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Eu lembro como se fosse hoje, a primeira vez que entrei em uma biblioteca convicto de que ali era um mundo perfeito para crianças como eu, que desejavam coisas que não tinham nome ou talvez nem existissem e que andava no mundo dos sonhos e dos contos, de coisas irreais, inexistentes, mas concretas apenas no meu mundo.

Foi na minha primeira escola, onde passei quase toda a minha vida estudantil lá (mas isso é outra história). Estava fazendo a primeira série, quando a coordenação da escola resolveu fazer um “self service” de livros toda sexta-feira. Vou explicar melhor. Toda semana a minha turma ia para o salão geral, onde o professor de educação física nos ensinava exercícios e depois tinha algumas atividades, dinâmicas, eram as conhecidas recreações. Para a não felicidade geral da nação, e para a minha felicidade, a coordenação tinha mudado de ideia. No lugar da recreação, minha turma iria para a biblioteca, onde estariam os milhares  de livros para gente pegar, levar pra casa, ler e depois trazer de volta.

A biblioteca da minha escola era repleta de livros, acho que deveriam ter se não me engano, uns quinhentos livros no acervo, eram lindos de se ver. Havia livros de tudo, de todo os jeitos, de todas as cores, de todos os tamanhos, infantis, infanto-juvenis, livro de crônicas, de contos, de romance etc.

Foi num desses “self-service” de livros, onde eu encontrei um que se tornaria um dos melhores livros da minha vida. Escolhi, sem saber o porquê, A Hora da Estrela, de Clarice Lispector. Todos os outros pegaram livros infantis, com gravuras, bem coloridos, a cara da infância. Eu, pelo ao contrário deles, peguei esse romance de Clarice e levei-o para casa.

A escrita de Clarice foi como um choque para mim, pois bem logo no início, o leitor já percebe de que se trata de uma bomba literária. Desculpe por falar tanto de Clarice, mas é que é impossível não citá-la em relação a minha paixão pela literatura. Foi através dela que virei um leitor assíduo de crônicas, de contos, de romances, romances policiais, só não curto muito poemas (sei que é um erro), mas voltando para o cerne da questão…

A partir dessa iniciativa da escola, comecei a pegar livros e a ler mais. Tenho orgulho de dizer que comecei a ler de VERDADE (isso mesmo em caixa alta, porque até então, só lia as coisas da escola, as tarefas de casa e tal) aos dez anos de idade, onde as fantasias infantis fazem morada na mente, onde a imaginação move o corpo. A sexta-feira tinha se tornado um dia de felicidade e pura alegria, sinto altas saudades daquela época. Nostalgia. Momentos pueris. Sonhos surreais, vontades escabrosas. Puff! Acorda, pra realidade!

Saindo um pouco de Clarice… Comecei a ler também as histórias de Monteiro Lobato, gibis da Turma da Mônica, que minha mãe comprava. Abrindo um pequeno parêntese aqui (eu trocava os gibis que eu já tinha lido com os amiguinhos e primos, era um verdadeiro escambo).

Sou eternamente grato à iniciativa das minhas professoras, que tiveram essa brilhante ideia, de tirar a cansativa recreação e colocar essa “ostentação” de livros para os alunos. Acredito que se não fosse elas, eu teria demorado bem mais a entrar nesse universo. Mas de uma coisa tenho certeza, não deixaria essa vida, sem ter lido bons livros e ter se apaixonado por bons autores.

Enquanto uns gostavam de jogar de bola, brincar de esconde-esconde ou então fazer um caos na hora do intervalo, eu ficava lendo os livros, viajando na minha imaginação, que iam das reinações de Narizinho até a realidade drástica de Macabéa. Não gosto muito da frase clichê de que a pessoa pode viajar o mundo lendo um livro, mas convenhamos que a frase tem razão né? Viajei e viajo mundos inabitáveis, inimagináveis, abstratos.

Foi assim que conheci o mundo dos livros e não pretendo sair nunca, só quando a luz da vida apagar. Aí meu caro, não tem poema ou crônica, ou muito menos literatura que dê jeito. É hora de partir. Au revoir.

 

Texto e Imagem: Eduardo Sousa

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