Uma pesquisa histórica bem elaborada, um traço pungente, uma narradora sólida e muito, mas muito, humor sarcástico. Essa é a “receita” de A Origem do Mundo – Uma História Cultural da Vagina ou A Vulva VS. o Patriarcado, produção da quadrinista sueca Liv Strömquist que chegou ao Brasil em edição da Companhia das Letras. A história em quadrinhos – constituída majoritariamente em preto e branco – mostra como o corpo feminino foi dissecado, mal estudado, punido, cerceado e ignorado ao longo da história da humanidade. Antes disso, conforme mostra Liv, existiu adoração a genitália feminina em algumas culturas. Mas, em algum ponto, o status de divindade foi substituído pelo escárnio e pelo desconhecimento quando se fala da vagina.

Esses, aliás, são os sentimentos existentes em relação a vários campos do corpo e da existência feminina. Ao longo da narrativa, Liv mostra que fez uma pesquisa teórica muito bem apurada. O mérito dela é conseguir transpor o conhecimento histórico e científico de forma palatável. O leitor não fica entediado. Ao contrário, os textos e as imagens fluem para nos fazer querer sempre avançar mais uma página. É uma leitura extremamente contagiante!

É particularmente interessante acompanhar o humor de Liv ao abordar o pensamento de pesquisadores e cientistas. “A maioria das mulheres não é incomodada por nenhum tipo de relação sexual”, disse o médico Willian Acton. “Para três quartos de todas as mulheres, os abraços do marido são um suplício”, disse o médico Adam Raciborski. “O pescoço caracteristicamente alongado da mulher é sinal de sua falta de paixão”, segundo a frenologia – uma pseudociência popular no século XIX. Essas e outras “barbaridades” foram faladas, replicadas e consideradas verdadeiras por muitos e muitos anos. À época, claro, esse era o conhecimento teórico vigente e não existiam muitas contestações para as “recentes descobertas” feitas por “cientistas” que “estudavam” a vulva.

A quadrinista passeia por vários assuntos que são considerados tabus. E questiona: por qual razão eles são tabus? Menstruação, desejo sexual, publicidade, orgasmo, clitóris. A falta de pesquisas sérias – ou a existência de investigações baseadas em avaliação empírica e sem respaldo científico – nos fez desconhecer a vagina durante séculos. Como consequência, há um pudor excessivo e errôneo de muitas mulheres em relação aos próprios corpos. Com bom humor e arte, Liv ajuda a quebrar algumas barreiras e a explicar que – não importa o que estão falando – nossos corpos não são sujos, estranhos ou unidades feitas para o prazer alheio.

 

Uma história cultural da vagina ou a vulva vs. o patriarcado

Liv nasceu na Suécia e publicou sua primeira história – Cem Por Cento de Gordura – em 2005. À época, ela já foi considerada um enorme sucesso. Depois – segundo divulgação do site da editora Companhia das Letras – foram lançadas Desejo (2006), A mulher de Einstein (2008), Os sentimentos do príncipe Charles (2010) e A cartilha da Liv (2011). Ela já teve livros publicados em países como França, Finlândia, Dinamarca, Alemanha, Espanha, Estados Unidos e Itália.

Serviço
A ORIGEM DO MUNDO – Uma história cultural da vagina ou a vulva vs. o patriarcado
Liv Strömquist
Tradução: Kristin Lie Garrubo
Preço sugerido: R$ 69,90

 

 

 

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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