São 36 anos de carreira divididos entre uma estrada solo e uma das mais populares bandas de rock do Brasil. Ao lado do Barão Vermelho, Roberto Frejat lançou 18 discos – entre registros de estúdio e ao vivo – e um caminhão de sucessos. Paralelo ao projeto que dividiu com o amigo Cazuza, ele iniciou em 2001 uma carreira solo que rendeu quatro discos e alguns singles.

Sempre com amor pra recomeçar, Frejat deu adeus ao Barão Vermelho em janeiro deste ano e agora segue sua estrada sozinho. Bom, nem tão sozinho. No show que ele apresenta hoje em Fortaleza, o violão é seu companheiro de palco e o ajuda a relembrar canções como Segredos, Homem Não Chora e Trocando em Miúdos, essa de Chico Buarque e Francis Hime. Por email, o carioca de 55 anos fala sobre o novo momento de sua carreira.

O POVO – Depois de uma história ao lado de uma banda e tocando guitarra, como é fazer um show solo com um violão?
Frejat – Um desafio, pois no palco sou apenas eu e as canções no seu estado mais simples. Por outro lado, é muito estimulante poder fazer um show onde o repertório tem a liberdade de não depender de arranjos coletivos. Posso ir para onde quiser.

O POVO – O violão é a base do blues e o blues está na gênese do Barão. Como é sua relação e sua história com esse instrumento? Tocar violão é algo que você se dedicou tanto quanto com a guitarra?
Frejat – A maioria dos guitarristas brasileiros da minha geração e das anteriores começou no violão antes da guitarra e comigo não foi diferente. No começo da minha vida profissional ele era mais um instrumento para a composição do que para o palco. Mas isso foi se transformando com o passar dos anos e ele hoje está sempre presente nas minhas apresentações. Uma coisa que realmente é bem diferente é que com a banda eu toco o violão com palheta e nesse show ele é 98% tocado com os dedos apenas.

O POVO – De uns anos pra cá, sua carreira tem sido muito pautada por regravações e shows baseados em interpretações de canções de outros artistas. Como esse lado intérprete vai aparecer no show de Fortaleza?
Frejat – Esse show de voz e violão tem um perfil bem mais autoral. Nas mais de 20 músicas do repertório, só duas não são minhas com os meus parceiros.

O POVO – Sua turnê acústica vem depois do anúncio da saída do Barão Vermelho. Você anunciar a entrada do Rodrigo Suricato passou a impressão de que foi você quem o escolheu como sucessor, como se você ainda desse as cartas na banda. Como foi essa decisão de sair da banda e essa troca de bastão para o Rodrigo?
Frejat – Acho que aqui há um erro de informação. Eu sabia que seria ele quem iria ocupar o meu lugar, mas não fui eu que o anunciei. No meio do ano passado eu comuniquei aos outros membros que não estava disposto a fazer uma turnê esse ano e como todos queriam, eu os deixei à vontade para seguir sem mim. Não me sentiria bem impedindo-os de levar seu desejo à frente. Da mesma forma como não ia dar certo eu fazer a turnê apenas para agradá-los. Depois de algum tempo, fui informado de que levariam a idéia em frente e que estavam decidindo quem seria o próximo cantor e guitarrista, assim como fui informado da escolha assim que ela aconteceu.

O POVO – Do que você acha que vai sentir mais falta estando longe do Barão?
Frejat – Prefiro não pensar nisso nesse momento, mas sempre tive um enorme prazer de tocar ao vivo com a banda e isso não mudou. Além disso, tenho muito carinho por todos eles. São meus amigos para o resto da vida.

O POVO – Em setembro, o Barão já sofreu com a perda do Peninha. Sempre achei curioso ter um percussionista como integrante de uma banda de rock. Queria que você falasse da importância dele na sua história como músico e para o som do Barão.
Frejat – O Peninha foi fundamental para a construção do nosso som. Ele já tinha uma vivência musical muito grande antes de se juntar ao grupo e isso nos enriqueceu muito. Ele era uma artista da arte de ser músico e foi uma das pessoas com quem mais aprendi em toda a minha vida musical. Além disso, tinha uma personalidade e alegria ímpares e construímos uma amizade sólida e rica em momentos musicais e pessoais. Eu tenho muita saudade dele, muita mesmo.

O POVO – Seu último trabalho de canções inéditas foi lançado em 2008. Depois, você disse que não deveria mais gravar disco, mas ficar lançando singles. Como você vê esse mercado de música hoje no Brasil? O que é melhor e o que não é com uma carreira sem os discos completos?
Frejat – O mercado de música no Brasil foi muito afetado pela crise econômica. Os shows diminuíram, o mercado digital não dá retorno financeiro digno e existe grande dificuldade para novos nomes se imporem no mercado. Mas a música não vai parar por causa disso. Porque quem faz música, faz porque precisa fazer. É a sua vida. A vantagem é lançar quando lhe dá vontade. A desvantagem é que tudo é mais fugaz.

