Reprodução da coluna “Menu Político”, caderno “People”, edição de 10/4/2016 do O POVO.

CarlusCargos de confiança como moeda de troca
Plínio Bortolotti

Quando se questiona um mandatário brasileiro sobre o porquê da famosa distribuição de cargos “de confiança” como moeda de troca política, a resposta que se recebe – dos partidos da A a Z – é que “em todo o mundo” se governa com aliados.

Certo. Mas será comum, em todo o mundo, que uma cidade (Fortaleza, por exemplo) tenha quatro mil cargos de “livre nomeação”, sendo outros tantos no Estado – e no governo federal mais de 20 mil? Postos distribuídos de acordo com arbítrio do chefe do Executivo, fruto de negociações nem sempre republicanas?

Uma pessoa assim nomeada tem compromisso com os cidadãos ou com seu “padrinho”?

Por esse caminho são criados pequenos feudos, dirigidos por sobas que exercem o poder (maior ou menor) de acordo com a quantidade de indicações de que dispõem. Alguns são discretos, agem nos bastidores, mas há aqueles que alardeiam abertamente o seu poder indicatório, gabando-se da influência que desfrutam com a presidente, com o governador ou com o prefeito.

Ainda em 2014, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa – condenado na operação Lava Jato – disse que, desde o governo Sarney (o primeiro presidente do período pós-redemocratização) até Dilma Rousseff, passando por todos os outros presidentes, o “apoio político” sempre foi obrigatório para chegar a uma diretoria da empresa e das coligadas.

A coisa chega a tal ponto que até para cargos técnicos de chefia de quarto ou quinto escalão, como gerência, por exemplo, se faz sentir a influência das “indicações”. Alguns estudiosos do assunto dizem que, juntando essas funções, chegam a 90 mil cargos à disposição do governo federal.

Esse método de governar, que já era de conhecimento público, fica cada vez mais escancarado. À saída(?) do PMDB do governo, foi revelado que o partido tem 600 nomeados na administração pública federal. Cargos esses que a presidente da República pretende lotear entre outras siglas para granjear-lhes a fidelidade, ganhando votos contra o impeachment.

Assim, é indiscutível que cai muito a eficiência do serviço público, pois nenhum político faz a indicação de graça. O apadrinhado sempre ficará lhe devendo o favor, que será cobrado – e pago, pois o funcionário chegou ali graças à influência de seu indicador e não por critérios profissionais. E, ainda, vai ficar na corda bamba, dependendo da maré política para se manter no cargo.

Portanto, a cada chacoalhada política no governo, treme toda a estrutura, como prejuízo para quem precisa dos serviços. Se houvesse uma burocracia profissionalizada, os acontecimentos de Brasília teriam pouca influência na qualidade dos serviços oferecidos à população.

Sem contar que esse método é a porta aberta à corrupção de todo tipo.

Então, voltamos ao início. É óbvio que o ganhador das eleições (federal, estadual ou municipal) tem o direito de governar com seus aliados. Porém, isso deve pressupor os ministérios (ou secretarias nos casos de municípios e estados), mais algumas dezenas de cargos de confiança – e não fazer das instituições um butim para reparti-las entre os aliados.

NOTAS

Absurdo
Gil Castello Branco, fundador da ONG Contas Abertas: “É um absurdo que não haja transparência sobre onde estão esses cargos, e, de forma mais ampla, sobre quem fez as indicações para preencher os mais de 20 mil cargos de confiança da burocracia federal”.

Exagero
Felix Lopez, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea): “Provavelmente há algum exagero no Brasil, e o problema é que isso (a quantidade de cargos de livre nomeação) amplia a rotatividade desses postos e prejudica a continuidade das políticas públicas”.

EUA
Nos Estados Unidos são oito mil cargos de confiança no Legislativo e no Executivo federal.

Crédito
Dados e declarações acima são de matéria da BBC Brasil.

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