Ilustração: Jéssica Gabrielle Lima

Por Ayla Andrade*
Como são feitas as cachoeiras?

Quando os rios são jovens, as alturas imensas e as gotas de chuva se acumulam embaixo da terra nascem as cachoeiras.

Essa é a resposta mais rápida, objetiva e sintética e que pode responder a curiosidade instantânea de qualquer um. A cachoeira nasce de solos impermeáveis, lençóis freáticos, reservatórios aquíferos e, acredito eu, que todos esses termos não a suportam em sua forma cadente, flutuante.

Mas como uma cachoeira se torna uma cachoeira? Quando tem, enfim, a cachoeira barulho de cachoeira que se reconhece ao longe?

E quando, então, ela pode se chamar cachoeira? É de alturas muitas? Tem que ter véu de noiva ou uma queda onde se morre é suficiente para que se chame cachoeira?

Onde a cachoeira se torna eterna e pode enfim ilustrar os livros da 3º série? Como então se reconhece a cachoeira como beleza, pauta para os poetas, ponto de encontro dos apaixonados, selfie de turista? E coragem para pular de cabeça no vão da cachoeira?

A cachoeira isenta a tudo isso vai inundando o oco das rochas, arrendondando as pedras, criando limo, lustrando o que antes era ponta. Em tremenda força que gera, rompe, cai e aprofunda.

Nas cidades as cachoeiras são de chão, de esgotos, de marquises, resvalam para além do limite das calçadas quando atravessadas por ônibus maiores que elas próprias.
Há alguma beleza nas cachoeiras urbanas não fossem a falta de clareza de suas águas, algum mau cheiro e o indesejado banho que, por vezes, elas provocam.

A cachoeira veio parar hoje nessa crônica. Frequentemente pergunto ao meu filho sobre o que ele falaria na crônica da semana. Ás vezes ele responde, ás vezes não. Ás vezes ele mesmo me pergunta “você tá escrevendo a crônica é, mamãe?”. Dessa feita, como de rompante, como cachoeira cheia, jorrou essa: escreve sobre como são feitas as cachoeiras.

Ayla Andrade
novembro, 2017

*Ayla Andrade é assistente social, cronista, contista e amante do cotidiano. Ela já publicou o livro Mais feliz dos silêncios (Editora Substânsia, 2014) e publicou contos em algumas antologias, entre elas Encontos e desencontos, Antologia Massanova e O cravo roxo do Diabo: o conto fantástico no Ceará.

https://open.spotify.com/episode/4E8R7dk8mj2RWMTjLKAn54?si=AIAkIfjXTk-6877U64qXDA

Tagged in:

,

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

View All Articles