Moraes-70s-1As coisas não andavam bem para Moraes Moreira naquela primeira metade dos anos 1970. Depois de lançar quatro discos ao lado dos Novos Baianos, o cantor e compositor baiano de Ituaçu percebia que sua vida precisava de mudanças. Casado e pai de duas crianças, ele se via obrigado a ter mais cuidado com a carreira, o que batia de frente com os ideais hippies e a vida em comunidade da banda. Depois de tentar em vão negociar mais liberdade com os colegas, a solução foi partir para começar uma nova vida.

Nem todo mundo acreditava em Moraes Moreira sem Novos Baianos, mas ele quis tentar. O empresário e produtor João Araújo (1935 – 2013) acreditou e resolveu ajudar a realizar o primeiro disco. Lançado em 1975, o LP Moraes Moreira reuniu parcerias com Luiz Galvão, que haviam sobrado dos Novos Baianos, com novas canções e uma releitura curiosa de Se você pensa, de Roberto e Erasmo Carlos. Reforçando as fusões de ritmos brasileiros com rock e blues, marca da época que tocava com Pepeu Gomes, Baby Consuelo e Paulinho Boca de Cantor, é esse disco que abre o box Moraes Moreira Anos 70, lançado pelo selo Discobertas.

Box MORAES MOREIRA perspectivaAlém de Moraes Moreira (1975), o box traz os discos Cara e coração (1977), Alto falante (1978) e Lá vem o Brasil descendo a ladeira (1979). Juntos, esses discos compõem um retrato do compositor baiano em busca de uma nova identidade artística. “Canto e assobio, desabafo e desafio. Após o rio a minha voz, a minha vez, a vez de nós”, anunciava ele em Desabafo e desafio, faixa em tom de embolada que inaugura a carreira solo.

Agora como artista solo, coube ainda para Moraes a missão de montar uma nova banda. Foi aí que, numa conversa com Wally Salomão, ele chegou ao conterrâneo Armandinho Macêdo, uma virtuose no bandolim e na guitarra baiana, que tem ainda a seu favor o fato de ser filho de Osmar, um dos criadores do trio elétrico. Além dele, foram chegando o baixista Dadi Carvalho (outro ex-Novo Baiano), o tecladista Mu Carvalho (irmão de Dadi) e o baterista Gustavo Schroeter (ex-A Bolha). Futuramente, esse quarteto ganharia o nome de A Cor do Som fazendo uma carreira paralela ao trabalho com Moraes.

CAPA MORAES 1CAPA MORAES 2Como foi a The Band para Bob Dylan, o A Cor do Som deu o suporte perfeito para que Moraes construísse um novo terreno para sua música. Misturando peso roqueiro com suingue baiano e outros ritmos nordestinos, eles dividem o crédito de sucessos como Pombo correio. Até hoje um sucesso dos carnavais, a faixa do disco Cara e coração foi composta por Dodô e Osmar em 1952, mas em 1974 ganharia a letra feita por Moraes. Ainda desse disco, o baiano celebraria seu filho Davi com Davilicença, um duelo de cordas ao lado de Armandinho.

CAPA MORAES 3CAPA MORAES 4Com a boa recepção de Pombo correio, Moraes foi se distanciando do título de “ex-Novos Baianos” pra ser só Moraes. É o que se vê em Alto Falante, que inaugura parcerias com Abel Silva e Fausto Nilo. São nada menos que seis composições com o poeta cearense, com destaque para o blues rock Pedaço de canção, que depois ganharia regravação de Amelinha.

A boa parceria com Fausto seguiria em Lá vem o Brasil descendo a ladeira, cujo título foi tomado de um comentário de João Gilberto ao ver uma mulata caminhando pela rua. Com Pepeu Gomes de volta ao seu time, Moraes Moreira encerrou a década de 70 com seu disco mais carnavalesco e fez sucesso com Chão da praça. Além disso, o disco trazia um apuro técnico ainda inédito em sua carreira e a presença de músicos experientes como Oswaldinho, Márcio Montarroyos e Zé Bodega. Na sequência, vieram outros sucessos que solidificaram a carreira de Moraes, como os discos Bazar Brasileiro (1980) e Coisa acesa (1982). Mas aí já é outra década que também espera ser resgatada em novo box.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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