(Foto: Patrícia Araújo / Red Bull Content Pool)

A banda brasiliense Scalene está em turnê para divulgar o álbum magnetite (2017). O lançamento foi em em um dos principais palcos de festivais do planeta, o Palco Mundo do Rock in Rio. Neste sábado, 10, Scalene chega em Fortaleza para o Festival Garage Sounds.

Quarto álbum do grupo, magnetite reflete influências que vão da MPB à música eletrônica, passando pelo R&B. Com riffs de guitarra e linhas de baixo inspiradas no stoner rock e post-hardcore, a partir das quais o grupo se lança. O vocalista Gustavo Bertoni compôs as 12 faixas do disco. Algumas, com o guitarrista Tomás Bertoni e apoio dos colegas Lucas Furtado (baixo) e Philipe “Mkk” Nogueira (bateria).

O disco foi gravado no primeiro semestre de 2017, no Red Bull Studios São Paulo. A produção é de Diego Marx, que já trabalhou com Móveis Coloniais de Acaju, Dillo e Hover, pelo selo slap, da Som Livre.

magnetite se posiciona em faixas como “distopia”, que trata da manipulação religiosa. “Sempre nos incluímos na crítica, botamos o dedo em algumas feridas, ao mesmo tempo que elas são nossas. Falamos em empatia, perspectivas diferentes sobre a vida, se renovar, ter calma e aprender a refletir, não viver no automático”, diz Tomás Bertoni.

Supercombo comenta o álbum ‘Rogério’

Em 2016, o grupo conquistou o Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa pelo álbum Éter. No mesmo ano, gravaram o primeiro DVD, Ao Vivo em Brasília – além de ter sido finalista do SuperStar, da TV Globo.

Capa do álbum ‘magnetite’

Faixa a faixa: magnetite (2017) – Scalene
Por Gustavo Bertoni

extremos pueris: “Apelidada de ‘Riff em 10’, a música nasceu do riff inicial – após uma conversa com o Rafa (do Far From Alaska) sobre repetir frases de um Riff em compassos tortos para que o tempo forte dele fique em momentos diferentes. Assim que o riff surgiu, testei num teclado velho lá de casa e vi que ia funcionar bem com uma camada uníssona de synth por cima das guitarras.

O verso e pré-refrão são uma evolução do que apresentamos no disco Éter e a parte C foi uma jam que basicamente organizamos pra virar uma parte da música. A letra fala sobre a visão turva que extremismo pode causar e como é perigoso focar nisso. É mais que natural nosso momento político gerar ira, o problema é deixar ela nos separar e controlar, isso nos torna mais fracos e manipuláveis”.

ponta do anzol: “Essa música nasceu da junção de influências de disco-punk e stoner com uma curiosidade por cromatismos na música brasileira. O refrão é um tema que tínhamos no piano e recontextualizamos numa pegada Scalene. Essa música tem momentos mais apoiados em sintetizadores, o que é novo pra nós, como a parte C que gostamos muito. De Inky a Justice, esse mundo abriu nossas cabeças. A letra fala sobre seguir firme na sua caminhada e atuar para um bem maior, seja ele qual for, sem a necessidade de atribuir nome ou figura a esse “bem'”.

cartão postal: “Das raras ocasiões onde a letra vem primeiro. A escrevi durante um voo, voltando de um fim de semana de shows. Olhando abaixo pro solo que deixávamos, os rios faziam um desenho de árvore e aquilo prendeu minha atenção. Comecei a atribuir cada faceta da minha personalidade a um galho. Percebi o quanto fui obrigado a me analisar e mudar nos últimos dois anos da minha vida. Me percebi longe de mim, ao mesmo tempo cada vez mais perto do que precisava pra entender melhor quem sou.

Ela fala do furacão interno e positivamente desafiador que permeou nossa carreira desde o início de 2015. Quando nosso posicionamento mudou, senti que era um dever abraçar a responsabilidade sem mudar minha essência. Ela também é um posicionamento: se for pra jogarmos o jogo, jogaremos. E de dentro o mudaremos. Musicalmente, o clima dela remete às harmonias simples e agradáveis do último disco do Mumford and Sons. Ao adicionarmos um pouco de brasilidade (e Caetanisses) no groove e na melodia, a composição fluiu. A cama de baixo zen na intro é um dos nossos timbres preferidos do disco”.

esc (caverna digital): “Acho que é a mais divertida de tocar do disco! Sempre achei intrigante os pontos de intersecção do rock e da música nordestina, o modo grego mixolídio incluso. Eu estava escutando bastante Temples na época (que inclusive, às vezes, me remetia muito a Boogarins) e aquele CD do Caetano com o Gil… saiu isso aí. Sempre conversamos entre nós sobre a dissonância cognitiva na internet. A descontextualização da informação, a impulsividade, as ilusões e quão diversas são as percepções das pessoas. Alinhar tudo isso somado à alienação e frieza das mídias sociais é um desafio que nossa geração tem que levar muito a sério”.

