele adianta que contrato prevê outros dois discos.

No entanto, a julgar pela voz tranquila do vocalista, nem a cobrança dos elogios nem a gravadora devem tirá-los do caminho que escolheram para a banda. Aproveitando ao máximo as oportunidades que têm encontrado, eles até se surpreendem ao ouvir elogios de gente como Marcelo Yuka ou Marcelo D2. “É muito bizarro isso, mas mostra que estamos no caminho certo e não nos distraindo com bobagens. Não tem essa de que roqueiro tem que se vestir assim, beber pra caralho. Nós somos bem diferentes, mas isso nos torna especial. É o nosso sotaque, a nossa amizade. Acho que realmente estamos no caminho certo”, encerra o músico.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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