“Três travestis traçam perfis na praça. Lápis e giz, boca e nariz, fumaça”.

Lembrando a música de Caetano, três atores cantam histórias sobre o dito universo trans – travestis, transexuais e transformistas. Com direção do ator e dramaturgo Silvero Pereira, o espetáculo cênico-musical Três Travestis traz histórias de identidade, solidão, afeto, violência e religião.

Foto Fernanda Moreira 2

Imagem: Fernanda Moreira

No novo projeto do Coletivo As Travestidas, Silvero dá vida ao seu alter ego Gisele Almodovar, e canta ao lado de Rodrigo Ferrera, a Mulher Barbada, e George Hudson, no coletivo desde setembro do ano passado, como Betha Houston.

“Ainda existem discussões necessárias sobre esse universo”, diz Silvero, lembrando que o Coletivo já realizou oito trabalhos na temática trans. “A sociedade ainda não perdeu o estigma da marginal e da caricatura para essas pessoas e nosso objetivo é, através da arte, mudar esses pré conceitos”

Em entrevista ao Repórter Entre Linhas, ele fala sobre teatro, representatividade, e arte como objeto de transformação. “A arte não precisa de nada. Ela pode ser o que quiser, desde que tenha propósito, convicção, desejo e prazer em fazer”, justifica. “Ela pode ser de entretenimento, comercial , como pode ser de questão social. O importante é fazer, mas fazer bem”.

Tratar da sexualidade no palco se tornou mais recorrente depois de Uma Flor de Dama. Foi um divisor de águas?

Silvero: Sim. Acho que As Travestidas construiu uma linguagem no teatro pra falar sobre esse assunto. Isso porque nós aprofundamos e construímos estética atrelada a conhecimento e causa. Logo, hoje, 12 anos depois de As Travestidas, Fortaleza tem mais interesse nesse tipo de discussão e arte, além de respeitar esses trabalhos.

Como você avalia o teatro que vem sendo produzido no Ceará?

Silvero: Acho que Fortaleza tem um dos teatros mais diversos esteticamente e pulsante no nosso país. Construímos um teatro em meio a adversidade das políticas públicas e da falta de espaço, mas ainda assim um teatro vibrante e bonito, por somos guerreiros e não passivos ao caos atual dos nossos gestores.

Você saiu de Mombaça aos 13 anos. Você chegou a fazer teatro lá?

Silvero: Só fiz teatro quando cheguei em Fortaleza. Só agora Mombaça começa a pensar em arte. Minha infância foi marcada por uma criança órfã de teatro. Durante muito tempo Mombaça foi um buraco negro na história do teatro cearense. Espero que esse quadro mude.

O Interior ainda hoje tem muitas histórias de opressão sexual. Você viveu muito disso?

Silvero: Acredito que a Capital tem muito mais opressão que o Interior. A questão é que na capital as coisas são mais mascaradas. Claro que no interior ainda existe violência e intolerância, mas isso vem mudando.

Como você percebe seu papel na representatividade LGBTT além da arte?

Silvero: A arte é ofício e um canal para questionar e provocar a sociedade. Acredito nesse lugar de transformação através da arte por ser um lugar que toca o íntimo das pessoas e as aproxima.

BR Trans ganhou força nas premiações nacionais e agora vai para fora do Brasil. Qual a importância de representar tanto o público LGBTT quanto seu Estado?

Silvero: O Brasil precisa abrir sua cabeça, é preciso mostrar o nosso país como ele é de verdade para enxergarmos a violência existente e lutar contra esse quadro. Temos um país lindo em pessoas e natureza, mas nossa sociedade, em sua maioria , ainda é violenta e cruel. É preciso mostrar essa face diante do espelho para se reconhecer e mudar.

Serviço
Três Travestis
Dias 3 e 4 de maio, às 20 horas
Theatro José de Alencar (rua Liberato Barroso, 525 – Centro)
R$ 20 / 10

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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