Meu artigo publicado hoje (5/4/2012) no O POVO.

Foto de Drawlio Joca. Veja mais em http://www.flickr.com/photos/drawliojoca (clique para ampliar)

STJ: o álcool, as crianças, a moral e a ética
Plínio Bortolotti

Na semana passada o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou dois processos que provocaram polêmica por todo o país. O primeiro, envolvendo a chamada Lei Seca, que tornou crime dirigir veículos estando o motorista com mais de seis decigramas de álcool por litro de sangue. O segundo, absolvendo um réu acusado de estuprar três meninas de 12 anos de idade.

Os dois processos mexeram com aquilo que se costuma chamar de “opinião pública”, que aparentemente condenou os dois resultados. Uma das coisas que alguns segmentos jurídicos costumam dizer, em casos assim, é que os tribunais não podem capitular à opinião pública. Concordo. A grita das multidões pode levar ao precipício – e a história já mostrou: muitas vezes leva.

Mas é bom diferenciar: uma coisa é submeter-se à turba; outra é alienar-se da sociedade – outra ainda é temer guiar-se pela ética para encontrar o bom caminho no emaranhado de costumes ultrapassados, por machistas ou preconceituosos.

No primeiro caso, o STJ agiu com razoabilidade ao analisar a lei, estabelecendo que a quantidade de álcool no sangue só pode ser medida por bafômetro ou exame médico. E a lei faculta ao suspeito o direito de não produzir provas contra si mesmo. Para quem acha que essa forma de aferição é equivocada, o caminho é pressionar o Congresso para exigir mudanças na lei, tornando-a mais clara e mais rigorosa.

No caso do estupro, é inadmissível abrir exceção na lei que condena sexo com menores de 14 anos pelo fato de a vítima já vir sendo explorada sexualmente, uma situação humilhante à qual uma criança não se submete conscientemente ou por prazer. Seria o mesmo que desculpar um sujeito que mata o outro porque a vítima já padecia de ferimentos graves.

O STJ julgou de acordo com a velha moral, vendo a mulher como eterna pecadora, sempre pronta a corromper os homens. O tribunal perdeu duas oportunidades: de mostrar que a ética deve questionar a moral, e de aplicar um corretivo no réu, de modo que ele aprendesse que aos seres humanos foi dada a capacidade de pensar e de escolher.

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