a-vida-que-queremos

Assistindo ao filme “Os Desnorteados”, recebi uma dica valiosa para o próximo ano. O pai do protagonista recomenda: “Filho, escolha a vida que você quer e não a vida que você pode ter”. O conselho vem em momento oportuno; dezembro, revisão das metas e a pertinente questão – “Que vida vamos levar em 2017? A que queremos ou a que podemos?”

Vozes, velhas conhecidas despertam das profundezas para nos chacoalhar – “Querer não é poder!”. “A vida está muito difícil, se apegue ao que já tem”. “Você não pode ter tudo”. “Melhor um pássaro na mão do que dois voando”. “Deixe de sonhar. Os tempos não estão para brincadeira”. De certo, você tem suas crenças, fulano tem as dele, e assim arrastamos vários fantasmas guiando nossas ações, principalmente nos períodos de mudança. Mas o que diz nossa própria voz?

Não se trata aqui de apelar para a vida inconsequente, cheia de dívidas que prejudica a si e aos outros. Isso é outra história. Pode ser que, assim como “Os Desnorteados”, acreditemos naquela vida dos comerciais de TV, idealizando que o melhor para nós vem apenas com sorrisos e perfeição. Mas os dias têm seus atropelos e podemos rir com eles.

O filme é comédia besteirol, boa para domingo à noite. Mas com humor caricato, ainda consegue refletir questões atuais: desemprego, crise, a grama mais verde do vizinho e sobre vivermos a vida que os outros esperam de nós. Spoiler à vista.

No roteiro, o ator principal encena um jovem espanhol de currículo recheado, mas recém demitido. Cansado da crise em seu país, vê em um comercial de TV a solução de seus problemas – Berlim está cheia de vagas de trabalho. Então, juntamente com outro amigo desempregado, o protagonista decide tentar a vida próspera nas terras alemãs. Lá chegando, além do choque cultural, passa por apuros financeiros.

A trama se desenrola com o jovem espanhol mentindo para seus pais, que acreditam no excelente cargo ocupado pelo filho, gerente em uma grande empresa alemã. Nada novo sob o céu. O personagem vai escolhendo viver uma farsa para salvar os pais da falência, para agradar o próprio ego e também para prestar contas ao que se espera dele – alguém bem sucedido após anos de estudo.

Fácil apontar o dedo para o espanhol, mas o que dizer de nós? Estamos vivendo a vida que queremos ou a que esperam de nós? Assumir a própria verdade requer coragem, exige romper conveniências, confiar no fluxo, que não avisa sobre as tempestades, bonança ou desafios. A vida que nos cabe, não a do cinema, não segue um roteiro definido, não tem ensaios e não permite troca de protagonista. É valendo!

No fazer diário, será que tomamos a vida pelas mãos? Deixamos ir os projetos alheios e nos apropriamos da nossa rota? Recordo uma oração do terapeuta americano, Bob Mandel, que sugere “Deixar ir, Deixar Deus agir”. Bob nos lembra de que algumas corridas não são as nossas, por isso não é preciso corrê-las. Alguns projetos são executados melhor desacelerando e algumas respostas vêm quando esperamos ao invés de forçar uma solução.

Assim como Bob, “eu rezo para saber o que é meu, quando empurrar, quando permitir”. Como o desnorteado do filme, eu espero ter a coragem de buscar a cada dia a vida que eu quero e não me contentar com a vida que eu posso ter. A todos, que tenhamos a ousadia de ir além da vida que escreveram para nós.

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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