capa-iancurtis-baixaChegou ao Brasil no mês passado a biografia Tocando a distância, escrita por Deborah Curtis, viúva do líder do Joy Division. Lançado pelas Edições Ideal, o livro vem recheado de lembranças domésticas que passam pelos esforços do músico para sustentar a família e alcançar as glórias da fama.  Tocando a distância se completa ainda com textos do jornalista Jon Savage e do brasileiro Kid Vinil, bem como com todas as letras de Ian, entre elas algumas inéditas, manuscritos e fotos de família.

Na biografia, Deborah revela histórias sobre o casamento conturbado, a depressão do marido, o nascimento da filha Natalie, os ataques de epilepsia, o caso com a jornalista belga Annik Honoré – falecida em 3 de julho deste ano de uma doença grave não revelada – e o suicídio em 1980. Lançado originalmente em 1995, Tocando a distância serviu de base para o filme Control (2008), de Anton Corbijn. O filme narra a curva trágica de Ian Curtis, em seus últimos anos de vida.

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Matéria publicada no Vida & Arte, no dia 15 de julho, data que Ian Curtis completaria 58 anos de nascimento

“Joy Division e New Order são as fases cíclicas da mesma doença; uma psicose maníaco-depressiva em forma de música que deixou marcas indeléveis na história do rock”. A descrição da revista Bizz para as duas metades de uma mesma banda sintetiza o peso da passagem da década de 1970 para a seguinte, que teve como primeira vítima o jovem Ian Curtis. Fascinado por ídolos limítrofes como Jim Morrison, Lou Reed, William Burroughs e David Bowie, ele viveu pouco e deixou apenas dois discos gravados. O suficiente para mandar um recado.

Joy-Division-joy-division-1563347-622-480Nascido em 15 de julho de 1956, no distrito de Trafford, no Reino Unido, Ian Kevin Curtis demonstrou cedo seu interesse por poesia e música, ao mesmo passo que deixava claro a pouca afinidade com os estudos tradicionais. Chegou a trabalhar como funcionário público e numa loja de discos, mas só descobriu seu caminho em 1976, quando viu a atuação despudorada dos Sex Pistols. Assim como com os outros poucos que estavam na plateia, Ian viu seu futuro sobre o palco.

Quem também viu aquele primeiro show dos ícones punk em Manchester foram Bernard Sumner (guitarrista) e Peter Hook (baixista), dois jovens à procura de um vocalista para a banda que pretendiam montar. Curtis se ofereceu para o cargo e levou suas letras de tom amargo, que foram prontamente aceitas. Juntando ainda o baterista Stephen Morris, estava formado o Joy Division. O nome da banda, tirado do livro A Casa das Bonecas (The house of dolls), de Yehiel De-Nur, faz referência às áreas dos campos de concentração onde ficavam as prisioneiras judias usadas em atos sexuais.

54dc27fd0d07048da9c478dfea02d6abReunindo o clima soturno de bandas como The Doors, a urgência do rock, elementos eletrônicos e letras falando em distância, frustração e morte, o Joy Division tornou-se um marco do pós-punk, que influenciou nomes como Killers, Franz Ferdinand e Legião Urbana. Com voz grave e sem variações, Ian Curtis reforçava as intenções das palavras. Conhecido pela personalidade distante e introspectiva fora dos palcos, sob os refletores ele se contorcia de forma desconexa e aflita, como se quisesse dar novo significado aos ataques epiléticos que vinha sofrendo há algum tempo.

Poucos devem ter previsto, mas a compulsão de falar em morte era anúncio do que seria o fim da história de Ian Curtis. Atormentado pela iminente separação, pela filha ainda pequena para criar e por um caso extraconjugal com uma jornalista, ele deu fim à própria vida em 18 de maio de 1980. Pouco antes de encabeçar a primeira turnê do Joy Division pelos E.U.A., o músico foi encontrado morto na cozinha, enforcado numa corda que usava como varal. Segundo testemunhas, ele estava ouvindo o álbum The idiot, estreia solo do cantor Iggy Pop, outro dos seus ídolos.

Se foram as pressões da carreira e da vida doméstica ou simplesmente o desejo de morrer jovem, tão em voga nos anos 1960 e 70, pouco se sabe sobre os reais motivos do suicídio de Ian Curtis. O fato é que, com apenas 23 anos, ele encerrou um capítulo da história da música moderna. Seus companheiros de banda resolveram juntar os cacos, acrescentar outros e refizeram a banda, agora como New Order, que, entre idas e vindas, se mantém na ativa, praticamente, com a mesma formação. Com dezenas de sucessos lançados ao longo da década de 1980, o New Order estreou em disco em 1981, com Movement e logo na primeira faixa, Dreams never end, eles entregam suas intenções: “Sem olhar para trás agora, estamos levando a cabo. Mudaremos nossos sentimentos, experimentaremos e veremos. Mas nunca adivinharemos como ele gritaria”.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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