Reprodução do artigo publicado no caderno DOM., edição de 8/5/2016 do O POVO.
Descaminhos
Plínio Bortolotti
Confesso que errei ao supor que a hipótese mais provável seria o fortalecimento de Eduardo Cunha com o (possível) impeachment da presidente Dilma Rousseff. Mas Cunha caiu antes, e o tombo foi grande: afastado da direção da Câmara e do próprio mandato.
Porém, no atacado continua correta a análise que faço: a de que o impeachment abre um período de instabilidade, pois sustentado em pilares frágeis, que contrariam a Constituição. E, mais, ao se aceitar que um réu no Supremo conduzisse o processo de impeachment, feito sob medida para atender à oposição, abriu-se a porteira para todo tipo de abuso.
Cunha deveria ter sido afastado da presidência da Câmara antes, preservando o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) de tomar uma medida extrema: a de impedir que um deputado exerça o seu mandato, sem uma “hipótese constitucional clara”, como afirma a professora Eloísa Machado, do curso de Direito da Fundação Getúlio Vargas.
Haverá juristas que interpretarão de outro modo. Porém, decisões como essa – e como o impeachment – somente deveriam ser tomadas com o máximo grau de certeza.
Mas a coisa chegou a tal ponto – devido ao descaminho do impeachment – que alguma coisa atípica precisava ser feita para deter Cunha. Creio que foi esse o pensamento que norteou a decisão do STF.
PS. Entrevista da professora Eloísa Machado, publicada na Folha de S. Paulo.
“Confesso que errei ao supor que a hipótese mais provável seria o fortalecimento de Eduardo Cunha (…)”.
Supor? Hipótese mais provável?
Pior que o erro grosseiro é admissão de culpa oblíqua.
No texto de 21/04/16, não há “suposição mais provável” alguma. O que ali existe, são afirmações deveras convictas, repletas de teorias sem qualquer sustentação nos fatos e das ofensas de sempre aos discordantes. Vitupérios, a propósito, frequentes tanto neste espaço, quanto no programa de rádio ancorado pelo articulista. No referido artigo, quem não concorda, ou não tem argumentos legítimos: tem “desculpas”; ou é alienado – “inocentões” segundo o debochado autor.
É fácil demais enxovalhar o interlocutor, quando se tem o poder da tréplica.
Não há, naquele texto, qualquer dúvida do articulista sobre o que iria acontecer após a aprovação do impeachment na Câmara dos Deputados. A certeza era tanta, que os verbos foram conjugados no futuro do presente, e não do pretérito.
Se a incoerência fosse só daquele texto…
Eu sei que não se deve esperar atualmente de um articulista de esquerda no Brasil, salvo raríssimas exceções, análise política franca ao invés de wishful thinking.
Quem afirmaria, com toda a convicção, que o impeachment contraria a Constituição sem citar quais artigos foram agravados?
A despeito dos aplausos dos incautos, o articulista, obviamente, não citará quais seriam tais artigos. E por que não citará? Porque não há agravo algum!
Há, como sempre, apenas torcida.
É a saga continua. Sem nenhum constrangimento, é claro.
Caro sr. Giovani,
Vitupérios? Onde? Nem falando, nem escrevendo.
(A propósito, meus textos estão todos à disposição, caso queira, o sr. mesmo pode verificar a “inconsistência” deles.)
Agradeço pela leitura e pelo comentário.
Com atenção,
Plínio
“Tchau, querida; chega mais, querido
Plínio Bortolotti
Vão ter de buscar outra desculpa os que se valiam do argumento, “primeiro Dilma, depois os outros”, à guisa de explicação do porquê denunciarem a corrupção do PT, esquecendo-se estrategicamente de Eduardo Cunha (PMDB) e outros do mesmo naipe.
Cunha, réu no Supremo Tribunal Federal, saiu fortalecido do processo. E Michel Temer – o vice que ambiciona ser titular – não existe sem Eduardo Cunha e sua corriola. Assim, o acordão para salvar o presidente da Câmara já está em pleno andamento.
(O esgar de Cunha, na hora da votação, imagino, não era dirigido a seus inimigos, mas uma espécie de riso interno, tipo “essa é a minha turma, deles conheço a alma”. Foi esse baixíssimo clero que Cunha arrebanhou com milhões de carinhos, formando a maior bancada da Câmara.)
O primeiro passo já foi dado: trocou-se um integrante da Comissão de Ética para dar maioria a Cunha e a investigação foi limitada à acusação de ele ser “apenas” mentiroso, ficando fora os indícios de que também é corrupto. Portanto, uma punição mínima é o máximo que se pode esperar.
Ao mesmo passo de cágado, tramita no STF o pedido de afastamento de Cunha da presidência da Câmara, requerido pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que relacionou uma dezena de motivos para defenestrá-lo.
Ao preço de sua salvação, Cunha será o punho de ferro de Michel Temer para ministrar todos os remédios amargos que o “mercado” quer impor ao país, incluindo a redução de benefícios sociais e afrouxamento nas leis trabalhistas. Corruptos úteis serão poupados e a corrupção sairá da ordem do dia e das manchetes dos jornais.
É de se duvidar que a direção do movimento pró-impeachment mobilizará as ruas para pedir a cabeça da dupla Temer-Cunha e de outros suspeitos; ou, ainda, se haverá sinfonia de panelas contra eles.
Dessa forma “tchau, querida” para Dilma representa um “chega mais, querido” para Cunha – se Temer chegar lá, refém do presidente da Câmara.
Enquanto isso, o pato da Fiesp estará rindo dos inocentões que acreditaram que a luta era contra todos os corruptos.”
Fonte: http://blog.opovo.com.br/pliniobortolotti/tchau-querida-chega-mais-querido/