Reprodução do artigo publicado na edição de 5/11/2015 do O POVO.

Hélio RôlaRelações impróprias
Plínio Bortolotti

“Eu nunca tive relações sexuais com essa mulher, a senhorita Lewinsky” (Bill Clinton, em 1998, quando era presidente dos Estados Unidos).

“Não tenho qualquer tipo de conta em qualquer lugar que não seja a conta que está declarada no meu imposto de renda” (Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, em 2015, no depoimento-espetáculo à CPI da Petrobras).

O que liga essas duas frases, separadas por 17 anos – e pronunciadas em contextos completamente diferentes? A meu ver, um tipo de definição exclusiva e excludente que ambos os políticos têm para fatos concretos, sobre os quais as divergências são extremamente insignificantes, quando se trata de conceituá-los.

Mesmo quando surgiram provas irrefutáveis de que Clinton tivera contato íntimo com a estagiária da Casa Branca, Monica Lewinsky, ele continuou negando que houvera relação sexual. Pela interpretação dele, receber sexo oral não se enquadrava no conceito de relações sexuais. Quando tornou-se impossível negar, ele admitiu o ato, mas passou a classificá-lo como “relações impróprias”.

Quanto ao processo que corre contra Cunha na Comissão de Ética, ele diz o seguinte: “Vou provar que não faltei com a verdade”. Ou seja, vai comprovar que não teria mentido quando disse à CPI da Petrobras a frase reproduzida no segundo parágrafo. Mas ele evita afirmar, categoricamente, que vai provar que não é beneficiário de conta aberta na Suíça, em nome de outra pessoa ou empresa, de modo a ocultar a origem do dinheiro.

Pela definição estrita que o deputado tem do conceito de verdade, o fato de uma conta suíça – aberta ao que tudo indica com dinheiro oriundo de desvios da Petrobras, com o concurso dele – porém, sem o nome “Eduardo Cunha” no fronstipício, é diferente de ele ser “apenas” beneficiário do malfeito.

Dessa forma, suponho, Cunha deverá fazer prova que “não faltou com a verdade” ao dizer que as contas suíças não lhe pertencem.

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