Assim como Dalva de Oliveira para os 1950, Elis para os 1970, nos anos 1990 em diante, muita cantora queria ser como Marisa Monte. E os motivos são justos e muitos, já que a carioca soube alinhar – como pouquíssimas – os talentos para as artes e para os números. Sim, além da afinação impecável, ela é dona de uma veia pop radiofônica e refinada, e soube administrar muito bem seu patrimônio artístico.

Logo, é com muita segurança que, aos 52 anos, mais de 30 de música, Marisa anuncia uma parceria com a Sony Music para o lançamento do seu próximo disco, previsto ainda para este ano. Distribuidora digital da Sony, a The Orchard ficará responsável pelo catálogo do Phonomotor, selo da cantora que também lançou projetos dos Tribalistas e da Velha Guarda da Portela.

O último trabalho solo lançado por Marisa Monte foi o ao vivo Verdade, Uma Ilusão, de 2014. Três anos depois veio o reencontro com Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes, que rendeu o segundo disco de estúdio dos Tribalistas e um disco ao vivo (exclusivo on line) com o registro da super bem sucedida turnê do trio. Confira a seguir uma viagem pela discografia solo de Marisa Monte. Em cada novo trabalho, um detalhe, uma ideia, algo que o diferenciasse do anterior. Às vezes funciona, às vezes não, às vezes é só pra dizer que é novidade mesmo. Mas vamos lá…

Discografia comentada:
MM (1989)

Feroz, eclético e cru, assim é o disco de estreia de Marisa Monte. O trabalho, quase 100% ao vivo, reúne canções de Mutantes, Carmen Miranda e Tim Maia. Tem blues, jazz, samba enredo, rock… Nada autoral, por enquanto. Com muita inteligência, ela vai de Nouvelle Cuisine a Paulo Moura e já bota as cartas na mesa. “Cantora eclética” vira rótulo.

Mais (1991)

Produzido pelo internacional Arto Lindsay, o disco traz as primeiras composições de Marisa ao lado de parceiros como Arnaldo Antunes e Nando Reis, seu namorado à época. A intérprete refinada aparece em regravações De Noite na Cama (Caetano Veloso) e Rosa (Pixinguinha), entre outros. Ecletismo refinado, pop e radiofônico.

Cor de rosa e carvão (1994)

Já segura como compositora, Marisa aposta num disco brasileiro, sem deixar de lado o olhar no mercado internacional. Carlinhos Brown é a liga entre o Brasil e o mundo. Da tradição do Época de Ouro (em De mais Ninguém) ao rock soturno de Lou Reed (Pale blue eyes), Marisa segue abrindo fronteiras. Ousadia bem dosada e risco calculado com uma régua tão precisa que nem chega a ser risco.

Barulhinho Bom (1996)

Em menos de 10 anos de carreira, ela já lança o primeiro álbum duplo. A metade ao vivo traz parte da turnê do disco anterior. A regravação de A Menina Dança trouxe de volta os Novos Baianos aos palcos e à memória nacional. Na parte em estúdio, mais Novos Baianos (Chuva no brejo), um Lulu Santos mais clichê (Tempos modernos,  por que não?) e a sensacional Magamalabares (Brown).

Memórias, Crônicas e Declarações de Amor (2000)

O ecletismo aparece diferente neste quarto disco, que abre portas para surgirem os Tribalistas. Uma velha balada de Tim Maia (O que me importa) volta a tocar no rádio, mas quem manda é o amor desmedido de Amor I Love you. É brega? É, e daí? As duas últimas faixas do disco foram esquecidas, mas estão lá como obras irretocáveis: Gotas de Luar, uma joia do repertório de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito, interpretada com a delicadeza de adolescente que sofre a primeira decepção amorosa, e Sou sua sabiá, inédita de Caetano Veloso que faz brilhar os agudos da intérprete.

Infinito Particular/ Universo ao meu redor (2006)

A novidade aqui foi o lançamento de dois discos ao mesmo tempo. Infinito Particular é mais voltado para o lado pop e baladeiro. Universo ao meu redor é voltado para o samba. Novos parceiros chegam, como Seu Jorge, Rodrigo Campello, Marcelo Yuka e David Byrne. Alguns momentos são luminosos, mas já começa a aparecer um cheiro de repetição. O show gerado a partir destes discos circula Brasil e mundo com sucesso. Talvez o grande acerto deste trabalho seja o fota de, depois de discos que fizeram sucesso praticamente de cabo a rabo, aqui começam a aparecer os “Lados b”. Pelo tempo que durar, parceria com Adriana Calcanhotto, é a melhor delas.

O que você quer saber de verdade (2011)

Mais compositora e tribalista do que nunca, Marisa Monte pouco faz nesse trabalho. As mesmas referências, os mesmos parceiros, o mesmo bom gosto. Depois de elevar tanto o padrão, ela começa a competir com a própria história. E pouco desse disco entrou pra essa história. Apesar do sucesso de Ainda Bem, pouco desse repertório acrescenta ao que ela já fez. Agora, claro, é bom lembrar que um disco fraco de Marisa Monte é medido com o sarrafo lá em cima. Por isso, vale destacar presenças de Jorge Ben (Descalço no parque) e Dalva de Oliveira (Lencinho querido) entre as presenças astrais.

About the Author

Marcos Sampaio

Jornalista formado pela Universidade de Fortaleza e observador curioso da produção musical brasileira. Colecionador de discos e biografias. Admirador das grandes vozes brasileiras.

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