Foto Ribamar Neto/ Divulgação

A trajetória de Gal Costa é pontuada pelas mais diversas viradas estéticas. Sua estreia foi com um disco de bossa nova, mas já virou o jogo e partiu para um lado rock and roll quando integrou o movimento tropicalista. Como uma Janis Joplin baiana, ela soltou a voz no fim dos anos 1960 para alertar que era “preciso estar atento e forte” e que não havia “tempo pra temer a morte”. Do rock, tornou-se diva da MPB, abraçou jovens e veteranos compositores, dividiu palco com Tom Jobim e Nando Reis, e nos últimos discos vem buscando uma renovação do repertório ao trazer pra perto nomes como Dani Black, Criolo e Silva.

Seu mais recente trabalho, A Pele Do Futuro, faz parte desse movimento de encontrar o novo. Com a colaboração de nomes como Pupillo e Marcus Preto, a cantora de 75 anos criou um álbum que costura épocas e mistura discoteca com Maria Bethânia e Marília Mendonça. E foi vestida nessa pele de futuro que Gal Costa subiu ao palco montado no Parque de Exposições do Crato para declarar aberta a 21ª Mostra Sesc Cariri.

Foto Davi Pinheiro/ Divulgação

Com um público volumoso, mas não capaz de lotar o local imenso (criado para grandes maratonas dos principais nomes do forró), Gal entrou no palco por volta das 21 horas bem amparada por uma banda de peso roqueiro e por muitos aplausos. De rosto sério, ela mal pisou no seu espaço, e já levantou o braço fazendo um “L” com as mãos para celebrar a recém-anunciada saída do ex-presidente Lula da prisão após mais de 500 dias.

“Hoje até troquei de roupa por que é um dia de festa”, adiantou Gal Costa, que trocou o figurino oficial da turnê (um vestido rosa), por uma bata amarela estampada. “Com a liberdade do Lula, vai fortalecer nossa oposição, nossa democracia”, acrescentou a intérprete que abriu os trabalhos com Dê Um Rolê, clássico dos Novos Baianos, e Vaca Profana, composição de Caetano Veloso feita em sua homenagem. Dali em diante, ela repetiu inúmeras vezes que aquele era um dia de festa. E foi.

Foto Davi Pinheiro

O show apresentado do Crato é o mesmo registrado em CD e DVD ao vivo e recentemente lançado pela Biscoito Fino – também disponível nas plataformas de streaming. Mas com algumas ausências. Privilegiando sucessos de carreira, o espetáculo excluiu boas canções como O que é que há, Lágrimas Negras e Minha Mãe. Muito provavelmente, essas canções foram tiradas do repertório por ser um show aberto, o que exige uma conexão mais forte com o público e um pouco mais agito.

E justiça seja feita. O set list que ficou agradou de imediato. Alguns momentos em especial. Que Pena fez muita gente sambar no miudinho de Jorge Ben. As Curvas da Estrada de Santos e Sua Estupidez sustentaram a realeza de Roberto Carlos, que havia se apresentado naquele mesmo espaço alguns anos antes. Chuva de Prata, que recentemente voltou a chamar a atenção depois de mais um tuíte equivocado do presidente Bolsonaro, foi cantada a plenos pulmões por todos. E bloco final de frevos e sambas que fizeram a alegria de muitos carnavais garantiu muitos sorrisos. Bloco do Prazer, Balancê e outras estavam nesse bis.

Foto: Davi Pinheiro/ Divulgação

Fora do registro oficial, mas incluída na turnê há algum tempo, Brasil caiu como uma luva na ocasião e mostra que as palavras de Cazuza seguem tão atuais quanto quando foram escritas. Gal Costa também manteve bem seu posto de “musa de qualquer estação” e grande intérprete. A voz continua vivaz, melhor ainda ao vivo. Os movimentos são bem mais contidos e calculados e, apesar de falar pouco, sabe dar ao público o que ele quer. Ao final, nada de autógrafos ou entrevista. Entrou imediatamente no carro e partiu para o aeroporto, para outro compromisso. Ficou uma impressão de que foi um tanto apressado e curto o show, mas é difícil dizer que não foi bom.

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Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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