Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 21/12/2014 do O POVO.

CarlusPescando na Bienal do Livro
Plínio Bortolotti

Muita gente criticou a edição deste ano da Bienal do Livro do Ceará. Alguns reclamando da “desorganização”; outros, da falta de um número maior de autores “importantes”; vários para dizer que o evento foi apenas uma grande “feira” de livros e, pior, com poucas editoras de destaque.

Porém a crítica mais certeira veio de Lia Martins (@liabmartins), que postou o seguinte na rede social Twitter: “Essa foi a Bienal do Livro com mais cara de SANA a que eu já fui na vida. No melhor sentido”. “Sana”, para quem não sabe, é o evento anual da cultura japonesa, com seus mangás (gibis), séries de TV, jogos e outros produtos da indústria cultural nipônica, ambiente normalmente frequentada por adolescentes vestindo “cosplay” (fantasia) de seus personagens favoritos.

De fato, na Bienal, havia um imenso de editoras de livros próprios para adolescentes – em que campeiam vampiros e outros seres fantásticos -, incluindo um estande em que se podia, virtualmente, “entrar no livro”, com a simpática jovem autora à disposição para autografar a sua obra; e outro em que se anunciava aos gritos que tal série de livros (já esqueci o nome) “agora tem final”, chamando os passantes para conhecer o segredo.

Na contracorrente dos que criticam os jovens por lerem literatura juvenil (queriam o quê?), penso que cada um deve começar por onde gosta. Melhor do que obrigar à leitura de José de Alencar para depois o menino ficar odiando o autor de Iracema para o resto da vida, sem atentar para a importância do cearense para as letras nacionais.

Assim, me diverti – mas não aceitei – ao ser convidado para “entrar no livro”, e nem fui atraído para conhecer o final da tal história da qual eu nem sabia o começo – ou mesmo que existia. (Também recusei, muito educadamente – a mocinha que oferecia a revista não tem culpa nenhuma -, a aderir a uma assinatura da Veja.)

Tampouco me incomoda a bienal como “feira de livro”. Gosto de flanar pelos estandes; principalmente minerar nas bancas de livros a R$ 10,00 – onde, vez por outra se esconde uma pedra de valor, como foi o caso (em outra bienal), quando topei com Eric Arthur Blair, mais conhecido como George Orwell, ele contando como ficou Na pior em Paris e Londres – uma edição de 1986, da editora Philobiblion -, que somente mais recentemente mereceu uma edição renovada de editora “importante”.

Nesta bienal, o que pesquei – no qual até agora somente dei uma visada – foi Máscaras e codinomes – O espetáculo da política brasileira (1961-1984), livro que reúne crônicas do jornalista José Carlos Oliveira para o Jornal do Brasil, no período indicado no título. O organizador da publicação (editora Civilização Brasileira), Jason Tércio, classifica o jornalista como “o grande cronista dos anos de chumbo”.

Chamou-me a atenção esta citação na contracapa: “No Brasil, uma embriaguez dionísica acometeu a esquerda – a mesma embriaguez que neste momento perturba os sentidos da direita vitoriosa. Ninguém viu a luz, apenas a cegueira mudou de dono”. Ainda não verifiquei de qual crônica (e de qual ano) foi extraído o trecho, mas será que não retornamos a esse ponto, cambiando-se os lugares entre direita e esquerda?

NOTAS

O senhor dos anéis
Entre os autores que caíram no gosto juvenil está o britânico sir John Ronald Reuel Tolkien, conhecido por J. R. R. Tolkien, O senhor dos anéis, que escreve para gente grande.

Os senhores das ruas
Tudo bem que estacionamento a R$ 15 no Centro de Eventos, sem outra opção por perto – e com clientela garantida -, é quase um assalto. Porém não justifica que motoristas transformem ruas e canteiros, onde é proibido parar carros, em estacionamento, com o beneplácito das “autoridades” (não havia nenhuma fiscalização). É o retrato de uma certa “elite”, que deve ter feito o trajeto até a bienal metendo o pau na “corrupção” (dos outros).

2016
Se a bienal de 2016 quiser ser melhor do que a deste ano, tem de começar a ser preparada agora. A deste ano perdeu para a anterior até em número de público. Em cima da hora é difícil fazer algo que ganhe mais elogios do que críticas.

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