Clipe teve mais de 1 milhão de visualizações em menos de dois dias (Foto: Divulgação)

Bumbum de Ouro” é a música que Gloria Groove queria ouvir. Como o embalo de um bumbo, de um trio elétrico, a música abre uma fase mais pop para a rapper de 23 anos. Há um ano ela fazia seu debut com o politizado álbum O Proceder e, de lá pra cá, rodou o País.

Com direção da dupla Os Primos (João Monteiro e Fernando Moraes), clipe de “Bumbum” foi lançado na noite da última segunda-feira, 5. A fotografia, também assinada pela dupla, os figurinos e a escolha do elenco predominantemente negro ostenta brasilidade.

“Quando concebi essa música, era meu sonho ver todo mundo cantando. E eu queria que o clipe fosse mais frio, com o refinamento do preto e do dourado”, conta em entrevista ao Blog Repórter Entre Linhas.

Assim como nos clipes de “Império” e “Dona“, Gloria também aparece como Daniel Garcia, o artista por trás da drag queen, em “Bumbum de Ouro” “Ao invés de me colocar como duas pessoas, é mais para ser um lembrete amigável de que existe alguém por trás daquela produção toda. E pouco importa como estou. O que importa é minha raiz, como estou por dentro. Minha arte“.

O bumbum, aliás, tem sido tema recorrente no pop e no funk nacional, vertente da qual bebe o novo sucesso de Groove. “Joga Bunda”, de Aretuza Lovi com Gloria e Pabllo Vittar, foi lançada em janeiro último. No mesmo mês, Lia Clark lançou “Tipo de Garota”. No refrão, a drag avisa: “Se prepara e movimenta, eu vou mexer o meu bumbum”.

“Para mim é surpreendente que a bunda seja uma questão. Nós somos a geração que cresceu vendo bunda na TV, na banheira do Gugu. Não deveria ser uma questão. É inevitável que a gente fale dela hoje”, pondera a artista que fez show em Fortaleza em janeiro deste ano.

Pop para celebrar

Em novembro do ano passado, a artista anunciava a fase que estava por vir com o clipe de “Muleke Brasileiro“, uma das primeiras composições do disco e a mais pop das oito faixas. 

“É uma musica de transição. O Proceder (álbum) é muito carregado em rap, hip hop. Uma perspectiva de crítica política e social forte que eu acho que foi muito importante pra dar minha cara, para mostrar o que passa na minha cabeça. É meu proceder, literalmente”, defende.

“Agora é o pop pra celebrar minha vida. O simples fato de eu estar viva fazendo o que eu faço já é uma vitória porque eu continuo morando no país que mais mata trans no mundo“. Gloria tem razão em sua fala. Em 2017, quase 180 pessoas foram mortas por serem transexuais, segundo a ONG Transgender Europe. Entre 2008 e 2016, 868 pessoas trans foram assassinadas no Brasil,  O número, o triplo do México e quase seis vezes maior que nos Estados Unidos, deixa o País no topo do ranking.

Para além do debate, Groove é estratégica: “Nada melhor que o Carnaval para começar a celebrar. E é claro que essa escolha foi proposital. No final do ano passado a gente tava toda sedenta pra lançar”, ri no telefone.

O caminho para a Gloria

Daniel tem sua trajetória antes da Glória. “Já são 15 anos na música e somente três como drag. Sempre tive a música por perto por causa da minha família. Já trabalhava desde os sete. Sempre soube o que ia fazer”, conta.

A mãe, Gina Garcia, é backing vocal do Raça Negra e canta na novela “Carinha de Anjo“. Os avós maternos eram artistas de circo. Daniel também passou pela TV e, dos sete aos nove anos de idade, cantou no grupo Balão Mágico. Aos 18, esteve no elenco do musical Hair em uma montagem independente.

“Como eu era um jovem homossexual me descobrindo e me entendendo como pessoa, eu tinha dificuldade de me ver como uma estrela. Eu queria me sentir bem, e quando me descobri drag me libertei. Comecei a me enxergar”, destaca. “Descobri que poderia colocar essas referências femininas no meu trabalho. (Gloria) é mais que uma personagem. Representa, para mim, 100% do que sou artisticamente”.

“Demorou para as drags serem representadas de forma como se sintam poderosas. O LGBT em posição de poder, com talento validado. Ser drag ocupando esse espaço é muito revolucionário“, enfatiza. “Era só questão de tempo para a coroa ser nossa”.

Gloria Groove continua produzindo seu próximo álbum que, garante, vai sair ainda no primeiro semestre de 2018. “E a turnê continua. Ainda mais agora com a divulgação pesada do single novo”.

“Bumbum de Ouro” é o primeiro single do novo álbum de Gloria Groove (Foto: Divulgação)

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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