O POVO – Tendo uma longa história no rock, você foi expandindo o som para outras influências, como quando gravou Angela Roro, Luiz Melodia e outros. Quando e como surgiu seu interesse pela MPB? Quem primeiro te chamou a atenção e por quê?
Frejat – Quando era muito pequeno eu gostava muito da Jovem Guarda e de Tim Maia. Depois vieram Caetano, Gil, Chico, Milton, Gal, Paulinho da Viola e, quando comecei a tocar violão, Cartola, Novos Baianos, Mutantes e outros grupos de rock dos anos 70. Quando comecei a ir aos shows, conheci muita coisa da música brasileira incluindo todos os citados anteriormente, além de Alceu Valença, Fagner, Zé Ramalho, Robertinho de Recife, entre outros.

O POVO – Há tempos, o rock perdeu espaço para sertanejo universitário e outros sons. Como você vê a cena roqueira hoje no Brasil?
Frejat – Acho que temos bons nomes espalhados por todo o Brasil, mas ela está muito alternativa por falta de interesse dos maiores veículos de mídia. Eles andam atrás do que agrada aos segmentos mais populares para atender aos seus anunciantes.

O POVO – Esse mês está sendo lançada mais uma coletânea com canções de Cazuza, incluindo uma inédita. Ainda existem parcerias suas com ele guardadas ou gravações inéditas, sejam versões, shows, outtakes, etc? Se sim, existe vontade de lançar esse material?
Frejat – Provavelmente sim e em algum momento isso pode ser apresentado. Mas nada nos planos por enquanto.

O POVO – Criou-se uma imagem de que Cazuza era o roqueiro doidão e você o freio, o mais comedido, até careta. Era isso mesmo? Quando esses papeis se invertiam? Como eram seus momentos de doidão?
Frejat – Nós não éramos opostos, apenas diferentes. Mas as afinidades eram muitas. Eu não vou ficar aqui contando histórias de quando eu fiquei doidão. Seria ridículo.

O POVO – Além do trabalho como artista, você tem se posicionado bastante sobre os direitos dos músicos. O que você destaca entre as conquistas mais recentes?
Frejat – Algumas delas foram conquistas importantes que o Estado depois desprestigiou, como a obrigatoriedade de ensino de música nas escolas e a PEC da música que dá isenção de impostos no processo produtivo de música feita por artistas brasileiros, o que ajudaria a baratear o preço dos CD. Mas aconteceu tardiamente e que ajuda hoje a venda de música digital, a lei 12.853 de 2013 que reformou o sistema de gestão coletiva de arrecadação de direitos autorais feita pelo ECAD e algumas vitórias pontuais contra a exploração. O fato que é que hoje muitos distribuidores de conteúdo (leia-se programas musicais, filmes, programas de TV, Google, YouTube) querem ignorar que os músicos, artistas e compositores têm de receber pelo uso do seu trabalho. Toda hora aparece um truquezinho novo que a gente tem de sair gritando: “Para tudo!!!”, senão eles transformam em modo padrão e a nós ficamos a ver navios.

O POVO – Hoje com 55 anos, com um nome estabelecido, uma história de muitos acertos, o que mudou no teu modo de trabalhar com música? Compor, tocar, fazer shows, dar entrevistas, isso tudo ficou mais fácil ou não?
Frejat – O tempo hoje parece menor para fazer tantas obrigações. Eu continuo tendo o mesmo prazer em tocar e compor que sempre tive. Mas, às vezes, parece que não há tempo suficiente para tudo que eu tenho que fazer além disso.

O POVO – Se o Frejat de hoje encontrasse o jovem Frejat de 19 anos, ainda montando uma banda de rock, que conselho você daria?
Frejat – Procure mostrar a cara da melhor maneira possível, o máximo que puder, aprenda a usar a internet a seu favor e seja caprichoso com o seu ofício. Não sei se dá resultado, mas é o que eu acho que pode ajudar.

Serviço:
Show solo com Frejat
Quando: hoje, 16, às 21 horas
Onde: Teatro RioMar Fortaleza (Rua Lauro Nogueira, 1500 – Papicu)
Ingressos: R$ 120 (plateia alta), R$ 160 (Plateia Baixa B) e R$ 200 (Plateia Baixa A). Preços de inteira
Telefone: 4003 1212

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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