Rodrigo Santos, à esquerda, está nas fotos de divulgação, mas já deixou o Barão Vermelho

Quando se falar em “formação clássica” de uma banda de rock é preciso estar aberto a muitos questionamentos. Quem é vocalista clássico do ACDC, Bon Scott, que assumiu o microfone nos primeiros cinco anos da banda, ou Brian Johnson, que estreou no clássico Back In Black (1980) e segura a onda até hoje? E no Pink Floyd, seria o líder errático e saudoso Syd Barrett ou o metódico Roger Waters?

Nem todas as bandas são como os Paralamas do Sucesso, que conseguem manter o mesmo núcleo duro, os mesmos músicos de apoio, a mesma equipe e até o mesmo círculo de amizade por tantas décadas. Ou até como o Led Zeppelin que, diante da morte do baterista (um músico que, de um modo geral, é substituído como se não houvesse prejuízo para o todo), optou por encerrar as atividades. Ou como os Titãs que foram emagrecendo as fileiras e sobrevivem ainda hoje sabe-se lá por que.

O Barão Vermelho hoje vive – ou sobrevive a – essa encruzilhada que a substituição de músicos causa. As comparações são frequentes e quase sempre injustas, mas não foi desavisado que Rodrigo Suricato decidiu tomar para si o posto que foi de Roberto Frejat nos últimos 32 anos. Esse mesmo Frejat teve que segurar uma barra com a saída do hiper talentoso e carismático Cazuza imediatamente após o primeiro estouro comercial do então quinteto.

O fato é que, após alguns shows, o primeiro produto do novo Barão Vermelho chegou às plataformas digitas há alguns dias. Trata-se do EP Barão Pra Sempre. O disco virtual pega nove canções da banda carioca – entre clássicos ou nem tanto – regravadas pela nova formação. Esta nova formação conta com os fundadores Guto Goffi (bateria) e Maurício Barros (teclados), o veteraníssimo guitarrista Fernando Magalhães (na banda desde os anos 1990) e Rodrigo Suricato que, apesar de assumir voz, guitarra e um dos maiores legados do rock nacional, já disse, por ingenuidade, paixão ou idealismo, que a prioridade continua sendo sua banda de origem, o Suricato.

Esse apego ao Suricato também pode ser uma segurança, uma vez que é pouco provável que o Barão se reerga em popularidade como foi em 1986, quando a banda – ainda inflamada pelo show antológico no Rock In Rio – teve que se reinventar com a saída de Cazuza. Naquele momento, a pouca experiência e a popularidade ainda em formação deram tempo para que Frejat se descobrisse cantor e assumisse o posto de líder daquela formação que foi mudando até se encontrar de fato em 1994, com a entrada de Rodrigo Santos. Foi depois da chegada do baixista – e não por causa dele – que o Barão se aquietou e solidificou uma formação que durou por mais de 20 anos.

Rodrigo Santos, inclusive, protagonizou a última rasteira que o Barão Vermelho sofreu. Depois de participar de ensaios e das fotos de divulgação desta nova fase, ele também seguiu a trilha de Frejat e se despediu pra ir cuidar da própria carreira solo. Há uma possibilidade dessa saída ter acontecido por conta de um sentimento de desprezo, por não ter sido ele o escolhido para os vocais do grupo. Baixista seguro e cantor eficiente, com uma já longa discografia, ele seria esse herdeiro natural dos vocais. No entanto, como um jovem Kim Jong-un cuidando de um imenso potencial bélico, coube ao novato Rodrigo Suricato assumir a dianteira dos veteranos. E assim ficaram apenas quatro barões para cuidar do otimista EP Pra Sempre.

Sim, é bastante otimista por que, a menos que a banda que acumulou um sem número de sucessos esteja disposta a assumir a postura de auto-cover, esse EP é um dispensável aperitivo que antecede um já prometido disco de inéditas. Até que este chegue, as nove regravações revelam pouco sobre o que Suricato vai agregar ao Barão Vermelho. Os arranjos, se não são iguais, são cópias pálidas dos originais. Como cantor e guitarrista, ele nunca deixou dúvidas de que tem bastante talento. Mas, nas regravações ele apenas mostra que sabe cantar nos moldes exigidos pelas rádios jovens. É aquela rouquidão charmosa, aquela agressividade pra sair na foto.

O repertório de Pra Sempre ficou assim. A agressiva Tão Longe de tudo e a reflexiva Meus Bons amigos defendem a porção mais roqueira junto com Billy NegãoPro Dia Nascer Feliz, sempre atual e obrigatória. A ótima ode hedonista Puro Êxtase, tantas vezes menosprezada, surge num arranjo mais limpo, enxuto e direto – mesmo acontece em Pense e Dance. Das lentinhas, a seleção vem com Por Você, ainda mais melosa, e fica ao lado de Eu Queria ter uma Bomba. Pra completar, uma versão acústica de Brasil.

Antes de encerrar este texto, quero que fique claro que desejo muito boa sorte ao novo Barão Vermelho e espero, do fundo do coração, que ele seja pra sempre. Mas é preciso encarar os fatos. Depois de acumular tantas perdas e surgindo num cenário em que o rock perdeu sua força comercial, é difícil acreditar que uma das formações mais importantes da música brasileira vá renascer mais uma vez, com força, relevância e cheiro de novo. Mas, se isso acontecer, a música agradece.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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