Reprodução do artigo publicado na coluna “Menu Político”, caderno “People”, do O POVO (4/5/2014)

Ilustração: Carlus

Ilustração: Carlus

Por que os Estados Unidos não celebram o Primeiro de Maio
Plínio Bortolotti

Em uma época em que o 1º de Maio virou festa, quando sorteios de brindes e discurso de políticos tomam o protagonismo dos trabalhadores nos palanques dos sindicatos, talvez seja interessante resgatar a história que deu origem à data.

No início da Revolução Industrial (século XIX), não havia limite para as horas trabalhadas, em fábricas ou minas. A jornada de trabalho podia chegar a 16 horas diárias, sem poupar as crianças.

Em 1819, sob intensa mobilização, o movimento operário inglês consegue um pequeno avanço: restringir o trabalho de jovens entre 9 anos e 16 anos a “apenas” 12 horas diárias. Os industriais revoltaram-se, exigindo que crianças trabalhasse pelo menos dez horas por dia, caso contrário, segundo eles, as indústrias faliriam.

Nos Estados Unidos, a situação era similar à da Europa, com jornadas intermináveis, sob as mais abjetas condições de trabalho. Em congresso de 1884, a recém-fundada Federação Americana do Trabalho (AFL, pela sigla em inglês) estabelece o 1º de maio de 1886 como data para uma greve geral.

O dia chega e a consigna vai para as ruas: “A partir de hoje, nenhum operário deve trabalhar mais de oito horas por dia. Oito horas de trabalho! Oito horas de repouso! Oito horas de educação!”

Chicago, a vanguarda do capitalismo americano, é a cidade mais mobilizada, sob a liderança do movimento anarquista. A cidade fica paralisada. Nas escaramuças, seis operários foram mortos pela polícia, dezenas estavam feridos e centenas presos.

Na mesma praça onde os trabalhadores foram mortos, realiza-se uma grande manifestação. Uma bomba explode no meio da multidão, deixando feridos e mortos. Policiais começam a atirar: avalia-se que dezenas de pessoas, inclusive crianças, foram mortas pelas armas de fogo, mas nunca se chegou a um número oficial.

Acusados de terem jogado a bomba são detidos sete líderes operários: August Spies, Michel Schwab (editores de jornais operários em língua alemã), Sam Fielden, Oscar Neeb, Adolph fischer, Louis Ling e George Engel. O julgamento começa no dia 21 de junho de 1886 e transcorre rapidamente.

Menos de quatro meses depois, a sentença é lida: Parsons, Engel, Fischer, Lingg e Spies são condenados à morte; Fielden e Schwab, à prisão perpétua e Neeb a 15 anos de cárcere. Um mês após, a sentença de morte é executada por enforcamento; Lingg não vai ao patíbulo, pois havia se suicidado na prisão.

Seis anos depois desses assassinatos sob os auspícios da Justiça, o governador de Illinois anula a sentença e liberta os três sobreviventes, acusando o juiz, os jurados e as testemunha de acusação de infâmia.

A Segunda Internacional, em seu congresso de 1889, estabelece o Primeiro de Maio como Dia Internacional dos Trabalhadores, para lembrar a luta pela jornada de oitos horas de trabalho e os “mártires de Chicago”. Os Estados Unidos, porém, nunca reconheceram a data como o Dia do Trabalhador, fazendo seu Labor Day na primeira segunda-feira de setembro.

NOTAS

Chicago
Nas semanas que antecederam o 1º de maio de 1886, o jornal Chicago Times fazia campanha contra o movimento grevista, com textos assim: “A prisão e o trabalho forçado são a única solução possível para a questão social”, e incentivando a violência: “O único jeito de curar os trabalhadores do orgulho é reduzi-los a máquinas humanas, o melhor alimento que os grevista podem ter é chumbo”.

Industriais
Nem todos os industriais eram contra as oito horas de trabalho diárias. Um deles, o britânico Robert Owen (1771-1858), dono de fábricas, que tornou-se socialista, escreveu um livro chamado Catecismo, no qual expõe sua defesa para a jornada reduzida. Entre elas, defende que “com boa organização” oitos horas de trabalho seriam suficientes para “criar superabundância e riquezas para todos”.

Livro
As informações da coluna foram compiladas do livro 1º de Maio – Cem anos de luta: 1886-1986, de José Luiz Del Roio.

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