Vivência de dançaterapia, modalidade que ajuda a aliviar a dor, as tensões e o humor

Movimentar o corpo ao som de uma música não é prerrogativa dos jovens, nem dos bailarinos profissionais. Cada corpo possui sua própria dança. E os gestos e ritmos cardíaco e biológico são um exemplo disso. Quando esses movimentos são orientados por meio de uma técnica denominada Dança Movimento Terapia (DMT), eles promovem a integração física, emocional, cognitiva e social, e ainda podem  auxiliar no tratamento e prevenção da ansiedade, fibromialgia, depressão, estresse, distúrbios alimentares, mal de Parkinson e até câncer. Entre os idosos, ela também aprimora as funções físicas e cognitivas.

Todos esses benefícios têm sido observados por pesquisadores na última década, mas segundo a American Dance Therapy Association (ADTA), há mais de 50 anos a prática é pioneira no entendimento de como o corpo e a mente interagem na saúde e na doença. As sessões de DMT não são uma aula de dança onde se repetem coreografias. Trata-se de um prática guiada por terapeutas devidamente habilitados a estimular movimentos espontâneos. As sessões podem ser individuais ou em grupo, e a técnica utiliza música e admite o uso de brincadeiras e materiais que estimulem a criatividade.

Judith Esperanza, dançaterapeuta e naturopata, diretora do Centro de Formação Internacional em Dançaterapia (Cefid-DMT) , conta que esse recurso foi utilizado pela primeira vez em 1940, nos Estados Unidos. “O objetivo das bailarinas Marian Chace e Trudi Schoop era auxiliar na reabilitação de pacientes desprovidos das capacidades de comunicação e expressão”, diz.

Na América do Sul, a argentina Maria Fux não só adotou a técnica como incorporou novos conceitos em benefício de pessoas com todo tipo de deficiência. “O método é integrativo e não exclui ninguém”, fala Esperanza. “Para a DMT o fato de uma pessoa não poder levantar de uma cadeira,  não significa que não possa dançar. Ela movimentará suas partes saudáveis, e é a partir desse potencial que a DMT trabalha. O dançar contempla o todo: braços, dedos, e até o olhar que se move”, explica.

Uma terapia para todos

Na Itália, a bailarina Elena Cerruto, diretora da Associação Sarabanda de Milão e autora do livro No ritmo do coração, dançaterapia entre oriente e ocidente (Phorte Editora), passou a se interessar pela DMT, e nela introduziu elementos da medicina oriental. “A técnica é ao mesmo tempo um tratamento e uma terapia”.  “Na DMT prevalece a linguagem não verbal, mas o meu método também estimula a troca verbal. Por isso, introduzi no curso as psicologias ocidental, chinesa e a zen budista”, esclarece a especialista.

No Brasil, não é requisito ser bailarino para trabalhar com a DMT. Entretanto, o interessado deve frequentar um curso de três anos, que tem em seu currículo não só dança, mas também psicologia, musicoterapia, cinesiologia  e outras disciplinas. As especialistas esclarecem que, para os praticantes, igualmente não é exigida  habilidade física específica, pois a DMT é indicada não só para pessoas com necessidades especiais, mas também para todo adulto, jovem, criança ou idoso, sem limite de idade.

“O proveito psicológico é enorme, pois permite experimentar, expressar e valorizar as próprias potencialidades, muitas vezes superando situações internas que impediam uma vida plena”, afirma Cerruto. “No aspecto físico, o corpo atinge maior elasticidade e capacidade de movimento. Traumas, dores nas costas, contrações e cefaleias podem desaparecer por meio da nova consciência do próprio corpo”, completa.

Esperanza observa que não há contraindicações para a DMT, mas os praticantes devem estar atentos aos seus próprios limites, especialmente no início. “Com o passar do tempo, a escuta pessoal se aprimora, e já não há riscos de cometer excessos”, diz.

Corpo que enxerga

Para Elisabetta Vianello, 60 anos, a DMT trouxe melhora na qualidade de vida. Como há mais de quarenta anos perdeu a visão, a técnica trouxe alívio para as tensões físicas e psíquicas. “Eu me movo melhor no ambiente que me cerca, com simplicidade e certa desenvoltura, superando os limites e enxergando com o corpo”, relata. “Durante as sessões, sinto minha respiração viva e palpitante, especialmente nas zonas que estão sempre bloqueadas: o diafragma e o abdômen. O coração também bate de forma harmoniosa e a circulação melhora. Tudo isso me deixa mais serena”, completa.

Para o cardiologista e cirurgião Giovanni Ansaldi, membro da Sociedade Italiana de Medicina Psicossomática, o valor da DMT é que ela “estimula o movimento visando o bem-estar psicofísico de uma comunidade onde o sedentarismo é a regra”.

Cláudio Santili, professor do departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, e presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia (SBOT) concorda: “O mais importante da dança é a capacidade de colocar as pessoas em movimento, favorecendo o aparelho locomotor, a musculatura e os ossos”.

Porém, diferentemente de outras atividades como a ginástica ou alguma modalidade esportiva, acrescenta Ansaldi, “A DMT promove a consciência do corpo e, por meio do movimento, um contato mais profundo consigo mesmo”. “Os benefícios físicos para o aparelho cardiorrespiratório e muscular juntam-se aos psicológicos, não menos importantes”, diz.  Os especialistas falam que o tempo de espera para usufruir dessa melhora dependerá de cada pessoa, mas em média, após dois meses, já se notará alguma evolução, que tende a crescer ao longo da prática.

Função analgésica

Observando a DMT de perto, o médico italiano verificou que ela também pode ser útil para aqueles pessoas que se sentem traídas pelo próprio físico, por achar que ele não atende aos modelos da moda. “Com a DMT, o corpo passa a ser usado ao invés de rejeitado. Além disso, ele é vivenciado numa dimensão comunicativa e criativa”. E acrescenta: “do ponto de vista estritamente orgânico, a DMT figura entre as terapias de maior função analgésica. Como os movimentos não são obrigatórios, nem predeterminados, a pessoa assume de forma solta e consciente, aqueles que melhor se prestam à liberação das tensões”.

Entre os idosos que perderam a mobilidade, relata Esperanza, a experiência pode ser ainda mais extraordinária. Além da resposta física, para eles há a possibilidade de resgatar a autoconfiança, criar laços de amizade e sair da solidão, além de se comunicar e tomar consciência de que ainda estão vivos. “O papel do terapeuta é ter clareza quanto às intervenções que faz, aproveitando e gerenciando cada instante durante as sessões. Afinal, nesse momento, é ele a ponte que leva o idoso ao encontro de suas próprias potencialidades”, conclui.

Fonte: UOL

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Jorge Brandão

Fisioterapeuta, Osteopata, RPGista. Diretor da clinica Fisio Vida.

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