IARA_RENNÓ_por_HELÔ_DURAN_2 OKO nome de Iara Rennó já dá uma senha para quem quer conhecer esta jovem artista brasileira. O sobrenome foi herança do pai, o compositor Carlos Rennó, parceiro de muitos como Rita Lee, Lenine e Tom Zé. Mas a relação dela com a música é mais profunda e inclui a mãe (Alzira Espíndola), a tia (Tetê Espíndola), um primo (Dani Black) e a irmã (Luz Marina). Ainda assim, Iara tentou seguir em outra arte e foi se dedicar ao teatro. Como o destino era inevitável, a música tornou-se uma presença forte em sua vida e acabou se mesclando com a atuação cênica.

Na música, ao longo de pouco mais de 10 anos, Iara Rennó esteve à frente de diversos projetos que chamaram atenção na cena underground brasileira. Principalmente naquela cena que se faz em São Paulo, sua terra natal. Em 2001, ela se juntou com Andrea Dias, Anelis Assumpção, Gustavo Ruiz e outros para montar o grupo DonaZica, que rendeu os discos Composição (2003) e Filme Brasileiro (2005). Em 2008 foi a vez da ambiciosa Macunaíma Ópera Tupi, que se desdobrou em um espetáculo do Teatro Oficina e num disco (2010), inspirado no herói torto de Mário de Andrade. Em 2012 teve ainda o projeto carnavalesco A.B.R.A Pré-ca – Amigos Bandidos Residentes no Amor Pré & Carnaval, feito com Cibelle, Rubinho Jacobina e a banda Do Amor.

iaracapaNesse currículo, acrescente ainda a banda de Itamar Assumpção e composições gravadas por Ney Matogrosso, Elza Soares e outros. No entanto, um primeiro disco assinado apenas com seu nome veio somente agora. Lançado de forma discreta pela Joia Moderna, Iara traz 12 faixas, das quais apenas uma não é assinada pela paulistana. Trata-se de Roendo as unhas, samba de Paulinho da Viola lançado no disco Nervos de Aço (1973).

No entanto, quem pular as fixas direto até a releitura de Roendo as unhas pode tomar se assustar com o clima assustador da releitura. Isso por que Iara foi construído sobre um terreno sonoro árido e quebradiço, embora perfeitamente frutífero. Produzido por Moreno Veloso, o disco remete ao conceito dos transambas colocado recentemente por Caetano Veloso quando da montagem da BandaCê. Seguindo no percurso do ídolo baiano, Iara Rennó pegou a guitarra e montou seu power trio com Ricardo Dias Gomes (baixista da BandaCê que aqui assume um mini-sintetizador) e Leo Monteiro (bateria, percussão e ruídos).

“Só faltavam asas e agora já não falta quase quase nada”, revela Iara Rennó, com sua voz peculiar, na faixa Já era, que abre o disco. Introduzida com guitarra, depois bateria e ruídos, a faixa entrega as intenções roqueiras de Iara, que se furta o direito de brincar com outros ritmos. Seu José, por exemplo, poderia ser um samba sobre o dono da venda da esquina. Mas transformou-se num rock amorfo, calcado num simples riff de guitarra e no vocal lisérgico que reforça a história louca de uma coçada no calcanhar.

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Aliás, lisergia talvez seja o elemento básico que guia Iara entre tantos estilos, sem se apegar de fato a nenhum deles. Outros tantos, por exemplo, vem em duas versões, onde uma puxa para a bossa e a outra para o punk. E há ainda experimentações curiosas, como a enérgica Miligramas, onde a voz performática da cantora desliza sobre um instrumental seco de bateria e ruídos. Ou ainda Arroz sem feijão, uma mistura de Maysa e Adoniran Barbosa com Kraftwerk. Se parece improvável, tal mistura é só um petisco para uma artista que, seguindo o rumo da família, foge das regras simplistas do mercado fonográfico e se mostra audaciosa em seu disco de estreia.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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