O deputado federal Sérgio Moraes (PTB-RS)  envolveu-se em novo bate-boca, desta vez com o apresentador da rádio Globo, Roberto Canázio, em entrevista na quinta-feira [14/05].  Moraes foi o deputado que disse a frase, que ele mesmo reconhece, ficou famosa: “Estou me lixando para a opinião pública”.

Ele disse a frase ao ser questionado sobre o trabalho que fazia como relator da Comissão de Ética da Câmara dos Deputados, que julga o uso das verbas indenizatórias pelo deputado Edmar Moreira. A repercussão levou ao afastamento de Sérgio Moraes da relatoria.

O radialista abre a entrevista dizendo para o deputado: “Quero deixar bem clara a minha posição: fui a favor de seu afastamento”.

O deputado pede para explicar o contexto em que  falou a frase. Disse que uma jornalista o pressionava para afirmar que o castelo ao estilo medieval, que o deputado Edmar Moreira tem em Minas Gerais,  fora construído com dinheiro público.

Segundo Sérgio Moraes, ele tentava explicar à jornalista que o julgamento era sobre o uso que  Edmar fizera da verba de representação. E que o castelo teria sido construído há mais de 20 anos. Ainda de acordo Moraes, a jornalista teria se irritado, ameaçando “jogar na opinião pública”. Ele, então, teria pronunciado a frase, com o sentido, segundo disse, de preferir ficar com a verdade a se submeter à opinião pública.

 “Você acha que eu ia dizer aquilo do nada? E emenda, dizendo que a imprensa tem como “ferramentas”  as luzes, os microfones e dos jornais para “intimidar os deputados”.

Canázio intervém: “Nós nos abastecemos dos escândalos do Congresso Nacional”. [O clima começa a esquentar, ambos se altercam] E pergunta se os escândalos são “invenção da imprensa”. Diz que Moraes acredita em “conto de fadas”, e pergunta se o deputado Edmar teria “condições de construir aquele castelo” [alterado].

O deputado responde que a investigação cabe ao Ministério Público e à Receita Federal, pois a denúncia no Conselho de Ética é sobre o uso da verba indenizatória.

O radialista: “Ele foi expulso do partido [DEM]; me parece que o sr. acredia em conto de fadas.

– É o senhor [que acredita].

[Ambos começar a se estranhar]

– Eu, eu não? E continua perguntando se o deputado “acha pouco” o mau uso da verba indenizatória  e do dinheiro que “rolava” nas empresas [de Edmar Moreira]. E ataca  Moraes, dizendo que ele  tem um posto de gasolina onde gasta R$ 4.500 da verba indenizatória. E arremata: “A imprensa reflete a insatisfação do povo!” [Enfático]

Deputado Sérgio: Entao deixa eu dizer 4.500 reais é uma migalha perto do vocês levam do dinheiro do povo. A imprensa leva muito mais em publicidade. 

Canázio: Ora, deputado…

Deputado Sérgio: De progaganda da Petrobras, sem concorrência, aí vamos ver quem mete a mão [no dinheiro público]. Têm também a Caixa, o Banco do Brasil. Vocês [rádios e TVs] são concessão…

Canázio:  Peraí, o sr. perdeu completamente a sintonia, o sr. está apelando.

Deputado Sérgio: Ah, eu estou apelando…
[Os dois falam ao mesmo tempo]

Canázio: O sr. está sofismando [o deputado interrompe]. E o radialista: Eu posso falar? O sr. destrambelhou a falar, o sr. não deixa ninguém falar.

Deputado: Então baixa a bola, meu amigo.

Canázio:  Deputado, vamos tentar retomar, senão não dá…

Deputado: O sr. está com medo.

Canázio: Eu não tenho nada a temer, meu amigo, o sr. é que está  destemperado.

Deputado: O sr. me dá espaço…

Canázio: Eu estou dando espaço, o sr. está falando absurdo.

Deputado: Me dá espaço para falar quanto o grupo O Globo leva do governo federal. Dá ou não dá?

Canázio: Deputado, o sr. tem que entender uma coisa; quem está sendo julgado é o senhor. O sr. é que foi expulso [da Comissão de Ética]. Então não tenta devolver a bola para quem não tem nada a ver com as trapalhadas do Congresso Nacional. Quem está sendo julgado é o sr. e não as Organizações Globo, o sr. está entendendo?

Deputado: Pelo menos alguém está dizendo a verdade para o sr.

Canázio: Que verdade? E o sr. tem condições de dizer a verdade? As suas verdades são mentiras inteiras, entendeu? Estamos felicíssimos com o seu afastamento.

Deputado: Vou repetir uma coisa que ficou famosa: “Estou me lixando para a sua opinião”.

Canázio: [Batendo palmas] Atenção povo, ele está se lixando para a minha opinião, que reflete a opinião da maioria.

Deputado: Não vai me dar espaço…

Canázio: Presta atenção, o sr. está aqui sendo convidado; não é para questionar nada, tem que responder perguntas referente àquilo que aconteceu. Acho que o sr. não tem condição de levantar qualquer questionamento. [Alterado]

Deputado: A ditadura da imprensa é que não permite…

[Os dois falam ao mesmo tempo]

Canázio:  Deixa eu falar, cala a boca para eu poder falar.

[A ligação cai ou alguém a corta]

O radialista coninua a falar: Com relação às verbas de propaganda, a exemplo das verbas indenizatórias são absolutamente normais [sic], é publicidade, acontece em qualquer lugar do mundo. E mais, propaganda oficial não cala a boca das Organizações Globo, muito pelo contrário, isso não cria vínculo de dependência.

Aos comentários: O deputado Sérgio Moraes pode estar totalmente errado, mas se, por um lado ele está se “lixando” para a opinião pública, esta não é propriedade da imprensa. Nem o fato de o deputado estar respondendo a duas ações penais* no STF autoriza que ele seja tratado da forma como o radialista Roberto Canázio, da rádio Globo, o tratou.

A entrevista é uma aula do antijornalismo, que deveria ser servir de exemplo a estudantes e profissionais. Jornalista não é palpiteiro e muito menos juiz, para iniciar uma entrevista condenando o entrevistado. Dizer que um entrevistado não pode “questionar nada”, aí já se chega às raias do absurdo.

Jornalista também não pode ser arrogante e muito menos ameaçar quem quer que seja com a sua condição, e muito menos com o peso da opinião pública, que não é um joguete em suas mãos.

Portanto, os erros de Sérgio Moraes não absolvem e nem autorizam os erros da imprensa, cujo o papel é de narrar o jogo e não de participar dele.

*O deputado é acusado no STF e usar indevidamente um telefone público para ligações particulares, inclusive internacionais. Na outra ação, de ter contratato indevidamente 75 funcionários. Ambas de quando era prefeito de Santa Cruz do Sul (RS).

Ouça a entrevista na íntegra, no Comunique-se: são 14 minutos, mas vale a pena.