Reprodução da coluna “Política”, edição de 14/5/2014, do O POVO.

O preço (para a democracia) das campanhas

Escrevi ontem sobre o preço absurdo das campanhas eleitorais no Brasil, dando exemplo do custo de campanhas para o Legislativo. No mesmo dia, O Globo trouxe reportagem mostrando quanto os três principais partidos que terão candidatos a presidente – PT, PSB e PSDB – pretendem gastar com seus candidatos. Segurem-se: R$ 500 milhões de reais. Repetindo: quinhentos milhões de reais. É o dobro que gastaram em 2010. Mantida a mesma estrutura de arrecadação, de 70% a 90% deverão vir do caixa de empresas: bancos e empreiteiras, principalmente.

O valor soma 690 mil salários mínimos, equivalente a 79 mil anos de labuta de um trabalhador que receba essa remuneração.

Na coluna de ontem, mostrei que a eleição de um deputado estadual pode custar até R$ 1 milhão; federal até R$ 5 milhões e senador até R$ 10 milhões. Quanto mais um candidato gasta, maior a probabilidade dele ser eleito. Ou seja, é o dinheiro e não as propostas, que determinam quem serão nossos representantes. Alguém tem dúvida de que uma trampa desse tipo põe em risco a própria democracia? Será que muitas pessoas honestas, que estariam dispostas a se candidatar, não recuam horrorizadas?

Apesar de o processo estar inconcluso, o Supremo Tribunal Federal (STF), já firmou maioria contra a doação de empresas. Dos 11 ministros, seis haviam votado pela proibição do financiamento das empresas, quando o Gilmar Mendes pediu vista, adiando o fim do julgamento. A conclusão pode ocorrer ainda este ano, mas nenhum partido quer que vigore nestas eleições.

TORTURA
“Se eu fosse detido pelas autoridades no meu país, ficaria confiante de que estaria a salvo da tortura?” No Brasil, 80% (oito em cada dez pessoas) responderem negativamente, ou seja, temem ser torturados pela polícia. Em segundo lugar na consulta, ficou o México (64%), sendo que a média global do temor da tortura foi de 44%.

A pesquisa foi feita pela Anistia Internacional, ouvindo 21 mil pessoas em 21 países de todos os continentes. A conclusão é que o medo de tortura existe em todo o mundo, com o Brasil em primeiro lugar.

Por outra vista, 80% dos pesquisados no Brasil manifestaram-se contra a tortura. Em que item você apostaria para explicar índice tão alto de brasileiros contra a tortura?: a) a grande maioria é, de fato, contra qualquer tipo de tortura; b) as pessoas têm vergonha de dizer que defendem a tortura; c) porque os adeptos da prática, a exemplo do deputado Jair Bolsonaro, gritam mais alto e tem-se a impressão equivocada de que há mais gente a favor da tortura do que realmente há.

MARINA
Marina Silva (Rede/PSB), em declaração publicada ontem neste jornal, diagnosticou o surgimento de “um novo ativismo que não se enquadra mais nas lógicas anteriores”, e citou pesquisas mostrando que 75% da população quer mudanças. O problema é que Marina está na chapa de um político tradicional, Eduardo Campos – que nada tem a ver com o “novo ativismo” – e até ontem era aliado do governo federal. Quem poderia representar o “desejo de mudança” seria ela própria, que no entanto, é apenas vice na chapa de Campos. Digo “apenas”, pois vice não apita nada. E quando quer apitar, o titular dá um jeito de jogá-lo para escanteio.

NA CONTRAMÃO
Tirando iracundos antipetistas quem está a favor da decisão do ministro Joaquim Barbosa em negar o direito ao trabalho a José Dirceu e Delúbio Soares? O presidente do STF vai contra a jurisprudência firmada, de longa data, que favorece presos em regime semiaberto.

Alguém pode dizer que os dois petistas têm de pagar pelo que fizeram e que o benefício – mesmo concedido a milhares de outros presos – a eles deve ser negado. Porém, foi o STF que lhes impôs a pena de semiaberto, julgando suficiente a punição, e não poderia cassar-lhes agora o direito de serem tratados como os demais condenados.

O presidente do STF fez um julgamento que pode ter consequência perniciosa, levando juízes de execução penal Brasil afora a seguir-lhe o exemplo. O caso é que Barbosa parece estar tomado de fúria vingativa, sobrepondo o papel de justiceiro à toga de juiz.

STF
“A Justiça não admite coisas desse tipo [o espetáculo]; ela exige isolamento, admite mais a tristeza do que a raiva e pede a mais cautelosa abstinência diante de todo os prazeres de estar sob a luz dos refletores.” Hanna Arendt, em Eichmann em Jerusalém – Um relato sobre a banalidade do mal.

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