Juanita LeónCronista e editora multimídia, a colombiana Juanita León defende que o papel do jornalista é “deixar testemunho sobre algo que aconteceu”.

“No somos machos, pero somos muitos” [Não somos machos, mas somos muitos, de 2004] e “País de plomo” [País de chumbo, de 2006], são livros nos quais ela narra o conflito colombiano a partir da voz dos cidadãos comuns.

Para ela, sobram reportagens inócuas e falta escrever mais histórias sobre “o poder dos poderosos”.

Juanita dirige La Silla Vacía [A cadeira vazia], um portal de notícias online e diz que a internet está descortinando um “mundo mais emocionante” para os jornalistas.

A entrevista abaixo, concedida ao jornalista Paul Alonso, foi reproduzida do Blog de Notícias, do Centro Knight, de onde também foi recolhida a fotografia. [O texto foi publicado em espanhol, a tradução é de minha responsabilidade, pelo que peço desculpas :)]

“É preciso contar mais histórias do poder dos poderosos”

• Como se combina o espírito analítico de La Silla Vacía com a investigação e a cobertura de notícias diárias?

Creio que se a investigação jornalística é boa, deve ser analítica. O importante é que a análise seja derivada da reportagem e não do prejulgamento [ou pré-conceito] dos jornalistas, como acontece às vezes. Em La Silla Vacía cobrimos a conjuntura noticiosa, porém não apenas pelo ângulo do acontecimento, mas narrando os contextos, que é, em última instância, a melhor narração para a web.

• De que modo se contrasta este meio digital com a imprensa tradicional colombiana e como se diferencia desta? Ou seja, qual é a sua contribuição e por que são mais importantes esse tipo de meio na Colômbia hoje?

A contribuição de La Silla Vacía se dá em vários níveis. Por um lado, desconcentra o monopólio da informação. Na Colômbia, existem muito poucos meios e, ainda, em poucas mãos. Os meios de comunicação pertencem a umas poucas famílias e conglomerados econômicos. Uma proposta como La Silla Vacía oferece outro ponto de vista, nova informação e amplia a agenda informativa. Aporta, ainda, uma narrativa que própria da web. Não sentimos a necessidade de usar os conteúdos do impresso, nem sentimos nostalgia do texto. Estamos inovando as formas de narrar pela web, com coberturas ao vivo, via Twitter, com gráficos, com números, etc. Por último, aportamos novas vozes ao debate. Nosso blogueiros dão informações de qualidade, escritas por novas gerações, por gente que não existia nos meios anteriores.

• País de chumbo, seu livro mais recente, aborda o conflito da violência na Colômbia, do ponto de vista do povo que padece a violência, as pessoas anônimas, e seu temor cotidiano. Como é o processo de investigação para narrar e interpretar esses medos?

Exige varias horas de reportagem convivendo com essas pessoa. Implica “ponerse en sus zapatos” [saber onde o sapato aperta ou pôr-se no lugar delas], de tentar sentir o terror que sentiram. Isso é impossível fazer, mas fazer a tentativa, já ajuda.

• Escrevestes sobre o livro: “À medida que cobria o conflito armado, era mais consciente da informação que deixar fora dos meus textos. Não por má-fé, ou por que um editor exigisse isso, mas porque não basta saber algo, é preciso prová-lo. Este livro busca espiar essa culpa” Quão importante são os detalhes improváveis (rumores, comentários, percepções, sensações, etc.) para contar a história de um país?

Com dizem, o diabo está nos detalhes. São detalhes, as perguntas pequenas, as que permitem elucidar a verdadeira história. É preciso levar as fontes a converter seus adjetivos em substantivos, a traduzir suas opiniões em histórias concretas. É preciso ir aos lugares para ver, para ouvir, para sentir. Nada disso se consegue atrás de uma mesa. Não se pode escrever uma boa uma boa história, se a reportagem é feita com pressa.

• Qual é o papel do jornalismo atualmente na Colômbia?

Às vezes eu sinto que o verdadeiro papel dos jornalistas é deixar testemunho de algo que aconteceu. Às vítimas ajuda também que alguém reconheça a sua dor, que alguém crê que não estão loucos, que o horror não foi inventado.

• Quais são os maiores desafios dos novos meios colombianos?

Nós temos a sombra de García Márquez, queremos imitá-lo sem ter uma fração de seu talento. Às vezes os cronistas substituem sua falta de reportagens circunlóquios literários. Eu creio que há muitas crônicas sobre temas inócuos – sobre velhos com mais de 100 anos – e sobre desvalidos. Falta contar mais histórias sobre o poder dos poderosos.

• Como escritora de não-ficção e jornalista multimídia, qual crê que seja o futuro do repórter no jornalismo da era digital?

Creio que o cronista do futuro terá de se parecer mais com um artista: deve apontar a criar experiências únicas para seus usuários. Como os cronistas antigos, você precisa ocupar uns minutos ou umas horas da vida de outro [o leitor]. A diferença é que não fará com palavras. Fará com as ferramentas interativas que a web oferece: com software 3D, que permitirá recriar mundos o mundo reportado em mundos virtuais, com vídeos ao vivo, com a possibilidade de os usuários interagirem diretamente com as fontes. Será um mundo mais emocionante do que é hoje.

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