Por Lílian Martins*
Ao pé do ouvido é onde escutamos histórias e canções de nos fazer arrepiar a nuca e, algumas vezes, estremecer a alma! Pode ser uma palavra a palo seco, um verso sujo, um sussurro de amor perdido, tudo que nos evoca a lembrança terna de um som equalizado pela voz que nos cala junto ao coração.
Todas essas sonoridades ressoam a minha recordação do Ceará, terra cantada em verso e prosa e palco de célebres escritores e profícuo cancioneiro. Na regência dessas reminiscências, o pai do nacionalismo na música erudita brasileira, nosso ilustre Alberto Nepomuceno (1864-1920). Nascido em Fortaleza, Nepomuceno residiu na Rua Amélia, atual Senador Pompeu, no Centro, até os oitos anos de idade onde aprendeu suas primeiras lições de solfejo, piano e órgão com o próprio pai.
Vanguardista, Nepomuceno defendia o uso da língua portuguesa na música clássica, é o primeiro regente a incorporar um instrumento folclórico como o reco-reco numa orquestra sinfônica, em 1897, e foi quem trouxe Catulo da Paixão Cearense para realizar o primeiro concerto de violão no Instituto Nacional de Música (1908).
Agora, o que poucos sabem acerca do compositor é que, em razão do seu diletantismo pela literatura brasileira, ele manteve estreita amizade com os escritores de sua época como: Machado de Assis; Olavo Bilac; Coelho Neto; Aluízio Azevedo; Gonçalves Dias; Visconde de Taunay; Antônio Sales; Oliveira Paiva, Juvenal Galeno, entre outros. É de Alberto Nepomuceno as composições: “Artemis” (1898), libreto de Coelho Neto; “Coração Triste” (1899), poema de Machado de Assis; “Numa Concha” (1913), poema de Olavo Bilac; “Tu és o Sol” (1894); “Medroso de Amor”(1894) e “A jangada” (1920), poemas de Juvenal Galeno.
A sua ópera inacabada “O Garatuja” (1904) é inspirada na obra homônima de José de Alencar e é considerada a primeira ópera genuinamente brasileira em sua música, ambientação e utilização da língua portuguesa.
E para quem pensa que o sucesso de Nepomuceno ficou relegado ao passado se engana! O escritor Valter Hugo Mãe é prova de que Alberto Nepomuceno continua, ainda hoje, a despertar o fascínio e o interesse dos apaixonados pela literatura. Durante a sua vinda a Fortaleza para a XII Bienal Internacional do Livro do Ceará, neste ano, o escritor português declarou sua paixão pela obra do cearense e afirmou que uma de suas missões por estas plagas era também de encontrar e adquirir a obra de Alberto Nepomuceno. Missão esta alcançada graças a um de seus fãs que o presenteou com raridades sobre o regente, mais uma vez provando a intensa sintonia entre música e literatura através do artista cearense.
Por isso, quando passares no rebuliço das feiras espia com o teu olhar atento para a estátua de Alberto Nepomuceno situada no início da avenida que leva o seu nome. Se puder, visite o conservatório Alberto Nepomuceno, no Benfica, e se permita ouvir e ler, um pouco mais, sobre a nossa gente, nossa arte e nossa cultura que tanto tem a nos dizer!
Aumenta o som e boas leituras!
*Lílian Martins é jornalista, tradutora, professora, pesquisadora e militante em Literatura Cearense. Mestre em Literatura Comparada pela UFC com a dissertação: “Com saudades do verde marinho: O Ceará como território de pertencimento e infância em Ana Miranda”, vencedora do Prêmio Bolsa de Fomento à Literatura da Fundação Biblioteca Nacional e Ministério da Cultura (2015) e do Edital de Incentivo às Artes da Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor) em 2016. É uma apaixonada por rádio, sebos, pelos filmes do Fellini, os poemas de Pablo Neruda e outras velharias…
Eu, que amo música, sinto-me contemplado nesse texto da nossa queria Lílian ^=^ parabéns
Eu, que amo seu “Mar Original” e fui atingida em cheio com “Três golpes d’água”, sinto-me muito grata com este seu comentário e, principalmente, pela sua leitura Talles! 300 milhões de beijos!