Eu nunca tive uma ligação muito forte com a poesia. Talvez por má influência de algumas professoras de literatura da escola ou por não ter curiosidade para encontrar bons poetas. O fato é que só comecei a acessar poesia como um gênero que me move a partir do curso de letras, feito na Universidade Federal do Ceará. E foi incrível. Conheci de Florbela Espanca a Manuel Bandeira. A poesia me pegou verdadeiramente e, desde então, eu sigo catando todos os livros de poemas aos quais tenho acesso. Pegando emprestado ou na biblioteca. Aprendi a nunca subestimar um livro de poemas – mesmo que esteja surrado ou o aspecto gráfico não seja bom. Eis que outro dia caiu em minhas mãos a obra A bruxa não vai para a fogueira neste livro, obra de Amanda Lovelace. Não lembro se solicitei o exemplar para a editora, a Leya, se os assessores de imprensa ligaram oferecendo ou se ele apenas foi endereçado para mim.

Amanda Lovelace (foto: divulgação)

Mas chegou por aqui e confesso: fiquei embasbacada. A bruxa não vai para a fogueira neste livro, obra da americana Amanda Lovelace, é o segundo volume de uma trilogia. E, como podemos esperar pelo título, o livro pega fogo. É gasolina, é fósforo, é labareda, é brasa, é arder na pele, é fogueira pura e muito mais. Amanda escreve textos simples e curtos. Fala sobre o feminino, sobre ser mulher, sobre sofrer, sobre estar no mundo, sobre relacionamentos, sobre ansiedades e sobre um monte de outros sentimentos que, por vezes, ficam enclausurados.

O livro é dividido em quatro partes: O Julgamento, A Queima, A Tempestade de Fogo e As Cinzas. Podemos considerar um exorcismo dividido em vários processos.

Em O Julgamento, Amanda mostra as várias facetas dos juízos que são impostos para nós, mulheres. Em A Queima, minha fase favorita no livro, a autora destrincha como nós mulheres fomos atiradas em fogueiras ao longo da história e, mesmo assim, conseguimos nos reconstruir. Alguns textos, claro, se tornam repetitivos, fazendo o livro ser longo e pesado. Longo por ter muitos textos; Pesado pelas temáticas tratadas. Mas, apesar do tom de dèja vu encontrado em alguns escritos, não podemos negar o valor da obra de Amanda. Ela esmiúça sentimentos que apenas uma mulher ferida pode entender. Talvez por isso – e também por ter surgido na internet – Amanda seja tão criticada. Ela fala sobre assuntos que não estão no chamado cânone literário.

A segunda parte, A Tempestade de Fogo, marca a figura feminina como mais autônoma, senhora de si e cheia de poder. Já em As Cinzas, quarta e última parte do livro, eu senti a maior repetição de motivos e textos.

Amanda Lovelace

Como a indiana Rupi Kaur e outras tantas poetas incríveis, Amanda Lovelace surgiu na internet – postando seus escritos em redes sociais e sendo compartilhada por milhares de pessoas. É outro ponto para tratar. Há uma certa resistência para a poesia surgida nos lugares não convencionais – do instagram até a pracinha do bairro. Mas não há mais meios de controlar (ou até mesmo podar) a literatura que salta desses locais. E, como diz o meu amigo Talles Azigon, “vocês querendo ou não, isso é literatura”. E é literatura não apenas por ser publicado, estar em listas de mais vendidos, ser compartilhado em todo o mundo e traduzido para vários países. É literatura, na realidade, pelo potencial e pela força artísticas ali contidas.

O livro é parte de uma trilogia. A primeira obra – A Princesa Salva a Si Mesma Neste Livro – foi traduzida e publicada no Brasil também pela Editora Leya. O primeiro elemento é a princesa; o segundo, claro, é a bruxa; e o terceiro é a sereia. A expectativa é que a mesma editora traga a última parte da obra de Amanda para o Brasil. Vamos torcer.

Serviço
A Bruxa Não Vai Para A Fogueira Neste Livro
Autora: Amanda Lovelace
Editora Leya
Tradução: Isabel Aleixo
Quanto: R$ 29,90

About the Author

Isabel Costa

Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é essa pessoa que consegue deixar o ar ao redor pleno de uma segurança incomum, mesmo com tudo desmoronando, mesmo que dentro dela o quebra-cabeças e as planilhas nunca estejam se encaixando no que deveria estar. É repórter de cultura, formada em Letras pela UFC e possui especialização em Literatura e Semiótica pela Uece. Formadora de Língua Portuguesa da Secretaria da Educação, Cultura, Desporto e Juventude de Cascavel, Ceará.

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