distopia: “Talvez nossa letra mais assertiva até hoje. O Tomás sempre se irritou muito com esse assunto e finalmente achamos a forma e música pra dar voz a isso. Uma das músicas mais rockeiras e direto ao ponto do CD, com um pouco do grunge, que curtimos, e o movimento groovado que buscamos bastante no disco todo. É muito alarmante pensar na gravidade do abuso que alguns pastores evangélicos cometem e como não falamos e punimos isso”.

frenesi: “Nasceu também do riff inicial. Até esse ponto já tínhamos algumas músicas e eu comecei a sentir falta de uma música com o pulso frenético. Não sei direito quais foram as influências pra ela, mas tem um quê de prog metal, então Mastodon e Cloudkicker vêm à mente. Liricamente, a música fala sobre lidar com a ansiedade e o ritmo frenético da vida. Domar o caos. Isso misturado com entorpecentes pode causar um estado de…. frenesi?”

magnetite: “Quando você acha uns acordes meio sem querer que te colocam num estado de espírito até então inédito. Essa letra talvez não faça sentido pra ninguém… hahaha… nem eu sei exatamente o que quis dizer. Acho que ela é sobre as entrelinhas e leituras quase que telepáticas que fazemos, querendo ou não.

Acho que quando se convive muito com pessoas de forma aberta e intensamente sensorial, existe um diálogo inconsciente constante. Isso me intriga o mesmo tanto que me deixa paranoico. Porém, existe um conforto e uma enorme beleza nisso, em entender e tornar esses diálogos positivos. Fui descobrir depois que a pedra magnetita, a “pedra-ímã”, tem em sua composição uma substância encontrada em diversos lugares da natureza, inclusive no nosso cérebro. Musicalmente, Vitor Ramil, Radiohead e Beatles foram algumas das influências”.

fragmento: “Mais riiiiiiffs! Gostamos de riffs. O dessa música volta às nossas raízes post-hardcore e manda um salve pra baita banda brasileira Odradek. A melodia do verso tem um desenho que me remete também à música nordestina. A Maria Gadu tem uns temas lindos nessa escala e talvez essa vontade tenha vindo de escutá-la. O pré-refrão poderia estar no nosso EP de 2012 e o refrão cai num groove quadrado dançante com um tapping irado do Lucão. A letra, de certa forma, complementa o que falamos em esc (caverna digital), fala claramente sobre sentimentos e processos que todos nós nessa época passamos. Termina com a reflexão de que temos que assumir a responsabilidade de sermos melhores, agir mais e falar menos”.

heteronomia: “Brincamos que ela é a evolução de Marco Zero (do Real/Surreal, 2013). Mais focada em recolorir nossas influências base do que experimentar. Várias camadas de guitarra e versos apoiados no balanço da bateria com o trêmulo do baixo conduzindo a marcação do piano. A letra questiona e reflete dilemas que a fé pode trazer. As causas e consequências perigosas na vida de cada um e em sociedade. Sobre a busca de viver em liberdade e amor, pensando de forma autônoma”.

trilha: “Uma coisa que admiramos muito no Rap é a assertividade e coragem dos letristas. Coisa que falta no rock hoje em dia. Essa música é basicamente um mantra pra trilha de uma consciência limpa. Podem falar o que quiser, construímos nossa carreira com nossas mãos, suor e sem faltar com respeito a quem merece. Trouxemos nossas influências do R&B e do stoner”.

velho lobo: “Também inspirada por bandas modernas de R&B que curtimos, a identidade da música foi construída em cima do groove da cozinha e harmonias tortas. Nos permitimos deixar um pouco o peso das guitarras de lado e explorar novos elementos. A letra trata do processo de se despir das ilusões e privilégios que o ego se acostuma a abraçar”.

phi: “Fizemos essa música no fim de 2015, o refrão dela acabou virando a introdução do DVD. Talvez a mais agradável e post-rock do disco. A letra usa a razão Áurea como metáfora pra falar de união e direitos iguais. A única canção que foi unânime onde estaria no álbum desde cedo no processo de composição, um forte encerramento pra tudo que o álbum aborda e propõe”.

About the Author

Rubens Rodrigues

Jornalista. Na equipe do O POVO desde 2015. Em 2018, criou o podcast Fora da Ordem e integrou as equipes que venceram o Prêmio Gandhi de Comunicação e o Prêmio CDL de Comunicação. Em 2019, assinou a organização da antologia "Relicário". Estudou Comunicação em Música na OnStage Lab (SP) e é pós-graduando em Jornalismo Digital pela Estácio de Sá.

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