Bárbara Costa Ribeiro,  autora do zine Arara Azul, próximo lançamento do coletivo A Literação

Por Bárbara Costa Ribeiro

Em 2015, um grupo de alunos do curso de Letras da Universidade Federal do Ceará (UFC), alguns amigos entre si, outros apenas conhecidos, partindo de uma percepção comum, sentiram no cérebro um estalo e se perguntaram: “Por que é que a gente não lança um fanzine?”.

A percepção comum era justamente o fato de que a maioria dos estudantes de Letras não apenas consumia literatura, mas também produzia a sua literatura, e não encontrava qualquer espaço para expô-la, ou um meio de veiculá-la. A ideia rapidamente reuniu seus adeptos. Os amigos foram chamando outros amigos, conhecidos encontraram conhecidos, todos unidos sob um mesmo ideal, um desejo muito forte: ver a gente que escrevia mostrando a sua cara. Ou melhor, a sua letra.

Esse grupo de pessoas juntou seus talentos – uns revisavam, outros tinham muita habilidade manual, outros possuíam o faro nato para a curadoria, outros pintavam, outros recortavam, outros tinham ideias audaciosas, tantos e tantos que tais, dentre tantos outros talentos de criação e de gestão – e assim se organizou este coletivo que passou a ser conhecido como “A Literação”.

A princípio, o nome causou algum estranhamento. O termo brincava, de fato, com a aliteração dos textos poéticos, ou seja, a dimensão sonora da poesia, da repetição insistente de um som – e não eram mesmo muito teimosos, cavando seu espaço à força? –, mas era também um gesto de dizer, via neologismo: olha a gente aqui, literando, fazendo letra, fazendo literação, ou seja, fazendo literatura, uma litetatura possível, a nossa.

A força motriz da empreitada vinha em muito no sentido de questionar: só importa o que é canônico? E o marginal? E o que não tem cânon, régua alguma? E, junto a esses ideais tão espoletados, era também uma grande farra. Era, sobretudo, sobre se divertir: a diversão na manufatura da poesia.

Mariana, Zeno, Brenda e Lara, integrantes do coletivo, montando o zine Arara Azul. No detalhe, Glória, a gata de estimação do curso de Letras

O projeto, contudo, não se faria sozinho ou com aquele grupo de colegas apenas, os que se ajuntara sob um mesmo guarda-chuva para organizar a farra. Era uma ideia plural, precisava ser construída por todos, todos os que se interessassem. O coletivo então forjou um edital, e assim lançou a ideia da publicação independente no mundo. As primeiras linhas da chamada original eram algo assim: “A curadoria do A Literação, fanzine do curso de Letras, recebe textos poéticos das mais variadas linguagens para compor a sua primeiríssima edição”. Havia muita vontade naquilo.

Todavia, ainda assim, só abrir a chamada não seria suficiente para agregar os corpos, as mãos que escreviam e os olhos que leriam. Foi preciso também muita divulgação, divulgação que se deu no boca-a-boca, e pela internet, pelo bosque das Letras, por toda a parte na UFC.

Então conseguiram. O fanzine da Letras, através de seus saraus e outras intervenções poéticas, se tornou um dos assuntos mais comentados dentro do curso, e mesmo fora. Nas primeiras edições, recebeu textos somente dos alunos de Letras. Depois, abriu-se ao mundo todo da UFC.

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Havia um trabalho artístico, havia uma preocupação estética, mas havia também liberdade. E a coisa que se gestava independente cresceu. A cada edição, foram muitas as campanhas de divulgação via Facebook, via lambe-lambe, via stencil. O próprio corpo discente acreditou mais e mais no projeto. Os professores também abraçaram a causa. O coletivo então conseguiu bolsa junto à Secult-UFC, e hoje está vinculado oficialmente a paragens oficiais, sem perder, contudo, seu rosto marginal e seu caráter coletivo.

Desde 2015, os nomes que compuseram o A Literação, enquanto organizadores, foram rotativos, precedendo-se, abrindo espaço para novos nomes, deixando a ciranda girar. Lúcio Flávio Gondim foi um dos alunos que lutou com toda a gana pela criação e manutenção desse projeto incrível.

Neste ano de 2017, o A Literação surgiu com uma ideia nova. Era a seguinte: alguns nomes, na seleção da curadoria de cada edição, repetia-se. E por que não começar a lançar fanzines especialmente dedicados a esses nomes que, edição após edição, submetiam seus textos e, mesmo no secreto da seleção, com pessoas diferentes na curadoria, eram sempre pescados? Nomes que o próprio A Literação ajudou a conceber. Deu coragem, rosto, voz a pessoas que, de outra forma, jamais se exporiam.

Neste ano, então, o A Literação inaugura uma nova fase, publicando a cada edição um fanzine especialmente dedicado a um único autor. Poetas, ilustradores, fotógrafos, concretistas, marginais, prosadores que tenham nascido ali, no meio de nós, no bosque das letras.

 

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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