Reprodução da coluna “Menu Político”, publicada no caderno “People”, edição de 7/9/2014 do O POVO.

Arte: Carlus

Arte: Carlus

O acaso vem nos socorrer ou nos afligir?
Plínio Bortolotti

Tostão costuma dizer que técnico influi pouco nos resultados dos jogos, e que são inúmeros fatores a determinar o escore de uma partida de futebol. Na coluna de domingo passado, neste jornal, ele escreveu: “A maioria dos times ganha e perde, sobe e desce na tabela, por causa do equilíbrio e de inúmeros outros motivos, às vezes desconhecidos. Apenas os comentaristas explicam tudo”.

Lembrei-me do livro que lera há pouco: O andar do bêbado – Como acaso determina as nossas vidas, de Leornar Mlodinow, professor de teorias da aleatoriedade no Instituto de Tecnologia da Califórnia. Na obra, ele conversa sobre a influencia da aleatoriedade em todas as atividades humanas – dos negócios ao esporte – e do papel crucial que o acaso desempenha na vida, apesar da ilusão de que é possível controlar todas as variáveis.

De início, Mlodinow expõe por onde vai conduzir o leitor: “Nos esportes, criamos uma cultura na qual, com base em sensações indutivas de correlação, o êxito ou fracasso de um time é atribuído em grande media à competência do técnico. Por isso, quando um time fracassa, normalmente o técnico é demitido. A análise matemática das demissões em todos os esportes, no entanto, mostrou que, em média elas não tiveram nenhuma efeito no desempenho da equipe. Um fenômeno análogo tem lugar no mundo corporativo (…)”.

Fazendo cálculos das partidas jogadas em temporadas de beisebol, ele mostra, por exemplo, que os resultados reais de jogadores e clubes teriam pouca diferença se o campeonato fosse resolvido em um jogo de cara ou coroa, incluindo as boas e as más fases das equipes.

Mlodinow conta o caso de Leonard Koppet, que afirmou ser capaz de prever, no final de janeiro, se o mercado de ações subiria ou cairia naquele ano. Koppet afirmou, em 1978, que seu método fora capaz de prever corretamente o mercado nos últimos 11 anos. De 1979 até 1989 o seu sistema funcionou; falhou em 1990, e voltou a acertar até 1998, quando revelou o segredo dos critérios que se valia em suas previsões. Colunista da revista Sporting News, baseava-se nos resultados do Super Bowl (campeonato de futebol americano): sempre que a vitória fosse de um time da NFL (umas das ligas profissionais), ele previa que o mercado iria subir; se o campeão fosse da AFL, apostava na queda. Assim, se Koppett resolvesse manter seu método em segredo, ele poderia ser louvado um gênio de Wall Street.

(Quem duvida que a aleatoriedade pode ser definidora em muitas circunstâncias, basta observar estas eleições presidenciais. Do fracasso em registrar a Rede como partido, de acaso em acaso, Marina Silva tornou-se uma vice relevante e, em seguida, galgou a posição como um dos principais candidatos a presidente da República. Fora da aleatoriedade, resta crer em um deus que intervém diretamente na existência de cada um dos mais de sete bilhões de habitantes do planeta; ou, pelo menos, na vida de alguns poucos escolhidos: alguns para morrer; outros, para brilhar.)

NOTAS

Previsão
Jornalistas habituados aos solavancos da política acautelam-se quando arriscam previsão. Por exemplo, costumávamos comentar na redação: “Nesta eleição haverá a velha polarização PT versus PSDB”, seguida imediatamente da ressalva: “A não ser que haja um terremoto”. Pois o “terremoto”, o acaso, se interpôs.

Eleição?
“A compreensão humana, após ter adotado uma opinião, coleciona quaisquer instâncias que a confirmem, e ainda que as instâncias contrárias possam ser muito mais numerosas e influentes, ela não as percebe, ou então as rejeita, de modo que sua opinião permaneça inabalada.” Francis Bacon, filósofo, citado no livro.

Método
“Segui uma regra de ouro: sempre que uma nova observação ou pensamento surgia, se fosse oposta ao meus resultados gerais, eu fazia uma anotação dela (…) pois eu tinha descoberto, pela experiência, que esses fatos e pensamentos têm uma tendência muito maior para fugir à memória do que os fatos favoráveis.” Charles Darwin, naturalista.

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