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Por Demitri Túlio e Marcos Sampaio

“Espero email fazendo figa”. Assim Lucinha Menezes encerrou o recado onde fazia um convite que, se aceito, seria a realização de um sonho para milhares de cantores brasileiros. O tal convite era para que Chico Buarque topasse fazer uma participação especial em seu novo disco, Lúcia, previsto para chegar às lojas em janeiro de 2017. A resposta do compositor foi “sim” e eles gravaram Desencontro, lançada pelo autor no álbum Chico Buarque de Hollanda Vol. 3 (1968).

O convite para Chico Buarque foi intermediado e incentivado pela irmã do compositor de Construção, Miúcha. “A Miúcha é internacional e a criatura mais doce do mundo. É muito minha amiga”, comenta Lucinha que também trouxe a irmã de Buarque para seu disco, que será lançado pela Biscoito Fino. Juntas, elas cantam Sonho de Marinheiro, parceria de João Donato com Fausto Nilo. Além destas, Lúcia, sexto álbum da cearense (mãe do guitarrista Arthur Menezes), traz gravações inéditas de Enquanto Engomo a Calça (Ednardo), Esperança vã (Marcelo Tupinambá) e Viola e Sanfona (inédita João Lyra e PC Pinheiro).

chico-buarque-e-lucia-menezes-040-corte-foto-alexandre-moreiraDISCOGRAFIA – Seu novo álbum traz a participação de Chico Buarque e Miúcha em duas canções. Como se deram as parcerias? 

Lúcia Menezes – Conheci a Miúcha no estúdio Cia dos Técnicos em 2005. O José Milton, meu produtor, nos apresentou. Ela ouviu a gravação da música A Violeira do Chico Buarque e Tom Jobim, gostou, e começamos uma amizade. Ela é uma diva. Fazia um bom tempo que eu tinha vontade de convidar a Miúcha para cantar comigo. Desde que a conheci sempre que começava um novo disco, eu pensava em convidá-la. Pensava demais e acabava não convidando. Agora, estávamos no meio das gravações e pela manhã eu peguei o telefone sem consultar a produção nem ninguém. Apenas rezei uma Ave-Maria e, de supetão, liguei pra Miúcha e convidei. Ela aceitou de pronto e falei, quero também o Chico! Ela muito sorridente falou: convide. Aí, convidei! E ele aceitou!

DISCOGRAFIA – Nos CDs anteriores, você já havia gravado músicas dele…

Lúcia – Em todos os meus CDs feitos aqui no Rio, sempre gravo uma música do Chico e entrego a ele. Nos conhecemos desde que gravei A Violeira, ele é um homem gentil, atencioso, simpático, atento. Ele é meu gênio preferido, essa frase quando eu digo pra ele, ele ri muito. Até porque, na primeira vez, falei que tinha dois gênios preferidos: ele, Chico, e o Van GoghO momento com a Miúcha foi maravilhoso. Gravamos a linda Sonho de Marinheiro, do João Donato e do Fausto Nilo. É a realização de um grande e lindo sonho.  Com o Chico foi um sonho que eu considerava quase impossível. Quando terminamos de gravar no estúdio, falei: Me belisca! Acho que estou sonhando.

DISCOGRAFIA – Vocês cantam Desencontros, gravada pela primeira no final dos anos 60. O que há de diferente nessa nova interpretação?

Lúcia – Desencontro é dele, letra e música. Fala de amor, saudade, passado esmaecido em fotos e cartas, acho que de alguém que já passou e não deixou sofrimento, só recordação. Essas coisas mesmo dos nossos amores antigos, uma certa melancolia. É perfeita! A música é lindíssima, envolvente. Parece que música e letra nasceram ao mesmo tempo. Quando ouço, mesmo já cantada por nós dois, vejo a cena da pessoa arrumando armários e revendo com carinho aqueles pedaços de passado em fotos e papéis, vejo isso em preto e branco. Aí, me coloco na música e sinto aquele gostinho da adolescência fervente e, agora com calma, entro no passado e sinto saudade boa. O arranjo belíssimo é do Cristovão Bastos e nós cantamos no mesmo tom que o Chico gravou, acho que em 1968.

DISCOGRAFIA – Além dos irmãos Buarque, o que tem mais nesse novo CD?

Lúcia Menezes – É o meu primeiro pela Biscoito Fino, se chamará Lúcia e tem produção de José Milton e arranjos de João Lyra e de Cristóvão Bastos. Antes de vir para o Rio, havia lançados dois em Fortaleza (1991 e 1996). Aqui no Rio, comecei um novo conceito de gravações com o José Milton. Releituras de gravações da época de Ouro da MPB. E outras contemporâneas que fazem parte da nossa memória musical. Neles sempre tem uma do Ednardo, porque eu amo suas canções, acho geniais. O Ceará está presente na obra dele, bem juntinho do meu coração. E também, algumas inéditas que trazem um estilo bem característico da nossa MPB. Assim, gravei o  Lúcia Menezes, lançado pela Kuarup em 2005. Com o Pintando e Bordando, lançado pela Som Livre em 2008, fui indicada para o Grande Prêmio da Música Brasileira, na categoria “Melhor Cantora Regional”. Em 2012 lancei o Lucinha, pela Timbre. Esse tocou muito no rádio e ainda toca. Quanto ao diferencial, acho que as participações de Chico Buarque e Miúcha, né? Isso foi demais!

DISCOGRAFIA – Você está há 13 anos fora de Fortaleza, sua carreira como cantora aconteceu no Rio de Janeiro?

Lúcia – Minha carreira de cantora profissional começou em 1988, em Fortaleza, no memorável Festival de Camocim, quando cantei a música vencedora Se a Amazônia falasse, de Pedro Magalhães. Nesse dia ganhei também o prêmio “Intérprete Revelação”. Foi uma maravilha, inesquecível, parecia um sonho. Enquanto eu cantava o Pedro, autor da música, estava na plateia, grudado no palco e chorava. Que dia lindo aquele! Aqui no Rio continuei a carreira e fiquei mais conhecida Brasil afora.

DISCOGRAFIA – Quando será lançado o álbum no Ceará?

Lúcia Menezes – Assim que o disco ficar pronto, está previsto para a segunda semana de janeiro, marcaremos a data. Cantar em Fortaleza é o meu maior contentamento. Tenho raízes fincadas aí. Adoro nossa linda Noiva do Sol. Sou marcada pela saudade daí.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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