Por Bruno Paulino*

Foto: Tatiana Fortes

Epílogo
Eu quis, como Schumann, compor
Um Carnaval todo subjetivo:
Um Carnaval em que só o motivo
Fosse o meu próprio ser interior…
Quando o acabei – a diferença que havia!
O de Schumann é um poema cheio de amor,
E de frescura, e de mocidade…
E o meu tinha a morta morta-cor
Da senilidade e da amargura…
– O meu Carnaval sem nenhuma alegria!…

Escolhi esse tocante poema de Manuel Bandeira como epígrafe e leimotiv para escrever essa crônica, pelo verdadeiro fato de quando chega o carnaval eu ser acometido de uma irremediável melancolia. Mas aqui estou. Meus amigos viajaram, digo aqueles que são amigos mesmo. Alguns outros conhecidos viajarão ainda hoje para alguma praia ou serra que tenha sido mais convidativa com a programação momina.

Há chances de passar o primeiro carnaval da minha vida em casa e sozinho. E o pior é que ainda levaram as cervejas boas e me deixaram as que descem quadrado. Não faz mal, colocarei um Nelson Cavaquinho na vitrola – não tenho vitrola, mas assim soa bem romântico e decadente – meu companheiro de solidão e certamente me baterá aquele sentimento de nostalgia ao ouvir sua voz lastimosa – porém esperançosa – como sempre bate: “O sol….há de brilhar mais uma vez/A luz….há de chegar aos corações/O mal….será queimada a semente/O amor…será eterno novamente…”.

Sobre ficar só, sei lá, acho que tenho invertido as coisas como sempre hei de inverter. Enquanto os mais jovens vão acumulando os amigos, eu vou escolhendo os meus, e vou preferindo ficar em casa a sair à vera na avenida extravasando, até gosto de ficar lendo minhas coisas, escutando meu som, vendo meus filmes, e bebendo minhas cervejas quadradas.

Pensando bem, vamos ver o que virá desse Carnaval, minha receita para sobreviver aos quatro dias sempre foi mesmo: muitos filmes, livros e gibis. Mas talvez apareça algum convite e eu vá parar em algum churrasco e acabe tomando muita caipirinha para entrar a quarta-feira de cinzas no engov e com uma baita ressaca. Talvez fique em casa e brinque no bloco do eu sozinho, vendo os desfiles das escolas de samba na madrugada, com a esperança que a tristeza e a solidão não durem o ano inteiro.

Não que queira posar de egoísta, ou esnobe, longe de mim, cada um vive como quer, e carnaval é para fazer a festa mesmo. É como disse Machado de Assis numa crônica: “É crença minha, que no dia em que deus Momo for de todo exilado deste mundo, o mundo acaba”. Só quero, no entanto, aproveitar a solidão e chafurdar em toda minha interioridade. Gosto mesmo é do descanso depois da labuta, do descanso merecido. Tudo, tudo pra mim é matéria-prima pra curtir uma arte – ainda que ultimamente não tenha feito isso como pretendo.

Mas, no fundo, queria mesmo é ser o Jorge Ben Jor: extrair a poesia e cantar, cantar o carnaval.

Arte mesmo é ser feliz.

***

Bruno Paulino é cronista e aprendiz de poeta.

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Colaboradores LDB

Colaboradores do Blog Leituras da Bel. Grupo formado por professores, escritores, poetas e estudiosos da literatura.

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