No próximo dia 6 de maio, uma artista muito especial completa seus 60 anos de vida. Eu me refiro a Fátima Guedes, uma compositora que descreveu a alma brasileira de um jeito muito particular. Fátima Guedes é carioca e começou sua história aos 15 anos, quando ela venceu Festival de Música da Faculdade Hélio Afonso, com a música Passional. Depois, em 1978, ninguém menos que Elis Regina incluiu a canção Meninas da cidade no show Transversal do Tempo, e ainda convidou Fátima Guedes para participar de um especial de TV. Em 1979, Meninas da Cidade foi escolhida como uma das faixas do disco de estreia de Fátima Guedes, que segue ainda hoje, cantando, compondo e gravando suas canções.

Pelo menos dois elementos marcaram profundamente as canções da autora Flor de Ir Embora, Mais Uma Boca e Cheiro de Mato. O primeiro é sua voz, de um agudo forte e timbre meio infantil. O outro elemento são suas letras de forte componente dramático, falando sobre sentimentos comuns aos humanos, como o amor e a saudade. A solidão e o abandono encontram uma definição perfeita na voz dessa artista que nunca teve seu valor devidamente reconhecido.

Falando de amores urbanos, adolescentes que vendem o corpo, mulheres que vivem esperam o marido chegar do bar, amantes cheias calor para doar, Fátima Guedes se mostra como uma herdeira de Maysa, Dolores Duran ou mesmo um Chico Buarque. A propósito, seria reducionista e até injusto defini-la como um “Chico Buarque de saias”. Mas é verdade que em muito a obra desses dois se aproxima, principalmente no olhar cronista representado por canções que descrevem relações permeadas por questões sociais. Mas é verdade que Fátima vai muito além de um alter ego feminino de Chico ou qualquer outro. Ela aprendeu a fazer música com muita personalidade e sofisticação. E a sofisticação é outra senha para se apaixonar por essa artista.

Essa sofisticação de Fátima Guedes é provada também em seu trabalho como intérprete. Um exemplo é o disco Outros Tons, em que deu voz a uma porção menos popular da obra de Tom Jobim. Além desse disco, uma das interpretações mais reconhecidas de Fátima Guedes é da faixa A rota do Indivíduo, de Orlando Moraes e Djavan. Fica aqui a dica para quem quiser conhecer.

Mas, quem quiser conhecer Fátima Guedes por completo, vale procurar seu trabalho como compositora. Ela já teve música gravadas por muitos gigantes da MPB, como Maria Bethânia, Ney Matogrosso, Wanderléa, Leila Pinheiro e outros. E claro, seus discos são um banho de música brasileira da melhor qualidade. Ela mesma é uma intérprete de alto calibre, com coração na garganta, com letras mergulhadas no asfalto, na fuligem, no calor das grandes cidades. Sua densidade é tão cortante quanto uma navalha em Tanto que Aprendi de Amor, Fulano, Beltrano e Sicrano e Sete Véus. Mas pode ser transcendental, como em Eu – que belíssimo dueto com Simone – ou Sétima Arte. E chega a ser doce, como em Lápis de Cor, O Bloco das Mimosas Borboletas e A Bailarina.

Fica então registrada minha homenagem a Fátima Guedes, uma cronista do coração brasileiro, uma intérprete de tons muito particulares e uma artista única no brasil.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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