Reprodução do artigo publicado na edição de 24/3/2016 do O POVO.

Hélio Rôla

Arte: Hélio Rôla

O “analfabeto” e os estúpidos
Plínio Bortolotti

Com diferença de oito dias, dois “grandes” jornais, a Folha de S. Paulo e o Estado de S. Paulo, chamaram Luiz Inácio Lula da Silva de “analfabeto”.

A Folha, de um jeito mais “sofisticado”, escreveu em 12/3/2016, referindo-se aos integrantes do Ministério Público, que pediram a prisão do ex-presidente: “Às voltas com um conhecimento gramatical que nem mesmo o investigado (Lula) invejaria, os promotores (…) caíram na já notória esparrela de confundir Hegel com Engels”.

O Estado (20/3/2016), criticando uma carta que Lula divulgou para rebater as acusações contra ele, rabiscou no estilo deixa que eu chuto, “obviamente (a nota foi) escrita por gente alfabetizada (cujo conteúdo) devem ter lido para ele…”.

É obsessivo o modo como certos jornais – secundados por colunistas “de grife” e seus epígonos – tentam aplicar a pecha de “analfabeto” em Lula. Para eles, somente são “inteligentes” os donos de um diploma de curso superior. E, se o sujeito tiver o título de “doutor”, ajoelham-se a seus pés.

Quando editor Opinião, rejeitei muito texto de “pós-doutores”, que não sabiam juntar lé com cré, nem fazer um “ó” com uma quenga, sendo erros gramaticais os menos graves, mesmo sendo esse o ofício deles.

O que muito imbecil não entende é que a inteligência independe da educação formal (ainda que esta tenha de ser incentivada e respeitada). Alguns “jornalistas” deveriam, pelo menos, saber que um dos melhores entre nós, Cláudio Abramo, nunca alisou carteira escolar. “Sou autodidata, não frequentei escola”, escreveu; um “analfabeto”, portanto.

Garrincha, além de “analfabeto”, foi considerado “débil mental”, mas era um gênio em campo. Se alguém, sem conhecê-lo, ouvir uma entrevista de Gilberto Gil, talvez o classifique como alguém que não sabe se expressar, mas deixe o sujeito ouvir música dele e pergunte novamente.

A inteligência é vária e ninguém é ótimo em tudo. O problema de Lula e Garrincha nunca foi a gramática, mas resolver outros tipos problemas complexos. E saíram-se muito bem, goste-se deles ou não.

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