amoroso-5433c9f3a74e8Falar em clássico de João Gilberto é quase uma redundância. Figura misteriosa e fundamental na música do mundo, o baiano de Juazeiro é desses que não entra em estúdio pra gravar “mais um álbum”. Depois de elevar o padrão com a trinca dourada que lançou as bases da Bossa Nova internacionalmente – Chega de saudade (1959), O amor, o sorriso e a flor (1960) e João Gilberto (1961) -, era difícil imaginar que ele gravasse algo que voltasse a ganhar status de clássico. Foi aí que nasceu Amoroso.

Lançado em 1977, Amoroso cumpriu o papel de trazer o baiano de volta ao seu País. Em tempos onde a música de protesto brigava por um espaço cada vez mais sufocado pela ditadura militar, falar de amor, sorriso e flor era fora de moda. Longe de discussões políticas, João pegou seu melhor amigo pelo braço, o violão, e pintou de tons pasteis algumas canções que estavam no seu radar. A batida imortal da bossa ganhou as alturas com orquestrações de Claus Ogerman e, juntas, expandiram ao infinito do baiano de Juazeiro.

Demasiado brasileiro por um lado, Amoroso tem o balanço delicioso de Tim tim por tim tim, com um João solto no salão. Tem também quatro pérolas de Tom Jobim, incluindo Wave que – pasmem! – foi escolhida como trilha de abertura da novela Água viva. Tem ainda a cortante Retrato em branco e preto, aqui batizada com seu nome original (Zíngaro), antes de ganhar letra de Chico Buarque.

Do outro lado, Amoroso é também o disco mais internacional de João Gilberto. Começa com os irmãos Gershwin (S’ wonderful) e passa para a peça fundamental de Consuelo Velásquez (Besame mucho). Nesse intervalo, a descoberta de um tesouro perdido do italiano Bruno Martino. Com interpretação, no mínimo, perfeita, Estate é a síntese da elegância, introspecção e genialidade musical de João. Com 17 anos e atraso, a música foi descoberta, ganhou fama no mundo e reinterpretações de Joe Pass e Shirley Horn.

Com a consagração de Amoroso, música na novela e novos olhares para uma obra de valor incalculável, João Gilberto voltou a ser notícia no Brasil e emendou shows pelo exterior. Cidadão do mundo, o Brasil é pouco para a economia privilegiada do “guru da Bossa Nova”. Se você não sabe por que ele mereceu tantos confetes ao longo da carreira ou se pensa que ele é só um eremita chato que reclama da zoada do público, ouça Amoroso e tudo ficará esclarecido.

Faixas:
1. ‘S wonderful (Ira Gershwin/ George Gershwin)
2. Estate (Bruno Martino/ Bruno Brighetti)
3. Tin tin por tin tin (G. Jacques/ Haroldo Barbosa)
4. Besame mucho (Consuelo Velasquéz)
5. Wave (Tom Jobim)
6. Caminhos cruzados (Newton Mendonça/ Tom Jobim)
7. Triste (Tom Jobim)
8. Zíngaro (Chico Buarque/ Tom Jobim)

> Triste (Tom Jobim) por Carlus Campos

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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