Na posse do novo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a fazer a defesa enviesada do presidente do Senado, José Sarney.

1. Disse que se deve evitar a condenção prévia. Nenhuma discordância.

2. Afirmou que a imprensa quer condenar antes da conclusão do processo. Aqui, há de se comentar, observada a restrição acima.

O presidente Lula não explicou exatamente de qual processo fala. Se aquele que transcorre no próprio Congresso ou de um possível processo judicial que poderá atingir os parlamentares e funcionários públicos sob suspeita.

Em um caso ou outro, é óbvio que a imprensa não pode esperar o resultado do “processo” para somente depois noticiar o caso. O trabalho da imprensa difere do trabalho do Judiciário e também do que faz o Congresso Nacional ou o Executivo.

Os tempos são diferentes, o papel de cada um é diferente. Não se pode pedir que um juiz julgue um caso em 24 horas, como não se pode pedir que um jornal espere 24 meses para noticiá-lo. O mesmo vale para o Legislativo: não se pode exigir de um jornalista que só escreva sobre um projeto de lei depois de votado – ou que só divulgue o resultado de uma CPI, sem falar de seu desenrolar.

A ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça [STJ], tem entendimento bastante claro dos tempos diferenciados de um processo judicial e daquel que move a imprensa. Em decisão, que divulguei em postagem no dia 29 de maio, ela faz um arrazoado bastante interessante sobre o assunto. Veja aqui.

3. Lula disse ainda que não vai interferir no Ministério Público [ótimo, ainda que esteja apenas respeitando a Constituição], mas sentiu-se no direito “pedir” ao novo procurador geral que, em suas ações, não pense “apenas na biografia de quem está fazendo a investigação, mas pensando da mesma forma na biografia de quem está sendo investigado” [grifei].  Essa parece ser a nova versão de Lula para o lamento que exprimiu ao ver José Sarney ser tratado como uma “pessoa comum”.

Aqui o caso se torna complicado e parece dar margem a apenas uma leitura. O presidente acha que existem cidadãos de categorias diferentes. Aqueles que, por sua “biografia”, pairam acima dos cidadãos comuns – e as pessoas ordinárias, sem o privilégio daqueles, digamos assim, de sangue azul.

A biografia de uma pessoa não pode ser um álibi para que ele cometa malfeitoriais.

Escreveu certa vez o jornalista Jânio de Freitas, a respeito do escorregão de Rubens Ricúpero [o que é ruim a gente esconde, o que é bom a gente mostra], muito menos grave do que os acontecimentos que rondam Sarney:

“O mau passado elimina confiança e admiração, mas o bom passado não é um habeas-corpus. Cada minuto da vida é uma encruzilhada”.

Responda rápido. Como vocês reescreveria a frase para o presidente do Senado, José Sarney?:

a) “O  bom passado não é um habeas-corpus. Cada minuto da vida é uma encruzilhada”.

b) “O mau passado elimina confiança e admiração. Cada minuto da vida é uma encruzilhada”.