Meu artigo publicado na edição de hoje (27/10/2011) do O POVO.
A culpa é da motocicleta
Plínio Bortolotti
Não vou fazer aquela piada do sofá na sala, porque é velha. Mas que parece com a campanha que se está fazendo contra o uso de motocicletas, isso parece.
Já vi neste jornal as motos serem responsabilizadas pelos crimes de pistolagem, pois sendo um veículo rápido, facilitaria a fuga. Bom, o mesmo se poderia dizer quando os bandidos começaram a andar a cavalo, bicho bem mais rápido que o bípede humano. E, depois, quando os criminosos começaram a usar carros, como bem se vê nos filmes de gângster.
Já vi também se propor aumento dos impostos para motocicletas, de modo a compensar os acidentes causados por elas. Mas, até agora, não li ninguém propondo aumento de imposto para carrões de luxo – muitos dos quais são utilizados como armas por seus motoristas inimputáveis. E nem se propor um teste de sanidade mental para quem compra um carro ao custo de um milhão de dólares ou mais.
Mais recentemente, baixou o gênio legiferante no ministro Alexandre Padilha (Saúde). Ele sugere a criação de uma lei limitando a venda de motocicletas somente a quem tiver carteira de habilitação. Ok, mas por que o negócio vale só para veículos de duas rodas? Quer dizer que sujeito pode comprar um caminhão trucado sem carteira de habilitação, mas não pode comprar uma motocicleta?
Já existe legislação suficiente para punir quem anda sem habilitação, quem circula com o veículo em condições inadequadas ou quem pratica irregularidades no trânsito. A questão é que falta rigor dos governantes em fiscalizar (eles têm medo de perder votos) e frouxidão da Justiça em apenar com mais dureza motoristas que provocam acidentes graves por excesso de velocidade, desrespeito às leis de trânsito ou embriaguez.
O problema é que motocicleta é transporte – muitas vezes instrumento de trabalho – de pessoas de menos recursos, os ascendentes da chamada nova classe média, o que causa horror aos burgueses e à pequena burguesia, pois acham que somente eles têm direito a circular em veículos automotores individuais.
Valeu Plínio pela abordagem nesse texto, que com certeza expressa a opinão de muitas pessoas, principalmente as que defendem direitos iguais para todos(as). A solução proposta pelo Ministro é totalmente injusta e inadequada. É preciso criar as condições no planejamento urbano para que as pessoas do povo que andam a pé, de bicicleta ou de moto tenham o direito de ir e vir sem serem atropeladas e mortas, muitas vezes por motoristas alcoolizados.
Plínio, ví ontem em uma TV paga, que a Espanha conseguiu diminuir em 91%, as mortes no trânsito, em apenas tres anos depois de implatar a lei seca. Para isso ela condena a 1 ano de encarceramento quem dirigir sob efeitos de alcool ou substâncias entorpecentes em velocidades compativeis com a via. Se a velocidade do infrator pego alcoolizado for maior do que a prevista na via de trânsito a pena sobe para dez anos. O segredo desse recrudescimento de mortes no trânsito, é uma fiscalização rigorosa, cara, feita por terra e pelo ar através de helicopteros, radares e viaturas, flagrando e autuando dia e noite infratores, principalmente nos arredores de bares e de casa de diversão. Fiscalização! Esse é o segredo. Sem fiscalização, lei nenhuma pega. Aqui no meu bairro, é comum adolescentes e mulheres sem habilitação dirigindo carros e motos como se fossem brinquedos.O aluguel de motos para adolescentes brincarem é uma atividade comercial lucrativa e crescente. Embora criminosa.
Plínio
Em parte concordo com vc, mas algo tem que ser feito. No meu plantão aos domingos é uma epidemia os jovens morrendo por acidente por moto. Tenho, nas nossas reuniões da Federaçao Nacional dos Médicos, feito discussão sobre o assunto e é opinião geral que dirigir moto no Brasil é o meio mais rápido de se aproximar da morte. Além do mais são pacientes jovens na grande maioria, que estão nos deixando e quando não morrem ficam ocupando leitos de UTI durante muito tempo. Sao pacientes graves, com politraumatismo, fraturas múltiplas e com taumatismo craniano.
Ainda não sei exatamente o quê fazer, mas algo tem que ser feito. pois nossos jovens estao morrendo. Hoje é um grave problema de saúde pública.
Abraço
Agradeço, José Maria,
A meu ver, se as autoridades quisessem agir, já haveria legislação suficiente para punir infratores. A mais, Fortaleza vive um caos no trânsito, sem fiscalização alguma, prevalecendo a lei do mais forte.
Plínio
Oi Plínio, dessa vez vou aproveitar o ambiente de democracia deste espaço pra discordar!
Até acho que uma tal lei seria injusta, pois, pra variar, acaba atingindo o mais fraco. Mas como disse o José Maria acima (seria o respeitável ex-Vereador?, com V maiúsculo mesmo), motocicletas representam um grave problema de saúde pública.
Minha esposa se graduou em Medicina em Sobral há tres anos e me contou a seguinte estória. Interessantemente, a lei brasileira não entra lá (sem piadinhas, por favor! hehe). Fato é que absolutamente ninguém usava capacete em Sobral até que o órgão de transito local, devido a uma nova lei, passou a exigir que o condutor das motos passasse a usar o capacete, mas não o passageiro. Inicialmente, os motoqueiros chiaram, principalmente os moto-taxistas, mas acabaram aprendendo a respeitar a lei, uma vez que o desrespeito doía no bolso. Como consequencia, as mortes por traumatismo craniano caíram cerca 50% na Santa Casa de Sobral. Ela me dizia, em tom de brincadeira, que os outros 50% eram os passageiros.
Tenho certeza que vc imediatamente pensou que a fiscalização é a solução. Mas, se colocando na posição do gestor de saúde pública, dá pra entender a complexidade da coisa.
Voltando ao exemplo de Sobral. A lei local nada mais é do que uma versão branda da lei nacional, mas que pode ser fiscalizada pelo órgão local. Quando da sua implementação, houve protestos de mototaxistas e motoqueiros em geral, que viam no capacete e na lei apenas um custo extra e um instrumento de extorsão, respectivamente. Empregadores, que possuem um monte de motoqueiros trabalhando pra eles não querem ter gastos com segurança. Disso decorre o entrave político. Sem contar a pura e simples birra em se obedecer uma lei, qualquer que seja ela. Mesmo com tal redução no número de mortes, quando saímos do Ceará, há alguns anos, quase nenhum passageiro usa espontaneamente o capacete em Sobral, uma vez que isso não dá(dava) multa.
E Sobral é uma cidade relativamente evoluída. A coisa piora, e muito, de figura, se falarmos dos rincões menos conhecidos do Ceará e do Brasil.
A solução a longo prazo é óbvia: Educação. Mas até lá muita gente ainda vai morrer e é imprescindível fazer alguma coisa, qualquer coisa. Daí o desespero de quem tá com a batata quente na mão, como o ministro da saúde.
Um abraço e meus parabéns (atrasados, mas sinceros) pela cidadania cearense, uma homenagem mais que merecida.
Caro Lima,
Agradeço o seu comentário, sempre pertinentes, por sinal. Quanto à cidadania cearense, foi o melhor presente que eu poderia receber para comemorar meus 30 anos na terra de José de Alencar, de Bárbara de Alencar e do Dragão do Mar: a Terra da Luz.
O Jose Maria que escreve é sim o ex-vereador, que continua, mesmo não tendo mais mandato, agindo em favor de interesse público.
Abraço,
Plínio